TEOLOGIA
E EDUCAÇÃO
v. 39, n. 132, Jan./Jun./2022
ISSN on-line: 2763-5201
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T314
Revista Teopráxis, vol.1, n.1(1984-) / Instituto de Teologia e Pastoral. Passo Fundo: ITEPA, 1984 -v.39
- n°132, Jan.-Jun./2022. Semestral.
ISSN:1677-860X versão impressa (descontinuada)
ISSN:2763-5201 versão eletrônica
1.Teologia -Periódicos I. Instituto de Teologia e Pastoral-ITEPA
SUMÁRIO
Editorial..................................................................................................................................................... 4
Regiano Bregalda
Teologia e educação: Relações históricas e aproximações consistentes...................... 6
Theology and education: Historical relationships and consistent approximation
Dom Edgar Xavier Ertl e Elcio Alcione Cordeiro
Lo (no) dicho y () pensado: respecto a la enseñanza de la teología desde
la perspectiva del laico....................................................................................................................... 22
The (un) said and (yes) thought: about the learning of theology in the perspective of the laity
O (não) dito e (sim) pensado: sobre o ensino da teologia na perspectiva do leigo
Diego Pereira Ríos
O Intelectual Orgânico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9).........................35
The Organic Intellectual: Theology does not allowed to be chained (2Tm 2,9)
Rogério L. Zanini e Luiz C. Susin
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade.................................... 47
Dare to Dream: For an Education that Promotes Fraternity
Silvio Antônio Bedin
A Campanha da Fraternidade 2022 e os desaos da Educação na Amazônia
à luz do Sínodo Especial para a Amazônia.................................................................................56
The Fraternity Campaign and the Challenges of Education in Amazon State in Light
of the Special Synod for the Amazon
Márcia Maria de Oliveira
Negras mulheres e mulheres da bíblia: trajetória de lutas e resistência
por uma educação antirracista....................................................................................................... 68
Black women and women of the bible: rajectory of struggles and resistance for
an anti-racist education
Ana Maria da Rosa Prates, Francisca Izabel Da Silva Bueno e Marcio Luiz de Oliveira
Christus Vivit: novidades na evangelização da juventude................................................ 81
Christus Vivit: news in the evangelization of youth
Luis Duarte Vieira e Diego Isotton
RESENHA
Eclesiologia: perspectivas teológico-pastorais........................................................................ 89
André Luiz dos Santos
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
EDITORIAL
Regiano Bregalda*
Organizador
Colocar em pauta os temas educação e teologia é o objetivo do
Volume 39, número 132 de 2022 da Revista Teopráxis. Foram muitas
as razões que levaram à escolha desse tema, assim como muitas
possibilidades de delimitação dessa abordagem. O enfoque desta edição
problematiza tais temáticas a partir de diferentes lugares e contextos,
tendo em vista uma sociedade complexa e plural particularmente
afetada pela atomização dos sujeitos e a pulverizão de injustiças.
Teologia e educação são duas dimensões que atravessam, de um
modo ou de outro, a formação do ser humano. Embora distintas, elas
perpassam o ethos social, o agir humano, fazendo com que a teologia
seja uma ocupação da educação e vice-versa. A educação,
preliminarmente falando, se ocupa com as condições, possibilidades e
capacidades do sujeito poder interpretar a si mesmo, os outros e o
mundo. A teologia, como ato segundo, precedida pela experiência da
graça atuante na vida humana, possibilita problematizar a linguagem
da experiência humana da fé. Ao colocarmos em diálogo estas
perspectivas, apontamos um espaço privilegiado para
problematizarmos de modo significativo os desafios do nosso tempo,
sejam eles sociais, políticos, religiosos etc.
Vivemos tempos complexos, diversos e plurais, atravessados
por uma crescente acumulação de riquezas, desigualdades sociais,
marginalização, aumento da pobreza, descaso com as questões
ambientais, descrença nas instituições, desprezo pela vida..., que
permitem dizer que vivemos numa crise civilizacional. Desde os
anos 70 do século passado, o mundo é marcado por uma crescente
acumulação de riquezas, pelo dratico aumento da desigualdade
social, pelo dstico enfraquecimento da democracia, assim, como
na linha da teoria do capital humano, pela crescente transformação
da educação em vista de converter os sujeitos em seres
economicamente produtivos. Esse contexto é exaltado sobremaneira
pela lógica neoliberal que reduz o ser humano e a vida a uma
dimeno empresarial, a uma mercadoria, impedindo ou
fragilizando o orescimento da humanidade em sua integralidade,
como salienta o Papa Francisco. Por isso, urge pensar abordagens
capazes de lançar luzes e fazer enfrentamentos a essa perspectiva
empobrecedora do ser humano. Entendemos que na articulação
entre teologia e educação abrem-se frestas para pôr em questão
muitos desafios de nosso tempo.
Na contramão desses ideais empobrecedores da experiência
humana, apresentamos um número da Revista Teopráxis, que, em
2022, completa 38 anos de existência, com um dossiê com temas
transversais à Teologia e à Educação. Para isso, conta com a
contribuição de pesquisadores de diferentes instituições, do Brasil e
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 4-5, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.109
* Possui graduação em Filosofia (L e B) pela
Universidade de Passo Fundo, graduação em
Teologia pelo Instituto de Teologia e
Pastoral, mestrado e doutorado em Educação
pela Universidade de Passo Fundo. Realizou
o doutorado sanduíche na École des hautes
études en sciences sociales-Paris e no Fonds
Ricoeur. É professor no curso de Teologia do
Instituto de Teologia e Pastoral - Itepa.
E-mail: regiano_bregalda@hotmail.com
https://orcid.org/0000-0003-0104-4163
5
do exterior, para qualificar esse debate. São artigos que atestam a importância destas
temáticas e uma preocupação latente com a emancipação humana.
Este dossiê inicia com o texto de Elcio Alcione Cordeiro e Dom Edgar Xavier Ertl
intitulado Teologia e educação: relações históricas e aproximações consistentesno qual refletem
a relação e as contribuições que estas áreas oferecem para a formação do ser humano
integral, que, por sua vez, exige um compromisso com a transformação social. Na
sequência encontra-se o texto Lo (no) dicho y () pensado: respecto a la enseñanza de la
teología desde la perspectiva del laicodo teológo e educador uruguaio Diego Pereira Ríos. O
autor questiona a dimensão do ensino de teologia dentro da esfera eclesial, que ao longo de
sua história reduziu-o àqueles que fazem parte da hierarquia eclesiástica. Dando
continuidade, Luiz C. Susin e Rogério L. Zanini direcionam a discussão para a vida e o
legado do teólogo e educador Pe. Elli Benincá a partir do texto: O intelectual orgânico: A
teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)”. Benincá, teólogo-intelectual orgânico, pautou sua
práxis na opção pelos pobres e adotou a metodologia histórico-evangelizadora como
espiritualidade, buscando ser fiel ao Evangelho e ao Reino.
O quarto artigo tecido por Silvio Antônio Bedin, intitulado Ousar sonhar: por uma
educação que promova a fraternidadese ocupa em refletir as necessidades de ser postular
uma educação integral e humanizadora. Na esteira do que defende Papa Francisco, Bedin
apresenta os desafios para reinventar e reorganizar os espaços de escuta nos espaços
educativos, capazes de serem sinais do Reino. Nesta mesma direção, Márcia Maria de
Oliveira em A Campanha da Fraternidade 2022 e os desaos da Educação na Amazôniaà luz
do Sínodo Especial para a Amazônia, resgata a significância da dimensão da sinodalidade
para um caminho eclesial capaz de descolonizar as práticas e metodologias pastorais num
sentido profundo de aprender com e a partir da perspectiva dos povos originários.
Na sequência, Ana Maria da Rosa Prates, Francisca Izabel Da Silva Bueno e Marcio
Luiz de Oliveira propõem a partir do artigo Negras mulheres e mulheres da bíblia: trajetória
de lutas e resistência por uma educação antirracista”, apresentar a trajetória de lutas e
resistências das mulheres negras na sociedade brasileira. Insistem na perspectiva de
implementação de uma educação antirracista na escola e na academia e, num diálogo a
partir da teologia, sonhar com uma mística bíblica antirracista. Em Christus Vivit:
novidades na evangelização da juventude de Luís Duarte Vieira e Diego Isotton,
encontramos uma bela reflexão acerca dos desafios para a evangelização juvenil. No
âmbito de uma igreja em saída, o texto discute e provoca para o reconhecimento da
juventude como realidade teológica, o ser pastoral juvenil popular e sinodal. Por fim, esta
edição apresenta uma resenha elaborada por André Luiz dos Santos da obra Eclesiologia:
perspectivas teológico-pastorais que, em sete capítulos, tematiza a missão e os desafios da
Igreja na contemporaneidade.
Com esta edição, a Revista Teopráxis espera contribuir para ampliar o debate
acerca das temáticas que cercam os campos da teologia e da educação, fomentando aos
leitores aprofundamentos e reflexões capazes de fortalecer saberes e práticas que sirvam de
enfrentamento às mazelas que afetam as relações humanas na contemporaneidade.
BREGALDA, Regiano
Editorial
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p. 4-5, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
TEOLOGIA E EDUCAÇÃO
Relações históricas e aproximações
consistentes
THEOLOGY AND EDUCATION
Historical relationships and consistent
approximation
Dom Edgar Xavier Ertl*
Elcio Alcione Cordeiro**
Resumo: A reflexão deste artigo propõe a relação e as contribuições que
existem entre Teologia e Educação. Nesse sentido, busca-se um breve
entendimento sobre o que é Teologia e o que é Educação. Posteriormente,
apresenta-se algumas das relações que se estabelecem entre ambas, como
também, as contribuições que uma área entrelaça a outra em busca de uma
sociedade melhor. O texto tem por intenção desenvolver uma apreciação
reflexiva do tema usando-se da metodologia de análise bibliográfica. Em
síntese, existem relações e contribuições entre a Teologia e a Educação
desde as suas origens. Teologia e Educação interligam-se na busca de um
ser humano integral que tenha compromisso com a transformação social.
Palavras-chave: teologia. Educação. Fraternidade. Ser Humano. Sociedade.
Abstrac: The reflection of this article proposes the relationship and the
contributions that exist between Theology and Education. In this sense, a
brief understanding of what is Theology and what is Education is sought.
Subsequently, some of the relationships stablished between them is
presented, as well as the contributions that one area intertwines with
another in search of a better society. The text intends to develop a
reflective appreciation of the theme, using the methodology of
bibliographic analysis. In summary, there are relationships and
contributions between Theology and Education since its origins. Theology
and Education are intertwined in the search for an integral human being
who is committed to social transformation.
Keywords: theology. Education. Fraternity. Human Being. Society.
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 6-21, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.70
* Bispo da Diocese de Palmas-Francisco
Beltrão. Licenciado em Filosofia e em
Teologia pelo Instituto de Filosofia e
Teologia de Santa Maria (IFTESMA). Possui
Mestrado em Teologia pela Pontifícia
Universidade Gregoriana de Roma (2003)
em Teologia Sistemática/Dogmática
E-mail: domertl@hotmail.com
** Padre da Diocese de Palmas-Francisco
Beltrão. Possui graduação em Teologia pela
Faculdade Missioneira do Paraná (2012);
Licenciatura em Filosofia pela Faculdade
Entre Rios do Piauí (2015); Licenciatura em
História pelo Centro Universitário Cesumar
(2021); Pós-graduação em Metodologia do
Ensino de Filosofia e Sociologia pela
Universidade Cândido Mendes (2015); Pós-
graduação em Ensino de Filosofia pela
Universidade Cândido Mendes (2016).
Mestre em Educação pela Universidade
Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE
(2020). Atualmente, Professor no Instituto
de Teologia e Pastoral (ITEPA).
E-mail: elciocorde@hotmail.com
https://orcid.org/0000-0001-6304-0286
Recebido em 08/12/2021
Aprovado em 21/06/2022
7
1 INTRODUÇÃO
O compromisso de estabelecer relações e contribuições entre Teologia e Educação
abre possibilidades para muitas compreensões vitais, sociais, culturais, históricas e
religiosas. Pensar Teologia é buscar as razões daquilo que se crê. Escrever o que não se vê.
Confiar no Divino e esperançar um futuro feliz. Refletir a Educação é conceber novas
formas de moldar um ser humano arraigado de valores fundamentais para o ser e o
mundo. Educar é uma arte. Educar é moldar a alma dos seres humanos. Por isso tudo,
pretende-se apresentar um caminho que possibilite provocar o estudo, reflexão e práticas
teológicas educativas para fundamentar a dignidade da pessoa humana na busca da
transformação social.
Far-se-á necessário compreender o significado dos termos Teologia e Educação,
como também alguns acontecimentos históricos que permeiam ambos os campos. A
compreensão das áreas de interesse nesse artigo possibilitará desenvolver as posteriores
reflexões com sentido histórico e fundamentado em seus significados.
As relações entre Teologia e Educação acontecem de múltiplas maneiras. Porém,
observando o caminho da educação cristã optar-se-á por apresentar a reflexão que brotou
do Concílio Vaticano II (1962-1965), o qual representa um dos maiores concílios da
história da Igreja Católica.
As contribuições da Teologia para a Educação e vice versa serão abordadas tendo
como fundo a realidade brasileira naquilo que compõe as Campanhas da Fraternidade
sobre a Educação. É uma reflexão histórica que fundamenta teologicamente as
contribuições da Igreja para a Educação.
O tema é de relevância atual, prova disso é o empenho do Papa Francisco em
apresentar um Pacto Educativo global, a fim de construir uma nova sociedade, motivando
os seres humanos e se comprometerem com a vida e a ecologia. Este acontecimento
magnífico far-se-á presente na última parte deste artigo, o mesmo representa uma
proposta para a continuidade da reflexão que entrelaça Teologia e Educação.
