Diego Vitor Dalmagro*
O trabalho é um dos pilares fundamentais para a dignificação do ser humano. Trabalhar é parte da vocação humana para dar continuidade à obra de Deus pois, como imagem e semelhança do Criador, somos seres livres, racionais e com capacidade reflexiva. A habilidade de criar é a fonte de nossa vocação para agir e trabalhar, mas é necessário sempre realizar uma autoavaliação para identificar até que ponto o trabalho vai ao encontro de nossa vocação.
A vocação é um dom recebido de Deus, e de forma particular Ele o oferece para cada um de nós. Cada pessoa tem talentos e habilidades únicas, por meio de experiências pessoais, desenvolvemos aptidões, que nos trazem plenitude. Quando agimos em sintonia com nossa vocação nos sentimos orientados em nosso trabalho que, consequentemente, nos leva à prosperar em nossas carreiras. Papa Francisco faz uma bela comparação entre a vocação e o trabalho, cotejando a vocação ao trabalho de um escultor e, complementando “No interior de cada bloco de pedra, há uma estátua, cabendo ao escultor a tarefa de a descobrir” (Vatican News”, 2022).
Por outro lado, é através do trabalho que desenvolvemos nossas habilidades e por meio dele procuramos atender as nossas necessidades, desde básicas às existenciais. O trabalho é também a forma como buscamos fortalecer nossa autoestima, faculta efetivar nossa liberdade e exercer controle sobre nossas escolhas. Nos colocamos a serviço de um propósito pessoal e social para atingir metas e resultados, possibilitando a promoção e o desenvolvimento pessoal em todas as direções.
Em teoria é assim que pensamos e relacionamos a vocação e o trabalho, mas na prática, em meio a um contexto histórico em que se invertem os valores do trabalho, a vocação é substituída pela busca incessante do capital ou pela sobrecarga de um sistema, muitas vezes capitalista, que exige cada vez mais dos homens. No momento em que deixamos de fazer o que gostamos, o amor pelo trabalho deixa espaço para uma profissão sem sentido, de esgotamento emocional, de sobrecarga funcional e sem valor real. E aqui, não podemos culpar as pessoas por suas escolhas. O problema é mais profundo, político e estrutural. Quando temos um sistema desigual de acesso à educação de qualidade e a oportunidades de trabalho, a necessidade pela subsistência é mais forte que o desejo de trabalhar em sintonia com a vocação.
Nos últimos anos, principalmente após a pandemia, os índices de insatisfação e infelicidade das pessoas com suas profissões e com seus ambientes de trabalho aumentaram. Os casos de afastamento profissional por doenças ligadas ao estresse, a ansiedade e esgotamento mental também dispararam. Segundo a Associação Nacional de Medicina do Trabalho a síndrome de Burnout tem alcançado o alarmante índice de 30% dos mais de 100 milhões de trabalhadores brasileiros. É estranho que com o acesso facilitado a ferramentas e tecnologias, criadas com o intuito de melhorar as condições humanas no trabalho, nos vemos sufocados por elas, que perturbam nossa privacidade, nossas noites de sono e reduzem cada vez mais o nosso tempo que poderia ser direcionado para a espiritualidade, a família, os amigos e até mesmo o nosso bem-estar. Essa inversão está adoecendo as pessoas no trabalho quando poderiam estar prosperando.
Sendo assim, é necessária uma pausa para refletir sobre qual caminho as nossas vidas, o nosso trabalho e a nossa sociedade estão seguindo. É fundamental que o trabalho seja um meio para nossa realização pessoal, independente se for voluntário ou assalariado, devemos estar atentos se estamos em sintonia com nossa vocação e se estamos fazendo o bem a nós e ao nosso próximo.
*Coordenador administrativo da Itepa Faculdades, bacharel em Filosofia e Ciências contábeis, especialista em Gestão financeira, controladoria e auditoria.