A Liturgia passa por um período de crise, perceptível no desgosto de muitos batizados que a veem com irrelevância em suas vidas. Contudo, a liturgia deveria “ser um dos bens mais amados e protegidos, guardados e promovidos pelas comunidades cristãs”[1], principalmente pelos ministros ordenados que, por vezes, podem cair na banalização do mistério, na arte do improviso, no rubricismo, no exteriorismo da liturgia, que conduzem à superficialidade litúrgica, sem adentrar no mistério de Cristo.
Haja vista que a Liturgia está intrinsecamente ligada com o dom da Páscoa do Senhor que, acolhido com docilidade, faz nova a nossa vida (DD, 20), os ministros ordenados têm um papel de suma importância, quando na sua ação pastoral presidem a Liturgia, tomando pela mão os fiéis batizados e guiando para dentro da experiência da Páscoa (DD, 36). Por isso, estes devem ser formados na arte de bem celebrar para que, sem improvisações, rubricismos, exteriorismos e superficialidades, não esvazie o mistério da Páscoa do Senhor.
Nesse sentido, a “ars celebrandi não se pode reduzir à mera observância de um aparato de rubricas, e ainda menos pode ser pensada como uma fantasiosa […] criatividade sem regras. O rito é por si mesmo uma norma e a norma nunca é fim para si mesma, mas está sempre ao serviço da realidade mais alta que quer salvaguardar” (DD, 48). Ao aprender a ars celebrandi, somos chamados a proclamar a Palavra de Deus, escutando-a, fazendo-a inspiração de nossa oração e fazendo tornar-se vida. Daí a Liturgia adquire um aspecto vital, que entrelaça a fé e a vida, o que celebramos torna-se vida e a vida se torna celebração. Entretanto, isso não deve ser formal, exterior, mas vital, em aspecto da interioridade, porque cada gesto e cada palavra da celebração, expresso com ‘arte’, forma a personalidade cristã de cada um e da comunidade (DD, 53). Para tanto, é preciso formar-se para a liturgia e pela liturgia, pois celebrar bem, com arte, irá nos configurar a Cristo.
Com isso, desde o tempo de seminário, os candidatos ao ministério ordenado devem ter uma perspectiva litúrgica, pois a exemplo da comunidade apostólica ao redor do Cristo Ressuscitado: “oram juntos, celebram a mesma liturgia que culmina na Eucaristia, a partir da Palavra de Deus recebem os ensinamentos que vão iluminando sua mente e modelando seu coração para o exercício da caridade fraterna e da justiça, prestam serviços pastorais periodicamente a diversas comunidades, preparando-se assim para viver uma sólida espiritualidade de comunhão com Cristo Pastor e docilidade à ação do Espírito Santo, convertendo-se em sinal pessoal e atrativo de Cristo no mundo, segundo o caminho de santidade próprio do ministério presbiteral’” (DFPIB 110, n. 140).
Assim, formar-se para a liturgia e pela liturgia implica configurar-se a Cristo, e uma vez que este é o objetivo da formação do ministro ordenado, entende-se que a Liturgia, a qual é o sacerdócio de Cristo, revelado a nós e doado em sua Páscoa, se torna presente e atuante mediante os sinais sensíveis para que o Espírito, nos mergulhe no mistério pascal, transformando toda a nossa vida, conformando-nos cada vez mais a Cristo (DD, 21). Por isso, formar na Ars celebrandi é essencial, pois o ministro ordenado não preside a celebração para si, e evitando rubricismos, exteriorismos, improvisações e superficialidades, toma pela mão os fiéis batizados e guia para dentro do mistério litúrgico mais profundo, que é a experiência da Páscoa. Tal feita imbrica formação permanente e tomar consciência do que irá fazer, conformando a vida com o mistério da cruz do Senhor[2].
Hélio Rafael Frasão Pereira
Bacharel em Teologia pela Itepa Faculdades
Seminarista da Diocese de Palmas-Francisco Beltrão – PR
[1] Cadernos do Concílio, 8, p. 11.
[2] Pontifical Romano, p. 1992.