Enfim, a reflexão é linear, respeita os conceitos e acontecimentos hisricos,
procura estabelecer considerações claras que possibilitem apresentar as relações e as
contribuições que entrelaçam Teologia e Educação na busca de um ser humano livre,
auntico e capaz de humanidade.
2 TEOLOGIA E EDUCAÇÃO EM DIÁLOGO
2.1 A Teologia: Conceituação e historicidade
Em pleno século XXI, marcado por grandes mudanças, afetado por tantas situações
de riscos, alertado sobre temeridades climáticas, urge, como sempre na história, um
sentido ampliado das coisas, que responda as perguntas que a razão não consegue por si só.
Esse sentido, quem desenvolve é a Teologia, ciência sobre Deus, estudo sobre o Divino.
Usualmente, o conceito de Teologia mais destacado é “estudo sobre Deus”. Todavia,
de forma mais detalhada define-se que: “[...] teologia compõe-se etimologicamente de dois
termos, que lhe definem grandemente a natureza: Théos + logia = Deus + ciência. No
centro está Deus, seu objeto principal. Qualquer reflexão teológica refere-se de alguma
maneira a Deus”
1
.
1 João Batista LIBÂNIO e Afonso MURAD, Introdução a Teologia: perl, enfoques, tarefas, p.63.
ERTL, Dom Edgar Xavier; CORDEIRO, Elcio Alcione
Teologia e educação: Relações históricas e aproximações consistentes
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p. 6-21, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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O termo “Teologia” não foi criado pela própria Teologia, mas surge no pensamento
grego, depois incorporou-se à proposta cristã para indicar suas reflexões sustentadas a
partir da revelação e da fé.
O conceito aparece pela primeira vez nos escritos do filósofo grego Platão (427-
347a.C), “Por teologia ele entende os mitos, as lendas e histórias dos deuses criticados
filosoficamente, desmistificados e interpretados no sentido e segundo as normas da
educação política e purificados de toda inconveniência”
2
. O caminho para a compreensão
das coisas que estavam entre o mito e o logos, a isso denominou-se de Teologia.
Em seguida o também filósofo grego Aristóteles (384-322a.C) apoderou-se do uso e
significado da palavra Teologia de diferente modo, apresentando uma reflexão filosófica
para além da física, metafísica, chama-a de filosofia primeira, na qual, “[...] tem por objeto
o ser enquanto ser o que é estudado nas suas relações e causas primeiras até provar que
existe um ser absolutamente primeiro de quem depende o céu e a terra”
3
.
As origens apontam para a Teologia como uma reflexão que traz em seu bojo a
religião e Deus. A Teologia é a área em que se reflete os deuses. A ressignificação do
Termo para a realidade cristã se deu de forma sistemática através de pensadores cristãos.
Para compreender a Teologia como área que designa o conhecimento sobre Deus e
as nuances da esforçaram-se os teólogos, aqueles que refletem sistematicamente sobre
Teologia, em buscar o início de uma compreensão cristã:
Tal uso foi preparado por Justino, mas sobretudo pelos alexandrinos Clemente
e Orígenes, que não se limitaram a definir somente em forma negativa os mitos
e as criações losóficas dos gregos, mas reconheceram neles vestígios do
verdadeiro logos e viram a sua realização e verdadeiro valor na revelação de
Jesus Cristo
4
.
De modo mais distinto e claro, a fé cristã aceitou e definiu o termo Teologia entre os
séculos IV e V: “Citemos aqui Eusébio de Cesaréia, quando se tornou o nome
característico para indicar o verdadeiro conhecimento de Deus e aparece nos enunciados
trinitários e cristológicos”
5
.
Santo Agostinho de Hipona (354-430) afirma em seu pensamento a especificidade
cristã a palavra Teologia: “Para Agostinho a teologia não se resume a um discurso
gerico sobre a divindade, como pensavam os gregos, mas uma refleo sobre a
essência do Deus da Revelação
6
.
Santo Tomás de Aquino (1225-1274) à Teologia o seu caráter de ciência: “No peodo
da Escostica, Tomás de Aquino ao apropriar-se do pensamento de Aristóteles passa a
conceber a teologia como ciência especulativa que faz uso de um saber racional e científico”
7
.
Nesta perspectiva cristã, o termo Teologia foi ressignificado, o logos, tornou-se o
verbo encarnado, não uma mera designação às coisas, mas o próprio Jesus Cristo, e o Deus
é o Deus da revelação bíblica e não os deuses da mitologia.
A Teologia acontece sob a inspiração do Espírito Santo, traz a compreensão da a
tantos quantos buscam respostas teológicas para a vida: “Pela contemplação e estudo dos
que creem, os quais as meditam em seu coração; é em especial a pesquisa teológica que
aprofunda o conhecimento da verdade revelada” (CaIC, n.94).
2 Heinrich FRIES, Dicionário de Teologia, p.295.
3 Heinrich FRIES, Dicionário de Teologia, p.298.
4 Heinrich FRIES, Dicionário de Teologia, p.298.
5 Heinrich FRIES, Dicionário de Teologia, p.299.
6 Honório RITO, Introdução à Teologia, s/p.
7 Honório RITO, Introdução à Teologia, s/p.
ERTL, Dom Edgar Xavier; CORDEIRO, Elcio Alcione
Teologia e educação: Relações históricas e aproximações consistentes
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p. 6-21, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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Enfim, a Teologia é a interpretação da Tradição, Magistério e Sagrada Escritura, a
partir destes pilares, faz-se Teologia. Denomina-se teólogo aquele que à luz da ilumina a
realidade a ser transformada. “Teologia é reflexão do que nos foi dito por Deus, do que foi
pensado por Deus”
8
.
2.2 Educação: Desenvolvimento humano
A educação é uma arte. Arte de educar seres humanos, torná-los capacitados para o
mundo, seres conscientes, livres e autênticos. Dessa maneira tem-se a seguinte
compreensão: “Educação. Do latim educere’, que significa extrair, tirar, desenvolver.
Consiste essencialmente, na formação do homem de caráter”
9
.
A educação está presente na história humana desde que o homem se conhece por
gente. Ninguém é alheio à educação. Informalmente sempre o que aprender naquilo
que se conhece como senso comum. Formalmente, ela molda a alma dos eternos
aprendizes, isto é, todo ser humano que busca ser mais no espaço que se compreende bom
senso. Sistematicamente compreende-se que:
A educação aparece sempre que surgem formas sociais de condução e controle da
aventura de ensinar e aprender. O ensino formal é o momento em que a educação
se sujeita a pedagogia (a teoria da educação), cria situações próprias para o seu
exercício, produz os seus métodos, estabelece suas regras e tempos, e constitui
executores especializados. É quando aparecem a escola, o aluno e o professor
10
.
No campo da educação essa singular diferenciação, entre a educação geral
transmitida livremente entre todos e a educação sistemática que busca o saber para
desenvolver uma função.
Historicamente, foi na cultura grega que a educação se desenvolveu enquanto área a
ser compreendida sistematicamente, “[...] os primeiros assuntos e problemas da educação
grega foram os dos ofícios simples dos tempos de paz e de guerra
11
. Aos poucos entre os
primeiros homens começa-se a envolver além dos cuidados rústicos o saber da agricultura
e do pastoreio para a subsistência cotidiana.
Aqueles que permaneciam nas normas de trabalho, na reprodução de ações para
fazer determinada atividade, os gregos denominaram de tecné, estas funções eram
assumidas por trabalhadores livres e escravos. Aproximadamente no século VI a.C, surge o
entendimento que denominaram de “teoria”, dirige-se aquelas normas de vida
desenvolvidas a um saber que ensina para ser um homem livre, desenvolvido e
participante na vida da pólis é o que corresponde a educação formal. Percebe-se que pouco
a pouco a educação é acompanhada de desigualdade social.
A escola como a entendemos surge nas proximidades do ano 600 a.C: “Só depois da
invenção da escola de primeiras letras é que o seu estudo é pouco a pouco incorporado à
educação dos meninos nobres. Assim, surgem em Atenas escolas de bairro, o raros ‘lojas
de ensinar’ abertas entre as outras no mercado”
12
.
Curiosamente, quem detinha o papel de levar os filhos dos nobres a estas escolas
eram velhos escravos, aqueles que conduziam à escola, recebiam o nome de pedagogos,
condutores de crianças. O pedagogo passava o tempo todo com a criança no restante do
8 Joseph Cardeal RATZINGER, Natureza e missão da Teologia, p.89.
9 MINISTÉRIO DE EDUCAÇÃO E CULTURA apud Carlos Rodrigues BRANDÃO, O que é Educação, p.63.
10 Carlos Rodrigues BRANDÃO, O que é Educação, p.26.
11 Carlos Rodrigues BRANDÃO, O que é Educação, p.36.
12 Carlos Rodrigues BRANDÃO, O que é Educação, p.40.
ERTL, Dom Edgar Xavier; CORDEIRO, Elcio Alcione
Teologia e educação: Relações históricas e aproximações consistentes
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Passo Fundo, v.39, n.132, p. 6-21, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
10
dia, acabava que era ele o verdadeiro mestre: “Eles conviviam com a criança e ao
adolescente e, mais do que os pais, faziam a educação dos preceitos e das crenças da cultura
da pólis. O pedagogo era o educador por cujas mãos a criança grega atravessava os anos a
caminho da escola, por caminhos da vida”
13
.
Dessa forma a educação foi perpassando no tempo, se desenvolveram escolas, na
maioria delas conduzidas pelos filósofos, como é o caso de Platão com a Academia e
Aristóteles com o Liceu. Foram os filósofos sofistas que “democratizaram” o ensino
superior, embora tornaram-no remunerado, mas era aberto a todos, que detinham
condições financeiras para pagar.
No Brasil a educação formal se inseriu no contexto da colonização. Com a chegada
dos Padres da Companhia de Jesus o ensino teve a missão de “civilizar” os povos nativos. A
educação oferecida pelos Jesuítas era de caráter religioso e de língua portuguesa, dada aos
índios, brancos e cristãos, sendo que os negros escravos eram excluídos dessa possibilidade.
A primeira instituição de ensino institucionalizada foi criada em 1549: “A primeira
instituição de ensino criada no país foi o Colégio de Salvador da Bahia, fundado pelo padre
Manoel da Nóbrega, em 1549, a segunda surgiu no ano seguinte fundada pelo jesuíta
Leonardo Nunes em São Vicente, litoral de São Paulo”
14
.
Somente com a expulsão da Companhia de Jesus no século XVIII é que o ensino foi
desvinculado da religião, passando a estar no domínio laico. Mas, exclusivamente em 1808
com a vinda da família real para o Brasil foi que a educação deu passos significativos:
João VI promoveu uma série de mudanças na tentativa de tornar o ambiente
cultural da sociedade colonial o mais próximo possível da metrópole, a criação
das primeiras faculdades de medicina na Bahia e no Rio de Janeiro em 1808 e da
Escola de Belas Artes em 1816, impulsionou o desenvolvimento científico no
Brasil. Apesar desses avanços, as primeiras universidades brasileiras foram
criadas no início do século XX
15
.
A partir daí a educação segue o mundo político e de finanças, perpassando pelo
período republicano, regime militar, abertura da democracia e a nova constituição de
1988, demonstraram suas preocupações com a educação, inclusive tornando-a direito
inalienável da pessoa humana.
Enfim, como destaca Martha Nussbaum
16
:
Educação é para gente. Antes de podermos planejar um sistema educacional,
precisamos entender os problemas que enfrentamos para transformar alunos
em cidadãos responsáveis que possam raciocinar e fazer uma escolha adequada a
respeito de um grande conjunto de temas de importância nacional e
internacional
17
.
O ato de educar permanece indissociável da vida. Seja ele no âmbito de senso
comum, nas mais diversas demandas da vida como seja no aspecto formal para exercer
uma profissão. A educação sempre será a fôrma para desenvolver seres humanos.
13 Carlos Rodrigues BRANDÃO, O que é Educação, p.43.
14 Lorena Castro ALVES, A história da educação no Brasil, s/p.
15 Lorena Castro ALVES, A história da educação no Brasil, s/p.
16 Filósofa estadunidense, pesquisadora social, artista, apaixonada por estudos clássicos, atriz, professora de filosofia e
de direito, e uma das intelectuais mais influentes do liberalismo político contemporâneo.
17 Martha C. NUSSBAUM, Semns lucrativos: por que a democracia precisa das humanidades, p.27.
ERTL, Dom Edgar Xavier; CORDEIRO, Elcio Alcione
Teologia e educação: Relações históricas e aproximações consistentes
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p. 6-21, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
11
2.3 Educação teológica cristã
Como pode-se perceber na breve história apresentada acima sobre o
desenvolvimento dos dois campos, Teologia e Educação nunca se distanciaram, pelo
contrário, caminham juntas, uma necessita e se completa com a outra. A Teologia precisa
da Educação para ser esclarecida, desenvolvida e posta em prática. A Educação necessita da
Teologia para dar sustentáculo naquilo que se aprende. Opta-se neste artigo por direcionar-
se à educação cristã, isto é, um elo entre a educação que concebe o ser humano como capaz
de Deus, diferenciando-se dos animais pela sua capacidade de raciocínio e transcendência.
A reflexão teológica preocupa-se com a educação dos seres humanos. Muitos são os
escritos e destaques que a Igreja Católica tem feito no decorrer da história, os quais
contribuem para uma sociedade mais humana, livre e autêntica.
A Teologia não é um campo estritamente de domínio e limites religiosos, ela
perpassa, e contribui naquilo que se entende por educação, sem perder a sua identidade. A
educação imbuída de um significado metafísico para o ser humano lhe a possibilidade
de ampliar seus horizontes de compreensão da vida.
Para compreender melhor esta relação entre Teologia e Educação usa-se alguns
excertos da Declaração Gravissimum Educationis sobre a educação cristã, do Concílio
Vaticano II (1962-1965), a qual, apresenta com clarividência a importância da educação
cristã nas escolas, unindo um fundo teológico com o ensino formal.
