As aulas da disciplina de Evangelhos Sinóticos da Pós-Graduação em Espiritualidade e a exposição do conteúdo pelo Professor Ivanir Rodigueiro me fizeram a partir de suas palavras e da riqueza do conteúdo, me fizeram escrever este texto como partilha parcial do conteúdo exposto.
A vocação humana é despertada com um chamado a vida e na vida cuja a iniciativa é de Deus. É Ele que quer soprar em nossos ouvidos nosso nome e fazer ecoar em nós a voz do Espírito Santo que quer nos levar ao caminho do Reino de Deus (Sm 4). Se nosso ser está desperto e sensível a Deus podemos responder como o profeta Samuel: “Fala, que teu servo escuta”. Essa é a experiência espiritual que quer nos colocar a caminho e no caminho a partir da escuta de Deus.
A espiritualidade de Jesus é a do caminhar, do ir, do estar em saída e do Deus que se abaixa para elevar. É isso que Jesus nos mostra nos diversos encontros e conflitos que tem em sua vida pública. Ele chama seus discípulos e os ensina a lógica do Reino. E esta lógica implica em trazer os pobres e excluídos para o centro entrando em confronto com o poder estabelecido da época e assumindo o perigo da condenação e da cruz.
O Evangelho de Marcos aponta para o seguimento de Jesus que leva seu discípulo e discípula a comprometer-se com a vida do outro, inserindo-se na dinâmica da partilha e do serviço, que vai de encontro a cultura política, econômica e social de morte iluminando-a com a luz que emana da práxis de Jesus. Sustentar-se nesta escolha proposta pelo caminho de Jesus, exige um confrontar-se com as limitações do eu, as dificuldades do encontro com o outro e a necessidade do permanecer em Deus e estas realidades devem dialogar conosco na oração, pois ela gera preparo para a missão e faz-nos unir na experiência cotidiana fé e vida e querermos não nos afastar da construção do Reino de Deus.
O Evangelho de Mateus vem fazer crescer a consciência dos cristãos de ontem e de hoje da construção do Reino dos Céus, onde somos chamados a ser Igreja, a ter um agir ético, a sermos misericordiosos dando o coração aos pobres necessitados, onde chama-nos a evoluir o nosso amor para ser radical, gratuito e universal, a construirmos um projeto de vida que exige discernimento, paciência, vigilância e justiça onde deve-se gerar relações justas de bondade a partir das necessidades das pessoas, fazendo travessias que exigem mudanças que devem nos tornar mais irmãos e irmãs. Com isso, nos tornamos discípulos e discípulas que aprendem a se relacionar com Deus como um Pai amoroso e com o outro como irmão, estabelecendo laços de fraternidade que nos chama a cuidar bem da vida.
O viver buscado pelo cristão deve estar baseado na nova lei de Jesus, onde ser feliz é atingir as situações de ser pobre em espírito, sendo abertos para ouvir a voz do Pai e sendo sensíveis ao drama das pessoas, ser aflito que busca sanar os sofrimentos dos outros, ser manso que significa ter consciência da mudança que precisa fazer e tentar conseguir mudar e ter fome e sede de justiça que é estabelecer vida integral e digna às pessoas. Estas ações são desencadeadas pelas opções dos bem aventurados que se tornam cotidianamente misericordiosos, puros de coração e promotores da paz. E estes felizes em Jesus que vivem estas opções e lutam por um mundo mais bem aventurado serão perseguidos. Mas, ao realizar este chamado a felicidade receberão a recompensa das promessas feitas por Jesus de alcançar o Reino, ser consolado, herdar a terra, ser saciado na busca da justiça, alcançar misericórdia, ver a Deus, ser chamado de filho e filha de Deus e ser possuidor do Reino.
Jesus no desejo de nos tornar bem-aventurados ensina aos discípulos de todos os tempos a rezar de forma simples e profunda e nos dá a oração do Pai Nosso que expressa a nova relação do ser humano com Deus a partir de Jesus: a do filho e filha com seu Pai amoroso que não é só seu mas de todos os outros seres humanos e que esses são seus irmãos e irmãs.
A oração do Pai Nosso indica que ela se dirige ao Pai onde o filho se abandona confiante como uma criança. Este Pai está acima de tudo que existe e o filho que reza precisa louvá-lo, bendizê-lo, glorificá-lo e torná-lo santo e pedir que venha o teu Reino onde cada um é responsável pelo ideal de vida justa a todos os seres humanos e que para isso é necessário discernir, optar e assumir as consequências da sua vontade em nós e que ela deve acontecer na totalidade do que somos, do que temos e do que construímos com os outros e que o alimento indispensável a vida não falte nem no hoje e nem no amanhã e que no amor possamos perdoar e receber o perdão e que nos limites e possibilidades de cada um, sejamos sustentados para não cair na tentação e nos fortalecer quando as superamos e que não caiamos nas armadilhas do mal presente em nós e nas estruturas sociais e que ele não nos destrua e nos afaste do projeto de Jesus para que assim possamos viver confirmando com o amém aquilo que Deus quer fazer de nós e através de nós.
O Evangelho de Lucas vai nos indicar que tudo isso será possível se aprendermos que somos morada do Espírito Santo, pois ele nos habita, que esse Espírito nos move a novos horizontes e que devemos ser dóceis a sua presença para que o projeto de Jesus seja nosso projeto e que a vida cristã tenha mais sabor, mais luz e seja fermentada pelo amor em tudo que fizermos.
Padre Carlos Renato Carriço Gomes
Aluno do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu Especialização em Espiritualidade