Os padres conciliares deram importância vital da educação na vida humana, pois
compreenderam que a educação se relaciona diretamente com a realização da vida em
Jesus Cristo. Assim destacam:
A Santa Mãe Igreja tem sua responsabilidade quanto ao progresso e expansão
da educação, uma vez que, para cumprir o mandato recebido de seu divino
Fundador, a saber, o de anunciar o mistério da salvação aos homens todos e o
de tudo restaurar em Cristo, deve cuidar de toda a vida do homem (CONC.
VAT. II, 1968, n.1502).
A Igreja defende a todos os homens o direito indispensável à educação. A educação
aprimora a pessoa em relação ao seu fim último. A educação possibilita ao ser humano
conviver em sociedade, sendo seres de diálogo e na busca pelo bem comum.
Cabe à Igreja a tarefa de educar, seja na educação geral dos valores e princípios como
também sentir-se responsável em suas instituições para uma educação que promova a
vida, justiça, fraternidade, solidariedade, etc.
A escola tem sim seu papel singular, pois entre todos os instrumentos de educação, a
escola possui uma importância que lhe é própria.
E por força de sua missão que ela aperfeiçoa, com desvelo ininterrupto, as
faculdades intelectuais, desenvolve a capacidade de julgar com retidão, faz
participar no patrimônio da cultura adquirido por gerações passadas, promove
o sentido dos valores, prepara a vida profissional, faz nascer relações de
amizades entre alunos de índole e condição diversa e assim favorece a
disposição mútua de se compreenderem (CONC. VAT. II, 1968, n.1510).
O progresso de um povo depende de uma educação adequada aos desafios do
mesmo. Por isso, a educação é essencial na vida dos crentes. Obviamente que a educação se
inicia em casa, se prolonga na escola através do ensino. A família possui papel de destaque
na boa educação dos filhos e assim da nova geração. “Aos pais, porém lembra a grave
tarefa, que é a sua, de tudo disporem e mesmo exigirem que seus filhos possam valer-se
daquela assistência e desenvolver a formação cristã em harmonioso progresso com a
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profana” (CONC. VAT. II, 1968, n.1516). Aqui fica clara a relação da Teologia e da
Educação, ambas se inter-relacionam.
As instituições católicas sempre visam a formação cultural e humana da pessoa.
Deste modo, no espaço onde se localiza a instituição deve ser criado um recinto dinâmico
onde os valores do Evangelho possam ser emanados a todos. Os professores (as) precisam
imbuir-se de toda formação necessária para bem educar a futura geração: “Preparem-se,
pois, com interesse especial, munidos de títulos idôneos de comprovada ciência profana e
religiosa, e dotados da arte pedagógica de acordo com as pesquisas mais recentes” (CONC.
VAT. II, 1968, n.1516).
Da mesma maneira, em relação ao ensino superior, a Igreja defende um caloroso
encontro entre os princípios teológicos e as descobertas da educação: “No que dela
depende, esforça-se porque, por uma organização metódica, as disciplinas todas sejam
cultivadas com princípios próprios, com métodos próprios e com liberdade própria de
pesquisa científica, de forma que se atinja uma sempre e mais profunda compreensão
delas” (CONC. VAT. II, 1968, n.1523).
A e a razão caminham de mãos dadas nas descobertas e progressos humanos. A
colaboração e o diálogo entre Teologia e Educação é o caminho mais seguro para a
formação da nova geração. Assim pode-se perceber algumas contribuições da Igreja
Católica, tanto do ponto de vista da Igreja no Brasil quanto a nível universal.
3 CONTRIBUIÇÕES DA IGREJA CATÓLI CA DO BRASIL PARA A EDUCAÇÃO
Dentre as várias contribuições da reflexão teológica católica opta-se por trabalhar
alguns documentos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e trazer à reflexão
quatro pontos importantes: A Campanha da Fraternidade de 1982: “A verdade vos
libertará” (Jo 8,32); Campanha da Fraternidade de 1998: A serviço da vida e da esperança;
Campanha da Fraternidade de 2022: “Fala com sabedoria, ensina com amor” (Cf. Pr 31,26). E,
o Pacto educativo global proposto pelo Papa Francisco em 2020, o qual tem por finalidade
incentivar uma educação humanista, solidária e ecológica em vista da transformão da sociedade.
3.1 Campanha da Fraternidade (1982): A verdade vos libertará(Jo 8,32)
A Campanha da Fraternidade de 1982 representou a 19ª realizada pela CNBB com o
intuito de movimentar a comunidade para a evangelização. Pela primeira vez na história
da Campanha da Fraternidade o tema da Educação entrou em cena como protagonista.
A CF tem a missão de reunir as comunidades cristãs para vivencia da unidade
pastoral em determinada realidade no tempo que antecede a grande festa da Ressurreição.
O tema da Educação fora pertinente, à reflexão acerca da contribuição da educação
para a construção de uma sociedade melhor evidencia que, “A Igreja, colaborando com os
demais setores sociais responsáveis, assume a educação sob todas as formas que levam a
construção de uma sociedade justa e fraterna”
18
.
O lema: “A verdade vos libertará” (Jo 8,32) relembra daquilo que o povo precisa
libertar-se. Lembra a realidade do pecado social que se manifesta na sociedade pela falta de
fraternidade. A educação aí se manifesta: “A educação é o processo de busca desta Verdade
que liberta em toda a vida pessoal e social. Quando desvirtuado, contudo, este processo
favorece e consolida a escravidão e dominação”
19
.
18 CNBB, A verdade vos libertará, Texto-base CF 1982, p.6.
19 CNBB, A verdade vos libertará, Texto-base CF 1982, p.7.
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O que a CNBB propôs com a CF de 1982 foi: “Ver nossa realidade educacional. Julgar
esta realidade à luz da fé, agir de modo coerente”
20
. Nesse sentido, a educação, segundo a
Igreja, almeja um homem íntegro, capaz de transformação social.
Olhando para a realidade, percebeu-se que os processos educativos da família
estavam sendo afetados pelo modelo de sociedade industrial. Em razão disso, aumenta o
problema dos abandonados, dos moradores de rua, bem como as situações de violência e
prostituição. Da mesma forma, chamava-se a atenção para o uso da educação em
detrimento de lucro e poder sem responsabilidade social. O povo não pode ser mero
espectador, precisa inserir-se nos meios de participação.
A visão tecnicista de educação é combatida pela Igreja através da CNBB: “Percebe-se,
no entanto, que a preocupação básica nos processos aplicados é melhorar a imagem do país
comparada à de outras nações, na visão tecnicista que privilegia rentabilidade em termos
estatísticos”
21
. Uma educação sem visão crítica faz do povo uma massa de manobra.
Outra questão importante foi o destaque às Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e
Organizações Populares. Nestes espaços o pobre tem vez e voz. A comunhão e a
participação estão presentes nos processos das pequenas comunidades onde a união e a
partilha fazem toda a diferença.
O julgar da CF de 1982, se apresentou na forma de fundamentos para analisar a
educação em vista da fraternidade. Como por exemplo, os direitos fundamentais de toda
pessoa humana. “A base de todos esses direitos é a dignidade da pessoa, dotada de razão e
consciência. O pleno desenvolvimento do homem como pessoa, o fortalecimento do
respeito a seus direitos e liberdades constituem objetivos da educação
22
.
A pessoa humana tem sua dignidade alinhada à educação, pois a educação promove
o outro. Nesse sentido, a própria história da salvação pode ser vista como processo
educativo, porque houve toda uma preparação para a libertação, como pode-se perceber
nos primeiros capítulos do Livro do Êxodo, quando Deus através de Moisés prepara seu
povo para a libertação. Para isso, foi necessário viver e trilhar um caminho de
fraternidade, solidariedade e justiça. A culminância desse caminho se dá em Jesus Cristo.
A Igreja na busca pela apresentação da proposta cristã sobre a verdade é profeta em
denunciar aquilo que desestrutura a formação do homem: “Portanto, este serviço prestado
à verdade, como participação no serviço profético de Cristo, é missão da Igreja que
procura cumpri-la nos diversos contextos históricos”
23
.
A educação deve estar orientada na construção de fraternidade. No processo de
transformação da realidade a mesma tem um grande papel. “O objetivo principal desta
educação para a justiça consiste no esforço de despertar a consciência para que saiba
reconhecer a situação concreta, e no convite para alcançar uma melhoria total”
24
. A
educação na perspectiva da Igreja necessita ser libertadora e aberta ao diálogo.
Na perspectiva da ação, a CF de 1982 trouxe várias iniciativas para que a educação se
torne mais humana, autêntica e livre a serviço de uma sociedade fraterna. A iniciar pelos
pais, estes devem assumir a primeira educação de seus filhos. É no berço familiar que se
aprende a educação que propicia a sabedoria da vida.
Lembra a CNBB que os saberes da cultura popular deveriam ser destacados e
valorizados: “Promover a revitalização da cultura popular, em suas rias formas de
20 CNBB, A verdade vos liberta, Texto-base CF 1982, p.8.
21 CNBB, A verdade vos libertará, Texto-base CF 1982, p.9.
22 CNBB, A verdade vos libertará, Texto-base CF 1982, p.12.
23 CNBB, A verdade vos libertará, Texto-base CF 1982, p.17.
24 CNBB, A verdade vos libertará, Texto-base CF 1982, p.17.
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expressão, facilitando-lhe a criação, preservação e divulgação”
25
.
No mesmo sentido, o compromisso com o bem comum, na superação do individualismo
entrou para a discussão mostrando que são as mediações que propiciam mudanças:
Criar condições para que pessoas e grupos possam discernir critérios que
assegurem o bem comum, tais como: respeito pela pessoa humana, interesse por
sua promoção integral, a começar pelos mais carentes, fidelidade aos deveres de
cidadão, esforço para cumprir e aperfeiçoar as leis, participação nos sacrifícios
pela comunidade
26
.
Outra questão teológica importante a ser destacado é a opção pelos pobres, que
segundo o Documento de Puebla, se observa como a tendência mais notável da experiência
religiosa latino-americana
27
: “Dar prioridade aos setores pobres de nossa população,
orientando preferencialmente para eles os serviços e recursos educativos da Igreja”
28
.
Assim, se privilegia as Ceb’s como geradoras de processos educativos de libertação e
evangelização. A opção pelos pobres é a opção do Evangelho.
Enfim, a educação permeada com a reflexão teológica com bases na fraternidade,
trouxe à baila reflexiva o futuro da sociedade. A libertação integral do ser humanos
compete a esse processo, no qual a Teologia inspira iniciativas para a educação, através da
reflexão da Igreja.
3.2 Campanha da Fraternidade 1998: A serviço da vida e da esperança
Colocar a educação a serviço da vida e da esperança é missão teológica de todas as
instituições, como família, Igreja, escola, universidades, a fim de que se promova a
dignidade e a verdadeira solidariedade. Este modo de pensar perpassa o texto base da CF
de 1998.
Na busca de uma educação libertadora, observando a realidade social brasileira a CF
de 1998 interpelou a mudança de mentalidade no compromisso de buscar a dignidade da
pessoa humana.
Os principais objetivos da CF de 1998 eram:
a) Colaborar com as pessoas na sua busca de realização; b) Favorecer a criação e
o fortalecimento de comunidades onde todos participem e se apoiem
fraternalmente; c) Estimular o exercício da cidadania, em favor de uma
sociedade justa e solidária; d) Promover ações para a erradicação do
analfabetismo em sentido amplo
29
.
A Igreja a partir da fé impulsiona-se a lutar pela esperança de uma sociedade melhor.
Assim, no aspecto do ver a realidade a CF de 1998 destaca a realidade brasileira.
Inicialmente observam que a educação é um direito indispensável. Porém, é preciso falar
de educação e do seu contexto para entendê-la e garanti-la:
O povo brasileiro valoriza muito a família que dá boa educação aos seus filhos e
os prepara para serem melhores. Mas milhões de famílias enfrentam muitas
25 CNBB, A verdade vos liberta, Texto-base CF 1982, p.20.
26 CNBB, A verdade vos libertará, Texto-base CF 1982, p.20.
27 O documento de Puebla menciona que: “A abertura pastoral das obras e a opção preferencial pelos pobres é a
tendência mais notável da vida religiosa latino-americana. De fato, cada vez mais, os religiosos se encontram em
zonas marginalizadas e difíceis, em missões entre indígenas, no trabalho silencioso e humilde. Esta opção não supõe
exclusão de ninguém, mas sim uma preferência e uma aproximação ao pobre” (Tradução nossa) (CELAM, 1990, n.733).
28 CNBB, A verdade vos libertará, Texto-base CF 1982, p.24
29 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.7.
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dificuldades e ficam quase impossibilitadas de educar como gostariam as suas
crianças. É lamentável que tantos menores abandonem as suas famílias por falta
de condições para ali viverem
30
.
Muitos desafios havia pela frente, eram e são de toda ordem: pobreza, evasão escolar,
falta de investimentos, analfabetismo, formação para professores, desigualdade social, etc.
Dentre estes desafios destaca-se a questão da economia e da política:
A globalização da economia e políticas neoliberais exacerbadas, ao adotarem
como norma a pura concorrência (selvagem), atingem diretamente o processo
educativo de muitas maneiras. Elas criam novas maneiras de pensar e agir.
Oferecem nova escala de valores. O que vale é o que se pode vender e comprar,
tudo vira mercadoria (até a própria pessoa humana). Os direitos humanos ficam
num segundo plano. A pessoa humana não vale pelos seus direitos e capacidades,
senão pela possibilidade de comprar (consumidor) e vender (produtor)
31
.
Este desafio perdurou para todos os próximos anos que se sobrepuseram. A
supervalorização da produção de capital em detrimento da desvalorização da dignidade
humana. Enfrentar todas as realidades desafiadoras com o devido senso crítico é tarefa da
Teologia e da Educação.
No aspecto do julgar, a CF de 1998 apresenta algumas pistas importantes para a
educação a partir da visão bíblico pedagógica. No âmbito da pessoa, comunidade,
cidadania e alfabetização vêm dicas importantes: “a) Ajudar a pessoa humana a realizar-se;
b) Favorecer a criação e fortalecimento de comunidades fraternas e participativas; c)
Estimular o exercício da cidadania; d) Promover ações de erradicação do analfabetismo, no
sentido amplo”
32
. Na busca de uma educação integral, faz-se necessário iniciativas,
denúncias e movimentos, as quais urgem como essenciais no século XXI.
A Igreja, bem como outros setores, percebeu que a realidade vivenciada era marcada
pela exclusão. Diante disso, a educão deve servir de ferramenta para a promoção humana:
“A educação tem de ajudar a despertar em cada homem e mulher a consciência de sua
própria dignidade, e, também, a sua capacidade de assumir a responsabilidade de fazer a
sua parte para possibilitar vida, e vida de qualidade, para todos e cada um na comunidade”
33
.
A educação necessita voltar a ser construção de identidade e história na busca pela
humanização. Nesse itinerário a procura pela realização humana em relação com o mundo,
com as pessoas e com Deus é constante.
O chamado fiel que brota desta reflexão do texto base da CF de 1998 é recriar uma
cultura da vida. Teologicamente o homem e a mulher são continuadores na obra da
criação. Para isso, busca-se uma ética da solidariedade, colocando em prática a participação
ativa através de todos os meios humanos de comunicação.
O modelo educativo proposto é o próprio modo pedagógico de Jesus Cristo: “O
período de convívio com os discípulos foi um processo educativo no qual Jesus os foi
preparando para a missão. O processo inclui diálogo pessoal, convívio, fazer em
conjunto”
34
. A coletividade é um modo concreto e viável para buscar mudanças.
Olhando para os mais pobres, os descartáveis da sociedade, a CF de 1998 destaca qual
educação almeja: “A educação que queremos, em coerência com o projeto de Jesus, é
também libertadora, capaz de abrir os olhos do povo para os deveres e direitos humanos e
30 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.17.
31 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.36.
32 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.43.
33 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.43.
34 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.53.
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para as exigências da cidadania”
35
. Uma educação de qualidade tem capacidade de erradicar
a desigualdade social.
No nível da ação a CF de 1998 propõe muitas obras concretas que dependem do
engajamento de cada um, desde a valorização da pessoa humana e família como base para
um projeto de vida e esperança como toda a comunidade. Fortalecer o espírito
comunitário com organizações coletivas em busca de cidadania. Como por exemplo:
a) Criar e dinamizar espaços de informação, de reflexão, de oração e
discernimento sobre questões políticas; b) Realizar em todas as escolas
atividades pedagógicas especificas de educação para a cidadania [...]; c)
Sintonizar as comunidades com a Semana Social, a Semana da Cidadania, o
Grito dos Excluídos e com outras iniciativas de mobilização do povo em prol da
cidadania; d) Participar ativamente de Conselhos Comunitários, associações de
bairro, Conselhos de educação, Conselhos Escolares, de Saúde, Conselhos
Tutelares e outras instancias a serviço do povo”
36
.
Outro aspecto importante é o incentivo ao Ensino Religioso garantido pela
Constituição Federal de 1988, criando espaços para debate que haja reta reflexão sobre a
valorização da vida, da ética, da moral, da solidariedade e da justiça.
Dentre outras iniciativas a serem tomadas, como a economia solidária, oficina de
troca de saber, cursos por via dos meios de comunicação, alfabetização tarefa de todos,
instituições para a educação popular, destaca-se o papel da Pastoral da educação, como
presença e ação da Igreja no mundo da educação, descobrir formas de evangelização nos
processos educativos sem ferir a educação formal:
A Pastoral da Educação, evidentemente, todo o seu apoio ao grande projeto
de erradicação do analfabetismo no Brasil. Este conviver, planejar, refletir, orar,
agir juntos, avaliar e procurar juntos caminhos novos constitui um importante
processo educativo de renovação das pessoas, de grupos, da própria Igreja e da
sociedade. E, neste sentido, toda a ação educativa deve ser evangelizadora e toda
a evangelização deve ser ação educativa
37
.
Enfim, a partir das necessidades de cada localidade é preciso agir engajadamente por
uma educação libertadora, à luz da fé transformar a realidade com ações concretas.
3.3 Campanha da Fraternidade 2022: Fala com sabedoria, ensina com
amor” (cf. Pr 31,26)
A Campanha da Fraternidade 2022 relembra a educação como prioridade para uma
mudança social. Em sintonia com o Pacto Educativo Global proposto pelo Papa Francisco
em 2020, esta CF quer apresentar que existem muitas lições à luz da Palavra de Deus sobre
a arte de educar: “A primeira diz respeito ao valor da pessoa como princípio da educação.
A segunda se refere ao ato de correção, que é conduzir ao caminho correto. Não é
repressão, mas é orientar a pessoa no caminho de uma vida transformada,
verdadeiramente convertida à luz da verdade”
38
.
O grande objetivo da CF 2022 é “Promover diálogos a partir da realidade educativa
do Brasil, à luz da cristã, propondo caminhos em favor do humanismo integral e
solidário”
39
. É um itinerário consciente, pensado e possível de concretizá-lo.
35 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.54.
36 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.71.
37 CNBB, A serviço da vida e da esperança, Texto-base CF 1998, p.84.
38 CNBB, Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.16.
39 CNBB, Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.19.
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Primeiramente, no âmbito do ver/escutar, propõe-se que se deve fazer uma escuta
integral, com todo o ser, na busca da totalidade da realidade, a qual está sangrando pelas
consequências da Pandemia causada pelo Covid-19: “Crises como a pandemia da Covid-19
possuem uma força potencializadora do que existia na sociedade de maneira explícita ou
de forma latente. Por um lado, verificamos imensos avanços tecnológicos, por outro,
percebemos a ampliação da pobreza e da desigualdade social”
40
.
Assim, deve-se colocar a pessoa humana em diálogo no centro de toda discussão,
pois “É próprio de quem é educador o cultivo do espírito de construção de uma nova
realidade que promova a cultura do encontro”
41
. Deste modo, a possibilidade de
caminhar juntos, unidos.
A perspectiva humanista da educação é despertada, tendo a democracia e a
participação ativa como grandes verdades de um processo maduro de transformação. De
outro lado, diante da realidade técnico-utilitarista faz-se necessárias novas formas de
transformação. Pois, a constatação que se tem é a seguinte:
Uma educação pública inclusiva e de qualidade é condição da justiça social que
ainda carecemos no Brasil. Quando não priorizamos a educação pública no
Brasil, construímos uma dupla defasagem: não enfrentamos uma dívida social
histórica e prolongamos essa situação de injustiça para as próximas gerações”
42
.
Uma educação inclusiva e equitativa de qualidade para todos em todos os níveis da
educação. O objetivo das instituições educativas deve sempre ser: “[...] formar bons e
honestos cidadãos para exercerem a sua profissão com ética e que prezem sempre pela
dignidade da pessoa humana, bem como, possam atuar iluminados pelos valores cristãos”
43
.
Na perspectiva do julgar/discernir a CF 2022 quer compreender os desafios da
realidade educativa com base no grande mestre e educador Jesus Cristo. Historicamente,
percebe-se que, “O encontro fecundo das pessoas consagradas com o mundo da educação
produziu uma tradição pedagógica sábia e eficaz que, à luz do Evangelho, promove a
pessoa humana por meio da escolarização
44
.
A educação humaniza a pessoa, traz a possibilidade de sua autenticidade. Nessa
perspectiva toma-se a visão cristã de ser humano:
A educação cristã parte da visão positiva e integral do ser humano como ser
responsável por si mesmo e pelo mundo, como ser livre, aberto à transcendência
e culturalmente situado, marcado pela contradição do pecado, mas orientado a
vencê-lo e, eticamente conduzido para a justiça e a fraternidade
45
.
A Igreja é insistente em colocar a pessoa no centro do processo educativo a partir do
diálogo. “Uma educação que provoca a cultura do diálogo é capaz de identificar e nomear
lugares, situações e ambientes onde a intolerância, a violência e o ódio são disseminados e,
assim, refletir suas causas e buscar soluções para sua superação”
46
.
Uma educação que queira ser integral não pode excluir a dimensão da sabedoria
religiosa, pois esta ligação com Deus faz com o que ser humano torne-se capaz de valores
que humanizam o processo.
40 CNBB, Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.22.
41 CNBB, Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.27.
42 CNBB, Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.32.
43 CNBB,Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.41.
44 CNBB, Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.55.
45 CNBB,Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.56.
46 CNBB, Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.66.
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Na perspectiva do agir, é preponderante discernir com clareza, pois, “um projeto
de vida despertado pelos valores da e pelo compromisso com o bem comum terá
incidência concreta na transformação da sociedade”
47
. Um projeto que tem reta intenção
foca no bem comum.
Aspecto importante que a CF 2022 destaca é a educação para um novo humanismo.
“Para educar para o humanismo solidário e construir a civilização do amor é necessário:
promover a cultura do diálogo, globalizar a esperança, buscar uma verdadeira inclusão,
criar redes de cooperação”
48
. A proposta do novo humanismo integral é urgente diante da
realidade brasileira de desigualdade social.
Enfim, além disso, é preciso dar atenção especial à formação de professores; à
política, ao ensino religioso, à cultura e bens culturais, às universidades, à ação pastoral no
interior das comunidades eclesiais missionárias, aos serviços pastorais em favor da
educação, à ação na escola, à educação católica, bem como educar para uma nova economia.
A todos que se veem envolvidos na educação faz-se necessário construir diariamente
uma forma de atender os mais pobres, ser aberto ao novo, ao diálogo, à participação,
promovendo um humanismo solidário educativo.
4 CONTRIBUIÇÕES DO MAGISTÉRIO E PONTIFICADO DO PAPA FRANCI SCO
4.1 Pacto Educativo G lobal
A educação é um dos temas centrais do pontificado de Francisco, que em outubro de
2020 relançou a proposta de um “pacto global” dirigido a todos os sujeitos educacionais da
sociedade para o futuro das novas gerações. O Papa Francisco em audiência, na Sala
Clementina, no Vaticano, na segunda-feira, 22 de novembro de 2021, falou, mesmo que
brevemente, das razões que teve ao propor o Pacto Educativo Global, pensando no
espírito de uma ampla aliança global: “Para formar pessoas maduras, capazes de superar a
fragmentação, a contraposição e reconstruir o tecido de relações para uma humanidade
mais fraterna”. Segundo o Papa, “para alcançar estes objetivos requer coragem: ‘A coragem
de colocar a pessoa no centro’ e de ‘colocar-se a serviço da comunidade’. É preciso coragem
e também criatividade”.
Dom João Justino de Medeiros Silva, Presidente da Comissão Episcopal Pastoral
para a Cultura e Educação - CNBB escreveu que o Papa Francisco é um ícone de educador.
Isso não apenas pela sua formação e experiência em sala de aula ou pelo apoio às
inúmeras iniciativas em favor da educação como bispo auxiliar e arcebispo de
Buenos Aires, mas sobretudo porque trouxe para o seu pontificado uma especial
atenção com a educação. São incontáveis suas intervenções em favor de uma
educação que seja fruto do empenho da família, da escola e da sociedade
49
.
D. Jo Justino, conclui sua apresentão conclamando os católicos do Brasil para que
abracem a causa da educão pois o “momento é único. Trata-se segundo o arcebispo de
Montes Claros, de um projeto que ultrapassa nões, igrejas, religiões, governos, pois centra-se
no compromisso com a educão como “bem comum e como “direito universal”. Que
nenhuma família de nossas comunidades, nenhuma escola e universidade calica de nosso ps,
nenhum agente de pastoral da educação fique de fora do Pacto Global pela Educação” (idem).
47 CNBB,Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.72.
48 CNBB, Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26), Texto-base CF 2022, p.75.
49 CNBB, A Igreja do Brasil, com o Papa Francisco, no Pacto Educativo Global: Orientações Gerais, p.5.
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Teologia e educação: Relações históricas e aproximações consistentes
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p. 6-21, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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O Pacto Educativo proposto pelo Papa Francisco, insere-se, portanto, na
compreensão de um mundo fraterno no qual a educação é o meio pelo qual se pode criar a
verdadeira fraternidade. O grande desafio é educar em uma perspectiva do encontro, do
diálogo entre as culturas, religiões e gerações. Para atingir tal proposta, o Papa Francisco
indica três “coragens”: a de colocar no centro a pessoa, a de cada um investir suas melhores
energias e a de formar pessoas disponíveis para se colocarem a serviço da comunidade
50
.
4.2 Catástrofe educacional
O cardeal Giuseppe Versaldi, Prefeito da Congregação para a Educação Católica,
concedeu uma entrevista e falou desta “catástrofe educacional”, sobremaneira, advinda da
Pandemia do Covid-19, que por um lado, prejudicou dezenas de milhões de crianças do
mundo excluídas de qualquer rede escolar, todavia, por outro lado, o “pacto educativo”
proposto pelo Papa para ajudar a curar esta profunda ferida humana, mais do que social é
um belo caminho de resgate. Segundo o Prefeito da Congregação para a Educação, alguns
elementos são destacados como as sequelas desta oceânica e terrível pandemia. Argumenta
o prefeito que:
Desde o início de seu pontificado, o Papa Francisco, seguindo seu precedente
estilo pastoral, insiste na necessidade de investir os talentos de todos, e
especialmente das gerações mais jovens, a fim de trazer à maturidade uma nova
solidariedade universal e uma sociedade mais acolhedora. Com o lançamento
do pacto educativo, ele renovou o convite para fazer uma aliança para encontrar
uma convergência global para uma educação que saiba unir todas as pessoas e
todos os seus componentes, a fim de encontrar soluções para os problemas da
mudança epocal em curso, iniciar processos de transformação sem medo e olhar
para o futuro com esperança. Este convite foi dirigido a todos: professores,
estudantes, pais, sociedade civil; todos os conhecimentos e disciplinas; as
diversas expressões intelectuais, científicas, artísticas, esportivas, políticas,
econômicas e empresariais em apoio aos jovens
51
.
Enfim, “é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”, assim diz o
proverbio africano, o qual ressalta sobre a importância do trabalho comunirio e a
responsabilidade individual, no que diz respeito ao processo educativo de crianças,
adolescentes, jovens e adultos. Enquanto os programas de educão estiverem sob a
tutela de governos e o de política de Estado, a mesma perde significativamente, pois
a pessoa protagonista da educação deixa de estar no centro desta aldeia. Todos pela
educação eis a nossa grande missão.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo da história, a Igreja Católica teve um papel fundamental na organização,
na reflexão e na prática do trabalho educativo. Em 2008, disse Bento XVI, o papa Emérito,
numa carta à Diocese de Roma, sobre a tarefa urgente da educação: “Todos temos no
coração o bem das pessoas que amamos, em particular das crianças, adolescentes e jovens”.
Reiteradamente temos ouvido ainda o Papa Bergoglio dizer que “não se pode mudar o
mundo se não se muda a educação”. Jacques Maritain, filósofo francês do século XX,
afirmou que “educar significa ajudar a pessoa humana a tornar-se mais humana”.
A principal contribuição que a teologia traz à educação é sua referência à
centralidade da pessoa humana, através da qual ela propõe como paradigma interpretativo
50 CNBB, A Igreja do Brasil, com o Papa Francisco, no Pacto Educativo Global: Orientações Gerais, p.10.
51 Gabriella CERASO, A Congregação para a Educação Católica in Vatican News.
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à dimensão relacional, que lhe é própria. O ser humano é o centro de todo processo
educacional. Ele nunca pode ser visto como meio, em vista de outro fim, por vezes,
prevalece o econômico, mas o motivador e o objetivo maior da educação deve ser o
humano. Pois no ser humano se encontra uma dignidade a ser compreendida, defendida e
motivada, que está na pessoa do aluno, do professor(a), da direção, dos responsáveis, dos
pais e do(a) colaborador(a).
A dignidade é teológica. Faz parte do plano criacional de Deus. Não é uma invenção
científica, nem mesmo ideológica. Tudo isso se resume, de alguma maneira, no
fundamental conceito de pessoa “imagem de Deus” segundo o Livro do Gênesis 1,26:
“Façamos o homem à nossa imagem e semelhança” ou como lemos no Livro da Sabedoria
2,13: “Deus criou o homem imortal, e o fez à imagem do céu”. Partindo desse pressuposto
bíblico, torna-se fundamental ver o ser humano em sua totalidade, em todas as suas formas
de expressão, e para isso esta pessoa precisa de um ambiente favorável e este espaço é-nos
oferecido pela escola, pela “comunidade educativa”.
A teologia e educação são um binômio inseparável. A teologia, junto com o respeito
à Revelação e à Tradição, deve acompanhar os processos culturais e sociais, e neste artigo
demostramos isso, à capacidade de reflexão com o mundo da educação, com seus desafios,
e perspectivas. A teologia, portanto, ocupa-se dos conflitos gerados em torno da proposta
educacional, quer de Estado ou da Iniciativa Privada.
Fazemos teologia em saída missionária, logo, o processo educacional, o afetado e
desacreditado em nosso país, necessita dos olhares de misericórdia da Igreja e dos teólogos,
a educação refletida a partir da teologia.
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Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
LO (NO) DICHO Y () PENSADO
respecto a la enseñanza de la teología
desde la perspectiva del laico
1
THE (UN) SAID AND (YES) THOUGHT
about the learning of theology in the
perspective of the laity
O (NÃO) DITO E (SIM) PENSADO:
sobre o ensino da teologia na perspectiva
do leigo
Diego Pereira Ríos*
Resumen: La intención de este trabajo es remover lo que está en la mente
de muchos pero que poco se revela en las palabras de la mayoría, acerca de
la enseñanza de la teología dentro de la Iglesia. Por eso es una invitación a
jóvenes académicos hasta teólogos y teólogas de larga trayectoria, a
cuestionar el formato actual de la enseñanza de la teología, procurando
crear posibilidades reales para todo laico o laica que sienta el llamado a
servir en la iglesia por este camino, para que pueda efectivamente hacerlo.
Son muchos y muchas los/as que quisieran estudiar teología pero no
pueden por las exigencias del mundo del laico. Esto limita la teología a
sacerdotes, religiosos y religiosas que tienen muchas veces los medios
económicos y un estilo de vida que se los hace posible. En la historia de la
Iglesia casi siempre fueron personas consagradas quienes colaboraron con
la doctrina cristiana, la espiritualidad, la ética; pero en el mundo actual –de
falta de vocaciones sacerdotales y mucha deserción, de crisis en la vida
religiosa, de sinodalidad- hace falta brindar a la mujer y el hombre laicos,
mejores oportunidad de estudiar teología a nivel profesional. Si hablamos
de injusticia, necesitamos comenzar por la enseñanza misma de la teología.
Palabras-claves: Teología, Enseñanza, Laicos, Jerarquía, Justicia.
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 22-34, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.65
* Diego Pereira Ríos, 42 años, uruguayo.
Profesor de Filosofía y Religión en
Enseñanza Media (Uruguay), Maestrando en
Teología Latinoamericana UCA, El
Salvador”, docente de teología en la Escuela
de Teología para Laicos “San Juan
Eudes” (Quito-Ecuador). Miembro de
Amerindia Uruguay, miembro de la RED
CREA Cómplices Pedagógicos para América
Latina, miembro del Proyecto “Filósofos de la
vida” (Medellín-Colombia), miembro de la
Comunidad Bremen Marcelo Barros
(Brasil), escritor en Religión Digital (España)
y en Amerindia en la Red. Libros de su
autoría: “La fuerza transformadora de la
esperanza” (Nueva Visión, 2016), “En un
camino liberador desde el Sur” (Rumbo,
2020), “Teologias para um cristianismo
libertador” (Senso, Agosto 2021).
E-mail: pereira.arje@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-2202-915X
Recebido em 01/11/2021
Aprovado em 23/05/2022
1 Este trabajo no contendrá citas de otros autores o autoras. Esto es por una elección del
autor de alcanzar una trasparencia de intención que pueda revelar lo que piensa acerca
del tema en cuestión. Con ello queremos ser coherentes con el planteo de fondo: hacer
teología implica el estudio, la reflexión pero también el desafío de decir lo que creemos
que Dios nos revela y que necesita ser dicho de la forma más clara posible. El objetivo de
este escrito es que pueda ser leído por cualquier persona interesada en estudiar teología
y perciba claramente las dificultades que tenemos los laicos.
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INTRODUCCIÓN
En este trabajo intentamos hablar de lo que todos sabemos y
muy pocos dicen acerca de la enseñanza de la teología y sus
posibilidades para el hombre y mujer laicos, sean jóvenes o adultas.
En la práctica pastoral los laicos siguen sintiéndose inferiores a los
sacerdotes, teniendo un carácter marcadamente subalterno, donde la
pasividad es su rasgo distintivo y su actividad está sujeta a la
necesidad de la comunidad, pero que se define en la decisión personal
de los pastores. Poca incidencia tenemos en las decisiones de las
diócesis a la hora de nombrar pastores o responsables de funciones
específicas de la Iglesia, donde se asigna a la gracia sacramental
recibida en la ordenación, el carácter de “maestro en la fe” y de
“gobernantes”, a muchos sujetos que no tienen ni la formación
suficiente para serlo ni las cualidades humanas. En varias oportunidades
los laicos estamos mejor formados y muchos poseemos por naturaleza
Abstract: The intention of this paper is to awaken what is in mind of
many people, but is little revealed in the words of most, about the teaching
of Theology in the Church. Therefore, it is an invitation to young
academics and even to experienced theologians to question the current
format of theological teaching, looking to create real possibilities for any
lay person who feels called to follow the Church in this way, and that it is
actually done. There are many who would like to study Theology, but can
not because of the demands of the lay world. This limits Theology to
priests and religious who often have the economic means and a lifestyle
that allows them to do so. In the history of the Church, it has almost always
been consecrated persons who have collaborated with Christian doctrine,
spirituality, ethics; but in today world with a lack of priestly vocations
and many desertions, a crisis in religious life, synodality it is necessary to
oer lay men and women better opportunities to study Theology at a
professional level. If injustice is spoken of, it must begin with the teaching
of Theology itself.
Keywords: Theology, Teaching, Lay People, Hierarchy, Justice.
Resumo: A intenção deste trabalho é despertar o que está na mente de
muitos, mas que é pouco revelado nas palavras da maioria, sobre o ensino
da teologia dentro da Igreja. Portanto, é um convite aos jovens acadêmicos
e mesmo aos teólogos experientes de questionar o formato atual do ensino
teológico, procurando criar possibilidades reais para que qualquer pessoa
leiga que se sinta chamada a servir à igreja desta forma, e que seja feito de
fato. muitos que gostariam de estudar teologia, mas não podem por
causa das exigências do mundo do leigo. Isto limita a teologia aos padres e
religiosos que muitas vezes têm os meios econômicos e um estilo de vida
que lhes permite fazer isso. Na história da Igreja, quase sempre foram
pessoas consagradas que colaboraram com a doutrina cristã,
espiritualidade, ética; mas no mundo de hoje - com falta de vocações
sacerdotais e muitas deserções, crise na vida religiosa, sinodalidade - é
necessário oferecer aos leigos homens e mulheres melhores oportunidades
para estudar teologia ao nível professional. Se falarmos de injustiça,
precisamos começar com o ensino da própria teologia.
Palavras-chave: Teologia, Ensino, Leigos, Hierarquia, Justiça.
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la capacidad de inteligir mejor la fe y enseñarla, lo que replicaría en una mejor eclesiología,
mucho más sinodal. Por eso toda persona que se sienta llamada al estudio y la producción
teológica debe entender que es una cuestión de un deber con la humanidad y que podría
enfrentarse a una concepción de Dios que quizá es errónea.
Debemos repensar la formación teológica que se sigue impartiendo en las
universidades católicas, pues muchas veces son las que acogen a los hijos e hijas de las elites
políticas, y coincide que seguramente sean los gobernantes del mañana, y que tienen la
responsabilidad ante el pueblo y ante Dios de generar políticas equitativas que mejoren las
condiciones de los más desfavorecidos. Por eso, apostar por una formación interdisciplinar,
donde la teología se enseñe también en carreras de grado y posgrado de otras disciplinas,
puede colaborar a sembrar la inquietud de dedicarse al estudio teológico, donde la
enseñanza de los valores democráticos será fundamental. Pero sobretodo las carreras de
teología deben preparar a sus estudiantes a prestar un servicio comprometido con la
humanidad, pero que mantenga el talante profético de denuncia de las injusticias y de
anuncio de la Buena Noticia, con una mirada crítica, encarnada, comprendiendo las
diversas afecciones que sufre la vida de fe de todo ser humano que es atravesado por
preocupaciones económicas, políticas, laborales, existenciales, sociológicas, culturales y no
sólo religiosas o espirituales.
DE LAS DIFICULTADES DEL ESTUDIO TEOLÓGICO EN LA VIDA LAICAL
A la hora de hablar del estudio de teología dentro del mundo cristiano católico - y
quizá un poco más en el mundo protestante - debemos reconocer varias dificultades que
se nos imponen para que la teoloa de estos tiempos le hable al hombre y la mujer
actuales, y le sea un insumo, al menos, para que cultive una mirada más amplia y
profunda sobre la existencia humana, y que lo ayude a cuestionarse acerca de la idea
aprendida de Dios confrontada con la experiencia de tantos y tantas que viven por y
para la fe. Y no referiré en este punto a los problemas de orden acamico-intelectual, o
lo que hace referencia a ser un don-vocación donde alguien siente un llamado especial a
la tarea teogica. No. Quiero detenerme en aspectos que muchos son capaces de
percibir, pero que muy pocos los denuncian concretamente y que dificultan el estudio de
la teología por parte de hombres y mujeres laicos/as que quieren dedicarse, y que
muchas veces no pueden hacerlo. Esto me parece de orden primario si es que
consideramos que la teología es una disciplina necesaria para la formación de cristianos
que profundicen su fe en un mundo cada vez más complejo, y en una Iglesia cada vez
s necesitada de repensarse para renovarse.
Desde el punto de vista de una teología laica - desarrollada por personas que no
hacen votos de vida religiosa - que puedan estudiar hombres y mujeres de familia, esposas
y esposos, madres y padres, jóvenes en situación de noviazgo, con una vida que implica
estudio, trabajo, responsabilidades, crianza de hijos, etc.; considero que un gran desafío
que no se toma en cuenta es el tema del financiamiento de los estudios teológicos.
Hablamos del problema económico. Dentro del ámbito católico, las universidades, facultades
o institutos de teología, mantiene unos aranceles en un nivel muy costoso para los
ingresos medios que percibe un laico o laica. El costo de vida que permita llevar adelante
una familia, la búsqueda de los ingresos mínimos que hacen posible una vida digna para
que una familia se desarrolle también según el plan de Dios, es hoy un problema cada vez
más acuciante. En este sentido, la gran mayoría de las universidades que ofrecen carreras
para el estudio profesional de la teología, no tienen en cuenta esta situación. Hoy más que
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nunca el laico debe estar en el mundo, allí es su lugar propio, y es allí donde debe ejercer la
inteligencia de la fe que le impone ser un experto en humanidad. Humanidad que la
aprende en el ejercicio de sus responsabilidades sociales y familiares con un maduro
desarrollo espiritual y doctrinal.
Junto con el problema económico -donde insisto en el alto costo que implica para
que un/a laico/a pueda estudiar- existe el problema del tiempo que se pueda dedicar al
estudio. Sabemos que cualquier carrera profesional elegida por una persona tiene estos dos
desafíos: el problema económico y el problema del tiempo de dedicación. Pero en el caso
del estudio de la teología se revela un doble problema alrededor del tiempo: por un lado,
porque son muy pocos los que pueden trabajar y vivir de la teología, ya que los salarios que
se pagan por docencia y/o investigación siempre son bajos. Por otro lado, esta situación
implica que la vocación teológica puede surgir en un tiempo de madurez de la persona y
donde ya se tomaron las opciones más fundamentales (pareja, familia, hijos, profesión,
trabajo). Por tanto, a la hora de plantearse el estudio de la teología se tiene que contar con
el factor tiempo. Tiempo de estudio, tiempo de preparación, tiempo de reflexión, tiempo
de investigación, tiempo de oración y meditación, tiempo de conocimiento del ser
humano inserto en las realidades con todas sus complejidades. Y esto es lo que muchas
veces nos falta a los laicos: tiempo. Las responsabilidades laborales y el tiempo que implica
dedicarse a la familia, hace necesario ser un gran artesano del tiempo para aquellos que
quieran dedicarse a la teología de manera profesional.
Si bien es verdad que la pandemia fue el gran impulso que necesitaba el mundo
académico para dar el gran salto a los cursos virtuales, no podemos asegurar aún que esta
sea la mejor opción para estudiar teología. Pero de alguna manera esta nueva modalidad de
enseñanza es una posible solución para muchos laicos y laicas que no tienen las
condiciones económicas y no cuentan con el tiempo necesario para dedicarse a la teología,
tal como se sigue planteando su estudio hoy. Creo que aún hay que seguir resolviendo el
problema económico, pues una licenciatura o una maestría, aún en modalidad virtual,
sigue siendo costosa para la gran mayoría. Pero aun así vale el desafío y el esfuerzo. Porque
¿qué otra opción nos quedaría? Para los laicos/as que queremos dedicarnos a la teología, si
no tenemos acceso para autofinanciarnos la formación, nos deberemos conformar con
cursos eclesiales a modo de introducción al universo teológico. Los cursos pensados para
los/as laicos/as en las diócesis casi siempre son apenas aproximaciones y con la idea de una
utilidad práctica concreta en lo pastoral. Es una teología “rebajada con agua”. No hay un
verdadero interés en la gran mayoría de la jerarquía, de que los laicos nos dediquemos de
lleno al estudio de la teología profesional.
UN PROBLEMA MÁS AMPLIO: LA EDUCACIÓN FORMAL BÁSICA
El punto anterior refería al estudio teológico teniendo en cuenta que los laicos/as
que quieran dedicarse a él, poseen una buena formación básica (primaria y secundaria) o al
menos, que puedan demostrar poseer el manejo mínimo de las herramientas necesarias
para un estudio universitario. Pero me quiero detener en cuanto a los requisitos necesarios
para el estudio de la teología que exige un cierto grado de formación en un pensamiento
crítico, en tener la capacidad de una reflexión profunda, de tener una cierto acopio
memorístico, pero también de un pensamiento encarnado en la realidad del siglo que
atravesamos. En la vida de toda persona estas capacidades son desarrolladas y potenciadas
en el ámbito de la educación formal básica, sea pública o privada, que de alguna manera
preparan al joven a proseguir con un estudio universitario. En esto percibo varios
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problemas que, si bien no lo impiden, dificultan aún más el estudio teológico. Dentro de
ellos tenemos: la mala formación en competencias propias para la teología, la formación
en un paradigma positivista con el acento de las ciencias descuidando las humanidades, la
mala formación filosófica, la de-formación religiosa que muchas veces sufren los
adolescentes, incluso dentro de las instituciones confesionales; entre otras. Hablaré de
algunos de ellos.
El pensamiento occidental que ha marcado nuestra forma de ser y de vivir, es heredero
de un pensamiento eurocentrista con características que limitan la necesidad que tiene la
teología hoy, de pensar la presencia de Dios en la historia concreta. La modernidad que ha
dejado el individualismo, el intelectualismo, la primaa de las ciencias sobre las
humanidades, junto con el pragmatismo, ha dejado de lado la filosoa como una disciplina
fundamental en las cuestiones que dan sentido a la vida humana. No vemos aqlo que se
entendía en el medioevo sobre la filosofía como sierva de la teología (ancilla theologiae), sino
que la filosofía posibilita un pensamiento cuestionador, disconforme, dubitativo, que
posibilita siempre realizar nuevas preguntas ante las infinitas situaciones que la vida misma
nos presenta. Sin esta enseñanza filosófica en la educación básica escolar cualquier adulto no
tendrá un pensamiento crítico que le posibiliten un estudio teológico maduro y eficaz.
Refiero eficaz aludiendo a la producción de conocimiento que colabore con el hombre y la
mujer de este tiempo. Las clásicas preguntas metafísicas sobre el ser, el alma y Dios, deben ser
actualizadas en un mundo cada vez más tecnológicamente digitalizado donde la vida se ha
mecanizado de forma tal que unos hombres deciden la vida y el destino de muchos que no
están ni siquiera preocupados por pensar. Ya no hay preocupación por lo que hay al final de
la vida, sino que vivimos en el paradigma del “vivir el día” (carpe diem, dirían los romanos).
Por otro lado tenemos el problema de seguir viviendo bajo un sistema-mundo
enmarcado en el neoliberalismo y un capitalismo que obligan a los sistemas educativos e
instituciones, a cumplir con ciertos requisitos impuestos por el mismo sistema, si es que
quieren sobrevivir. Esta sobrevivencia tiene que ver con la formación de sujetos que sean
la mano de obra productiva que le sirva. Sean instituciones públicas o privadas las
exigencias son las mismas. Es el sistema capitalista que prepara personas para que dicten
desde el lugar de “expertos” los planes educativos, que impulsen nuevas corrientes, que
elaboren las herramientas, que planteen las exigencias y las reformas necesarias que
siempre están a favor del sistema y no del ser humano. Por eso las instituciones educativas
no tienen mucha libertad en favorecer la formación integral de su alumnado, con un gran
descuido de la dimensión religiosa o el sentido de trascendencia, pues la exigencia recae
sobre el aprendizaje de las disciplinas que capacitan al sujeto para cumplir su función
dentro de la sociedad. Esto limita desde la más corta infancia el horizonte existencial de los
sujetos y las sociedades.
Sin duda que, países que poseen un más arraigado secularismo, hay una preocupación
mayor por esta enseñanza en el ámbito público, pero el sistema educativo privado no
escapa a esta situación, incluso las instituciones educativas confesionales. Esta es mi mayor
preocupación pues, bajo el discurso de ser escuelas o colegios religiosos, muchas
instituciones no tienen ni el personal formado para la enseñanza religiosa adecuada, y
tampoco llega a ser una prioridad real. Lo religioso actúa como un agregado en la currícula
que intenta cuidar la herencia fundacional a modo de máscara, pero en su interior no hay
un efectivo desarrollo de una enseñanza religiosa. Entiendo por enseñanza religiosa
aquella que cuenta con una buena formación filosófica y una apuesta a un pensamiento
crítico que cuestione la misma religión enseñada. Lejos de esto, lo s común es una
enseñanza repetitiva, de una memorización de fórmulas y conceptos, con casi una
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sumisión a prácticas religiosas que no contagian. Si pensamos que la enseñanza religiosa
asegura una maduración del sujeto en la vida de fe y que le facilita una decisión pensada de
adherirse a un grupo religioso, nada de lo que hoy sucede en el interior de las instituciones
de formación básica colabora en ello.
¿SIGUE SIENDO NECESARIA LA TEOLOGÍA EN EL SIGLO XXI?
Esta es una pregunta que no podemos evitar y que debemos intentar responder, al
menos desde un acercamiento humilde y cauteloso, pero que nos exige a cada cristiano y
cada cristiana, dar razón de nuestra esperanza acerca de la pertinencia de la teología. En
primer lugar considero que cualquier autoridad eclesial, sobre todo dentro del ámbito
académico y que se dedique a la formación teológica, tiene que sentirse muy interpelada
por esta pregunta. Es la jerarquía eclesial (cardenales, obispos, sacerdotes) la que debe
preguntarse si lo que siguen manteniendo como sistema formativo en teología, es eficaz
para las exigencias de estos tiempos. Esto tiene que ver con que la formación teológica
propiamente dicha es cuestión de sacerdotes y/o religiosas que muchas veces deben
mantener el criterio de mantener la integridad de la institución, el cuidado de la Doctrina,
y que pocas veces tienen la libertad de cuestionarlas. Tenemos casos de muchos hombres
que cuestionaron y que han pagado las consecuencias (Leonardo Bo, Hans Küng),
como también mujeres que han desarrollado una teología feminista y antipatriarcal que
siguen siendo minimizadas (Ivone Gebara, Teresa Fourcades).
En un Iglesia Católica en crisis, donde cada vez es más cuestionado el celibato
obligatorio para el sacerdocio, donde la mujer sigue siendo sometida a un lugar
secundario, donde la vida religiosa es cada vez menos atractiva como camino de
realización, donde también vemos una avanzada de un cristianismo evangélico unido a los
poderes políticos unificados en una visión intransigente y conservadora, es urgente una
autocrítica en cuestiones de enseñanza de la teología. Desde el Concilio Vaticano II la
Iglesia entró en un continuo proceso de autoevaluación, luchando entre polos
conservadores y liberales o progresistas, pero que nunca puede estar tranquila de haber
alcanzado una autocomprensión que la pueda llevar a la estabilidad. Luego del retroceso
que vivimos con los papados de Juan Pablo II y Benedicto XVI, el impulso de Francisco
por una iglesia sinodal no ha tomado el tema de la formación teológica de los laicos y laicas
como tema urgente. Si queremos un cambio sustantivo en la dinámica pastoral eclesial
necesitamos hombres y mujeres formados en teología y que colaboren con sus intuiciones
personales y comunitarias a una renovación continua de la iglesia.
Pero incluso en la vida cotidiana de las personas ¿qué lugar tiene la teología como
disciplina académica que intenta dar luz a los desafíos de la vida cristiana? De alguna
manera n pervive entre nosotros la dependencia de la jerarquía en las cuestiones de fe.
Sea por las prácticas sacramentales o por la necesidad del consejo o el acompañamiento
espiritual, el laico/a se sigue percibiendo como dependiente de un sacerdote para recibir
ayuda o consejo en materia de fe. Son muy pocos los laicos que aún se animan a desafiar las
decisiones de sus pastores, o que se proponen una carrera teológica para comprender
mejor su fe. Esto redunda en una percepción infantil de la vida cristiana y que es lo que
seguimos viviendo a la interna de la Iglesia. Y esto es una cuestión que parte de dos ideas:
la primera, que la vida consagrada es aprendida como superior a la estilo de vida laical en
lo que refiere al estatus sacramental, y por otro, a las pocas oportunidades de acceso a la
formación teológica por parte de los laicos, lo que deriva en una cierta ignorancia en estas
mismas cuestiones. Mientras los laicos no posean la formación necesaria para conocer
RÍOS, Diego Pereira
Lo (no) dicho y (sí) pensado: respecto a la ensanza de la teoloa desde la perspectiva del laico
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profundamente el don de la fe y su dimensión eclesial, serán siempre limitados en sus
cuestionamientos acerca del proceder de la jerarquía.
Un ejemplo importante en este sentido es el que muchos laicos y laicas no tienen ni
idea de que poseen el sensus dei, que es el don de Dios concedido a todo/a creyente y que
lo capacita para comprender su fe y sobre todo le ayuda en su discernimiento personal,
para luego compartirlo en la comunidad. Mediante el sensus dei, la persona que cultiva
una vida espiritual de oración, de formación, de diálogo, de procurar vivir con cierta
madurez, es guiado por Dios y con ello son muchos los laicos y laicas alcanzan una vida
ejemplar y son valiosos testimonios de vida. Hago esta puntualización porque en la
práctica pastoral concreta - insisto - los laicos/as estamos siempre dependiendo de los
sacerdotes. Y esto sigue siendo así por falta de una formación teogica que nos capacite a los
laicos a hacernos cargo de una forma más responsable de las cuestiones de la iglesia, pero que
siempre está limitada por cuestiones de aspectos canónicos. Por eso considero que es
necesaria una reforma en la educación teológica. Sin una reforma educativa la pregunta es
muy difícil de responder, pero por eso prefiero plantearla en forma de cuestionamientos.
LA FORMACIÓN TEOLÓGICA INTERDISCIPLINAR
¡Qué riqueza sería para la iglesia que muchos cristianos y cristianas estudiaran
teología y aportaran al discernimiento, unificando sus reflexiones realizadas desde sus
profesiones elegidas! Hablo del aporte que puede hacer un sociólogo/a, un abogado/a, un
maestro/a escolar, un mecánico/a, un ingeniero/a, un panadero/a, un artesano/a con una
buena formación teológica. Hay varios campos de la existencia y de la teología que podrían
enriquecerse en gran manera si fueran desarrolladas desde un pensamiento teológico
laical. Lamentablemente n seguimos estudiando teología sacramental del Matrimonio
elaborada por hombres célibes, que siguen espiritualizando una realidad muy compleja y
difícil, que solamente la conocen los casados. Lo mismo podemos decir de la teología
espiritual que no logra ayudar a los jóvenes a optar por integrar a su proyecto de vida la
amistad de Dios, la cercanía de Jesucristo. Pienso que la crisis de los matrimonios, la falta
de jóvenes en la iglesia, como tantos otras caras de la misma crisis, tienen un inicio: la
caducidad de una comprensión de la vida cristiana que no logra una actualización, una
apertura a los desafíos actuales y que deben ser llevados a cabo por laicos.
Es por ello que un estudio serio de la teología debe incluir un necesario
acercamiento a algunas disciplinas que colaboran en una mejor comprensión de las
verdades de la fe y posibilitan una mayor comprensión del mundo actual donde debemos
vivirlas. En primer lugar destaco el estudio de la sociología. La sociología ha colaborado
históricamente a desentrañar los meandros de la teología hegemónica que ha colaborado
con sistemas totalitarios que han limitado la libertad humana y que ha oprimido las
conciencias. La teología desarrollada en varios momentos de la historia - y que hoy reflota
en nuevos movimientos político-religiosos - ha justificado la autoridad religiosa aun
cuando ésta ha actuado en contra de sus propios feligreses. Es un hecho que la sociología
demuestra en sus estudios la necesidad de lograr comprender la construcción de normas
sociales y culturales, y la descripción de ciertos comportamientos individuales y grupales
que siguen siendo condicionados cuando las autoridades religiosas tienen una gran
influencia en parte de los miembros de la sociedad. Hay grandes rasgos de alienación que
deben ser desenmascarados que son aportes propios de la sociología y que le hacen mucho
bien al estudio de la teología.
RÍOS, Diego Pereira
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Lo mismo podemos decir de la filosofía que ya hemos adelantado anteriormente. En
este sentido hoy es fundamental una filosofía que nos ayude a desarrollar la capacidad
reflexiva que cuestione el orden político, social y económico existente. Aún más, es una
exigencia desde una filosofía realizada desde Latinoamérica que lucha por ser una filosofía
descolonizadora en su teoría, y liberadora en su praxis. La filosofía que procure darle
herramientas al teólogo o teóloga actual, debe concientizar que sí, se podrán seguir
utilizando ciertas categorías o conceptos filosóficos de la tradición, pero que nos exige una
concreta aplicación de esas ideas a la realidad, si es que queremos actualizar el lenguaje
teológico para que pueda iluminar la vida cristiana. Con ello, una teología cristiana que
sigue siendo fabricada a partir de la filosofía helenística y medieval, debe ser superada. Y
digo superada, no rechazada. Superada en colocar al hombre y la mujer en el mismo puesto
ante el cosmos y recuperar el pensamiento femenino que ha sido históricamente
descartado por una filosofía machista y patriarcal. La filosofía que colabore con la teología
debería tener más rostro y voz de la mujer, de los negros, de los pueblos originarios, y de
todos aquellos que han sufrido el silenciamiento de su voz a lo largo de la historia.
También es necesario un estudio detenido de la ciencia donde no podemos dejar de
lado el gran aporte que ha realizado a los largo de los siglos y donde sigue cuestionado el
lugar del ser humano en el conjunto de la creación. Por un lado debemos revalorizar los
avances de las últimas épocas, sobre todo en la búsqueda de la vacuna contra el Covid-19,
pero también en el campo de la Genética y la Inteligencia Artificial. De todos modos, desde el
ejercicio del pensamiento crítico, no podemos dejar de marcar las limitaciones y los efectos
negativos que carga la ciencia - al menos potencialmente - cuando es impulsada por intereses
egoístas para favorecer a unos pocos a cuestas del sufrimiento de millones. Así como el
feminismo es un reclamo de la creación y que bajo argumentaciones científicas, demuestra
que la mujer fue sometida al hombre, de la misma manera hoy el planeta está en peligro por
el sometimiento ejercido sobre la Tierra. Pero en esto insistimos que los males aparejados
por la ciencia son consecuencia de una ignorancia planificada, que impide brindar los
elementos sucientes de discernimiento. Junto a ello, la falta de empaa en la mente de los que
dominan el mundo, no buscan favorecer a la humanidad. Otro tema es la situación de los
científicos esclavizados a trabajar para servir a empresas capitalistas y no en favor de la ciencia.
Por eso también es muy necesaria una formación ética para que los teólogos y
teólogas asuman un compromiso moral con la humanidad. Quien sea llamado a servir
desde la teología está invitado a ser un “despertador de conciencias” para lo cual su vida
debe ser coherente con la fe profesada y con los pensamientos elaborados. El teólogo está
llamado a una continua purificación de aquellas inclinaciones egocentristas que se le
adhieren del mundo, para prestar un servicio donde sea capaz de hacer escuchar la voz de
Dios que se revela en su interior y que ha resonado en la comunidad eclesial, en comunión
con el contexto cultural. Visto así, pareciera una tarea titánica, pero no podría ser de otro
modo. Un ejemplo es el tema de la identidad de género, que sigue siendo polémica y que
sigue causando división a la interna de la iglesia. Hay tantas voces disímiles que muchos
cristianos que no saben bien qué pensar. Partir de la realidad, tomar los aportes de la
ciencia, exige una madurez ética en pos de cuidar a la humanidad, sobre todo cuando
venimos de un cristianismo que ha moralizado la vida cristiana, convirtiéndola en una
exigencia de comportamiento. Con ello se ha demonizado las relaciones sexuales, cuando
sabemos que es una de las expresiones más hermosas del amor que, como parte del
crecimiento humano, tiene su aciertos y errores, pero que siempre nos van llevando hacia
Dios. Históricamente el cristianismo ha sido más la religión del “no” que del sí: a la vida,
al amor, a arriesgarse a vivir, a buscar juntos un camino. En fin: a un Dios-amor
que nos acompaña en todo pues conoció las dificultades de la vida.
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PLURALISMO RELIGIOSO E INTERCULTURALIDAD
Toda persona que sienta el llamado a llevar una vida de estudio y producción
teológicos, debería prestar cierto juramento ante la necesidad de apostar al respeto y
promoción del pluralismo religioso. Si bien desde hace muchos años - sobre todo luego del
Concilio Vaticano II - la teología ha sido cuestionada tanto por las religiones históricas
como por los nuevos grupos o movimientos religiosos, estamos en una época de un cierto
retroceso. Grupos fundamentalistas han copado la escena que ha sido descuidada por las
religiones históricas que adolecen de líderes fuertes y visibles. La llamada “tolerancia
religiosa” malentendida, deviene en ignorancia sistemática que la entiende como aprender
a “soportar” o “aguantar” lo diferente. Con ello muchos grupos religiosos que, si bien
conviven, no son capaces de generar un diálogo constructivo en favor de todos. Debemos
trabajar en una apertura respetuosa a los movimientos y comunidades religiosas pero
guardándonos el derecho a dudar de que algunos de ellos puedan no ser verdaderos
caminos de realización humana y que reditúen en un mundo más plural. Sabemos que la
pluralidad enriquece pero no hay claridad acerca de sus alcances o sobre la manera de
vivirla más constructivamente.
Varios son los teólogos que hacen os advertían al universo teológico católico la
necesidad de trabajar sobre la conciencia del pluralismo religioso (Jaques Dupuis,
Raimon Panikkar) y en Latinoamérica se fue formando junto con la Teología de la
Liberación, un grupo de tlogos y teólogas que se fueron metiendo en la misma
dinámica (Paul Knitter, Marcelo Barros, Faustino Teixeira, Diego Irarrázaval). En este
último tiempo es de destacar la propuesta del teólogo y pastor metodista brasilo,
Claudio de Oliveira Ribeiro, que viene contribuyendo a través del principio pluralista
como una nueva forma de interpretar la realidad desde sus diversos aspectos para lograr
desarrollar una mejor comprensión de la dinámica ecunica, a partir del
posicionamiento desde la alteridad. O el caso del teólogo -también brasilo - Marcelo
Barros con sus estudios y aprendizajes desde el contacto y la convivencia con las
religiosidades de matriz africana. Dimensionar las limitaciones de una reflexión ego-
centrista (desde el blanco católico europeo) hace posible a una apertura integradora
desde el otro (el negro, el indio, el indígena, etc.), a partir de una mediación teogica
que intente hacer visible los grupos que no entran en el esquema del mundo que
normalmente planteamos. Es mucho s que superar la mera inclusión desde el rol
activo. Se trata de ser incluidos desde la cosmovisión y religiosidad de los otros, desde
un lugar pasivo, secundario, dejándonos enseñar por los demás grupos religiosos.
Esta conciencia de un nuevo paradigma teológico, el del pluralismo religioso,
implica que la teología cristiana salga del lugar principal, se saque el traje de autoridad ante
el mundo, y se coloque al servicio humilde de construir una nueva forma de conexión de
aquellas ideas que construyen a la humanidad. Esto también implica abrirse a la
interculturalidad. Lo que sostenemos acerca del pluralismo sucede en lo que refiere a las
diversas culturas: lo que más se percibe es una cierta tolerancia, un cierto convivir entre
distintos/as, pero aún nos queda un largo camino a recorrer para que las culturas puedan
dialogar, intercambiar y enriquecerse mutuamente. Sobre todo en Latinoamérica seguimos
sufriendo la discriminación por causas culturales, y vemos que, aún en estos tiempos,
seguimos siendo testigos de la imposición del pensamiento europeo sobre el pensamiento
indígena, africano u oriental. La interculturalidad es una emergencia hoy más que nunca, un
imperativo universal que nos obliga a repensar la formación que seguimos recibiendo y
sobre todo, en la enseñanza teológica, rediseñar los programas que siguen generando la
conciencia de un cristianismo con aires de superioridad ante las demás culturas y religiones.
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Una enseñanza teológica intercultural debe integrar en su formación las verdades de
fe reveladas también a los demás pueblos y naciones, desde el mismo pueblo de Israel hasta
las diversas culturas ancestrales existentes en los demás pueblos. Existen tradiciones
históricas que acuñan un hermoso saber cultural, filosófico y religioso que muchas veces
son totalmente ignorados por la gran mayoría de los teólogos que siguen estudiando la
teología hegemónica e imperial propuesta por el cristianismo. El monoteísmo judío que
dió paso al cristianismo, junto al influjo del monoteísmo islámico, siguen dificultando la
aceptación y la integración activa de las tradiciones religiosas africanas, la sabiduría de los
pueblos originarios, así como la larga trayectoria de las filosofías orientales que nutren el
panorama mundial. Ni siquiera es aceptado como riqueza el mestizaje en el cual vivimos y
que ha impregnado la historia latinoamericana con aportes que nos posibilitan una nueva
concepción del hombre y la mujer, de Dios, no solo como Padre sino también como
Madre, y del mundo como el lugar de la realización, donde ya está implantado el Reino que
anunció Jesús. Quien quiera estudiar teología debe percibir el colonialismo mental y
cultural que aún nos ciega y que sigue privilegiando el logos y despreciando el mito, desde
la misma antigüedad griega, para rechazarlo purificándolo y luego integrarlo a un todo
mucho más amplio que él.
POR UNA TEOLOGÍA CONSTRUCTORA DE DEMOCRACIA
Vivimos épocas donde los valores democráticos están en crisis, donde dudamos de
que lo que estamos viviendo en muchos de nuestros países latinoamericanos sean
regímenes democráticos. En la actualidad, la democracia más extendida es la representativa
entendida como sistema de gobierno en donde la participación popular –el accionar del
pueblo- tiene una moderada incidencia en las decisiones políticas, pero que se fundamenta
en la elección de su representantes en el gobierno. Esto colocaría al pueblo como el sujeto
del universo político, el sujeto activo que decide e incide en la vida política de una nación.
Claro está que esto no sucede, no sólo porque los representantes actúan en lugar del
pueblo, pero sobre todo la realidad nos muestra que en muchos casos el pueblo no es
escuchado. Por lo que la eficacia de la democracia - y pero aún su veracidad - como sistema
de gobierno, sigue en el plano de la indefinición y la incertidumbre. En medio de ello, la
institución Iglesia sigue siendo entendida de forma piramidal, a modo de una monarquía,
lo cual le resta autoridad a la hora de sus críticas al sistema. Si queremos colocarnos como
ejemplo primero debemos cambiar nuestra forma de vivir y experimentar la fe, para luego
proponer un cambio en el mundo.
En este tiempo donde las comunicaciones vuelan a una velocidad nunca antes vista,
el fenómeno de la globalización nos ha sometido a vivir en un mundo donde todo
pareciera ser igualmente aplicable, sin importar el lugar en donde estemos. Desde nuestros
dispositivos tecnológicos podemos acceder a una visita virtual a cualquier parte del mundo
y podemos tener en pocos días un producto comprado en cualquier parte del mundo, a
través de diversas plataformas. En este sentido podemos sufrir una especie de
esquizofrenia que determina nuestros comportamientos cotidianos a raíz de la
incomprensión del fenómeno de la globalización. Por un lado afirmamos la necesidad de
partir desde nuestros contextos geográficos, el respeto a las tradiciones culturales de
nuestros países y regiones, pero por otro, no podemos luchar con un enemigo a escala
mundial que intenta meterse en lo más profundo de nuestra conciencia, intentándonos
convencer que debemos ser “ciudadanos del mundo”. La digitalización de la vida nos
empuja a navegar cada día en una marea de estímulos que nos distraen y nos quitan la
posibilidad de ocuparnos de las cuestiones políticas más cercanas.
RÍOS, Diego Pereira
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A partir de esta constatación percibimos la gran contradicción existente en la
enseñanza de la teología tal y como se sigue planteando hoy. Por un lado, la formación
democrática requiere el libre uso de la libertad de elección, que permita a cada ser humano
su realización personal y que incluya la comunidad a la que pertenece, como también la
defensa de los Derechos Humanos que incluyen la libertad y el respeto de la conciencia.
Por otro, la formación teológica ejerce una limitación de las posibilidades del sujeto que la
estudia de realizar críticas correctivas y constructivas del sistema religioso aprendido. Sin
duda que hay una primera elección en esta decisión - la de estudiar teología católica, por
ejemplo - pero si esta teología quiere promover la universalidad que está como supuesto
fundamental, debe entrenar justamente en la práctica democrática del diálogo, del
consenso, de la cooperación mutua en el resolución de los problemas de la religión en
cuestión, como parte del entramado humano. Y sabemos muy bien que poco puede
cuestionar su propia fe un teólogo o teóloga sin que corra el riesgo de ser sancionado/a.
Si desde la catequesis enseñamos a nuestros niños y niñas a la obediencia, si la
preparación a la adultez cristiana sigue siendo la enseñanza de las fórmulas y los símbolos
de la fe cristiana, con inducción a un sacramentalismo reiterativo que lejos está de la vida
real, no estamos en un buen camino. Si la enseñanza teológica quiere ser más efectiva en
cuanto a la construcción de valores democráticos, debe incluir una teología política que
revele el sistema de opresión que ha marcado nuestra historia y donde la alianza religión-
política ha sido uno de los daños más grandes ocasionados a la humanidad. La denuncia
protica de teólogos como Johann Baptist Metz en Europa o de Gustavo Gutrrez en
Latinoamérica, no sólo incluyeron el desenmascaramiento del sistema económico y político
que sometió a las masas indefensas, sino que fueron críticas a la misma mentalidad religiosa
que, activa o pasivamente, por acción u omisión, fueron cómplices y responsables de la
muerte de muchos de nuestros hermanos y hermanas. La teología debe estar siempre del lado
del oprimido, del que sufre, del excluido y denigrado, si quiere ser fiel a Jesús de Nazaret.
LA URGENCIA DE LA TEOLOGÍA FEMINI STA
En un mundo dominado por los hombres, sigue siendo muy preocupante el lugar de
la mujer históricamente sometida y colocada en un lugar de inferioridad. Ya son
inaceptables las teologías que se fundamentan en el primer capítulo del libro del Génesis:
de una mujer que fue creada desde y para el hombre. Esta relación de dependencia unívoca
no tiene ningún fundamento pero lamentablemente sigue estando presente en la reflexión
teológica. Incluso la teología paulina que llama a la mujer a la obediencia al varón, y del
varón a Jesucristo, ha dado pie a toda clase de atrocidades. Quizá en la teoría muchos
teólogos varones han sido capaces de intentar revertir esta situación, también escuchando
a muchas teólogas que insistentemente denuncian esta situación, pero en la praxis de la fe
cotidiana no se percibe lo contrario. El accionar de la Iglesia institucional sigue colocando
al varón como el único capaz de responder al llamado de Dios a servir como sacerdote, en
una vida entregada al servicio, donde incluso se le impone el celibato como norma, tan
cuestionado y difícil de llevar a la práctica.
Si bien el papa Francisco intenta llevar adelante cierta reestructura en la forma
piramidal que aún tiene la iglesia, aún falta mucho. No basta colocar a una teóloga como
Emilce Cuda en un lugar de consejera de las Iglesias particulares dentro de la Comisión
Pontificia para América Latina. Es necesario otorgarles lugares estratégicos a muchas
mujeres que dentro de la Iglesia abogan por un reconocimiento real de la mujer, no sólo
dentro de la Iglesia actual, sino que también en la historia de la Salvación. Digo que este
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acto del Papa no basta, pero es una buena señal, nunca antes vista en la Iglesia. De todos
modos, son muchas las teólogas feministas que han decidido ser duras pero muy sinceras
en describir la situación de sometimiento de las mujeres. La teóloga feminista Elizabeth A.
Johnson refiere a la necesidad de una justicia bíblica que retoma las diversas imágenes de
Dios cargadas de femineidad que revela la capacidad del cuidado amoroso hacia el ser
humano. También es fundamental el lugar de la mujer en el accionar de Jesús como parte
del grupo primero que recibe sus enseñanzas, así como fueron ellas las primeras testigos de
la resurrección. Esto sin nombrar que de una mujer - María - nos vino la Salvación.
En este sentido muchas son las teólogas como Ivone Gebara, María Pilar Aquino,
Elsa Tamez, María José Caram, Rosa Ramos, entre tantas otras, que desde un estudio serio
y profundo unido a un compromiso social y eclesial militante, abogan por reivindicar el
lugar de la mujer en la Iglesia y la sociedad. Esto implica que los hombres de Iglesia renuncien
al patriarcado tan arraigado que tanto mal nos sigue haciendo, pero que también implica
una nueva conciencia planetaria. A los hombres nos falta mucho para reconocer que sin la
mujer, tanto dentro de la religión como en el centro de la sociedad, ni siquiera nosotros
mismos existiríamos. La mujer ha sido capacitada en su naturaleza para traer la vida al
mundo y eso ya la coloca en un lugar de primacía. Nos entristece seguir siendo testigos de
la superioridad con la que se mueven los hombres dentro de la Iglesia, cuando siguen
siendo las mujeres la gran mayoría y que la sostienen y enriquecen con una religiosidad que
engendra vida, en oposición de una masculinidad que basada en un rigorismo legalista,
promueve la obligación y el cumplimiento, algo muy lejano de la enseñanza evangélica.
El mal del patriarcalismo sismico existente, y que también es promovido por las
enseñanzas de la Iglesia, mantiene la costumbre de la sanción a todo intento de reclamo
de los derechos de la mujer, lo que nos revela el miedo que deviene en cerran e ira
ante las voces femeninas que cada vez gritan con s fuerza. Los males sociales del
feminicidio, el mercado de la pornograa y la prostitucn, la poca posibilidad que
tienen las mujeres de llegar a cargos políticos de decisn, siguen mostrando la
conveniencia de esta situación. ES una necesidad del sistema patriarcal mantener a la
mujer bajo control, sometida al hombre, dominada por él, para mantenerla limitada de
los reclamos que muchas quieren presentar ante el mundo. Son varios los mecanismos
culturales que siguen socavando la posibilidad de las mujeres para que puedan
desarrollarse en una total libertad y que sus derechos sean reconocidos. La lucha de la
teología feminista tiene la capacidad de incluir en su lucha a los grupos que
hisricamente han sido discriminados por cuestiones de nero, raza o clase, y por ello
se autoconcibe como una teoloa inclusiva, donde de nuevo se remarca el talante del
cuidado propio de la mujer. Incluso ellas promueven el eco-feminismo revelando las
características femeninas de la Tierra y la necesidad de su defensa.
CONCLUSIÓN: UNA EDUCACIÓN TEOLÓG ICA A FAVOR DE LA JUSTICIA SOCIAL
Llegando al final de este escrito donde hemos expuesto alguno de tantos aspectos
que deben preocupar a quien quiera dedicarse al estudio de la teología, queremos
simplemente reafirmar el primer llamado realizado al inicio: hacer teología es una cuestión
de sentir el llamado a servir a la humanidad y de purificar nuestra compresión de Dios. Y
como muchas veces esta comprensión sirvió a la jerarquía para dominar a la feligresía,
debemos revisar el modo y la finalidad del estudio de la teología en la actualidad. La
situación del mundo actual y de la iglesia hace necesario un debate acerca del tema. En
esto, tiene un lugar fundamental la opinión de los laicos y laicas que quieran dedicarse a la
teología y proponer cambios efectivos para una Iglesia que camine hacia un discipulado
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más comprometido. Las estructuras actuales del universo teológico no permiten que el
laicado tenga reales posibilidades de contribuir a la reflexión, mientras la propuesta
académica siga en manos únicamente de la jerarquía sin tomar en cuenta las dificultades
que presenta esta estructura para hombres y mujeres de familia, y los jóvenes que puedan
ver en el estudio teológico un camino de realización.
Si la teología quiere estar a favor de la justicia social debe comenzar por cuestionar si
su forma actual de enseñanza y aprendizaje promueve valores de justicia, y si toda persona
que quiera estudiar tiene los mismos derechos y posibilidades. Y por todo lo expuesto aquí,
de forma clara y sencilla, vemos que esto no se cumple. La teología sigue guardando un
cierto halo de oscurantismo al blico en general. En lo que respecta al laico son pocas las
posibilidades de una preparación de nivel profesional que promueva la enseñanza e
investigación debido a las pocas posibilidades que tenemos por nuestra opción de vida,
sobre todo lograr vivir de la teología. Tenemos el desafío de generar espacios de estudio,
reflexión y producción académica desde el lugar de la mujer y le hombre laicos y para ello
necesitamos de mucha imaginación profética. Denunciar esta situación de injusticia ha
sido el propósito de este trabajo, ahora nos queda la responsabilidad de crear dichas
posibilidades para que nuestros prójimos puedan dedicarse a ella. La teología del siglo XXI,
así como el futuro de la Iglesia, está directa y proporcionalmente unida a las decisiones que
los laicos y laicas tomemos.
RÍOS, Diego Pereira
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Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
O INTELECTUAL ORGÂNICO
A teologia não se deixa acorrentar
(2Tm 2,9)
THE ORGANIC INTELLECTUAL
Theology does not allowed to be chained
(2Tm 2,9)
Rogério L. Zanini*
Luiz C. Susin**
Resumo: O texto tem por objetivo compreender a missão do intelectual/
teólogo orgânico com clareza de sua opção, no sentido de ser portador de
certos valores contra outros valores, defender certos interesses contra
outros interesses; assumir a causa do reino de Deus contra o antireino.
Segundo a lição de Ellacuría e Sobrino, os pobres são o lugar epifânico da
revelação cristã e, consequentemente, do magistério cristão, porque entre
os pobres Deus quis colocar sua cátedra. De maneira límpida e profética
reconheceram explicitamente os Bispos na Conferência de Aparecida: “A
opção preferencial pelos pobres é uma das peculiaridades que marca a
fisionomia da Igreja latino-americana e caribenha” (DAp. 391). Para dar
conta desta questão, se pretende refletir o significado de uma teologia
profética que desce aos crucificados honrando a realidade das vítimas da
história em vista de sua ressurreição/libertação. Segue-lhe um segundo
aspecto, no qual se aborda a missão da teologia como um pensar as feridas
e resgatar a vida para que o mundo seja transformado na perspectiva do
seu Criador; e por fim, no terceiro ponto, compreender a vida e o legado
de padre Elli Benincá, um mestre inspirador do Instituto de Teologia e
Pastoral de Passo Fundo-RS, como um case de intelectual/teólogo
orgânico. Em conclusão, se realça a importância e atualidade/ousadia deste
método que tem o teólogo na postura de intelectual orgânico, pois é em si
uma postura profética diante da realidade virtual, individualista e
capitalista que marca o século XXI.
Palavras-chaves: Teologia. Profecia. Intelectual Orgânico. Benincá.
Abstract: The text aims to understand the mission of the organic
intellectual/theologian with clarity of mission, in the sense of being the
bearer of certain values against others, to defend certain interests against
others, to take up the cause of the Kingdom of God agains the other anti-
kingdoms. According to Ellacuria and Sobrino’s lesson, the poor are the
epiphany of Christian revelation and, consequently, of the Christian
magisterium, because among the poor God wanted to place his chair. In a
limpid and prophetic way, Bishops explicitly recognized at the Aparecida
Conference: “the preferential option for the poor is one of the peculiarities
that marks the face of the Latin American and Caribbean Church” (DAp.
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 35-46, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.73
* Padre da Diocese de Chapecó/SC. Doutor e
Mestre em Teologia pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul,
PUCRS. Especialista em Metodologia
Pastoral pela Universidade Regional
Integrada do Alto Uruguai e das Missões -
URI. Graduado em Teologia pelo Instituto de
Teologia e Pastoral (Itepa) e em História pela
Universidade do Oeste de Santa Catarina -
UNOESC. Professor da Faculdade de
Teologia e Ciências Humanas de Passo
Fundo.
E-mail: zaninipastoral@hotmail.com
http://orcid.org/0000-0001-8771-3799
** Bacharelou-se em Teologia pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul
- Faculdade de Teologia (1979) e Licenciou-
se em Filosofia pela Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ijuí (atual Unijuí) (1971).
É Mestre e Doutor em Teologia pela
Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma
(1979-1983). Atualmente é professor na
Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul como professor permanente e
pesquisador do programa de pós-graduação
em Teologia, professor na Escola Superior de
Teologia e Espiritualidade Franciscana, de
Porto Alegre, membro da Equipe
Interdisciplinar de Assessoria da Conferência
dos Religiosos do Brasil, Secretário Geral do
Fórum Mundial de Teologia e Libertação. Foi
membro do Comitê de Redação da Revista
Internacional de Teologia Concilium por
quinze anos (2000-2015) e atualmente atua
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
INTRODUÇÃO
O presente texto tem por objetivo compreender a missão do
intelectual/teólogo ornico com clareza de sua opção, no sentido de ser
portador de certos valores contra outros valores, defender certos
interesses contra outros interesses; assumir a causa do reino de Deus
contra o antireino. O teólogo como intelectual orgânico é alguém que se
encontra estreitamente vinculado social e economicamente com os
insignicantes (Gustavo Gutiérrez), ou pessoas inviveis da história
(linguagem realçada pela pandemia). Ora, seu objetivo maior é a
organização e a construção de estruturas diferenciadas no seio social,
como aquele que auxilia na elaboração de conceões que proporcionem
novas formas de vida em que todos tenham vida em abundancia como
pregou Jesus. Na perspectiva teológica, esta concepção de teólogo como
intelectual orgânico possui como verdadeira missão a constrão de um
agir encarnado na história, cujo projeto maior de vida é, na formulão
de Ellacuría e Sobrino, “descer da cruz os povos crucicados
1
. Tal conceão
mostra-se extremamente desafiadora, especialmente nestes tempos de
sociedade líquida (Baumann) e de tendência de retorno a “uma teologia
de escririo” (Papa Francisco), contextos que exigem, tendo por norte a
teologia latino-americana e caribenha, manter-se fiel na originalidade da
opção pelos pobres e contra a pobreza. Segundo a lição de Ellacuría e
Sobrino, os pobres são o lugar epifânico da revelação cristã e,
consequentemente, do magisrio cristão, porque entre os pobres Deus
quis colocar sua tedra. De maneira límpida e profética reconheceram
explicitamente os Bispos na Conferência de Aparecida: “A oão
preferencial pelos pobres é uma das peculiaridades que marca a
sionomia da Igreja latino-americana e caribenha” (DAp 391).
Para dar conta desta questão, a presente reflexão se desenvolve
em três direções. Em primeiro lugar, pretende refletir o significado
de uma teologia profética que desce aos crucificados honrando a
realidade das vítimas da história em vista de sua ressurreição/
libertação. Segue-lhe um segundo aspecto, no qual se aborda a
missão da teologia como um pensar as feridas e resgatar a vida para
que o mundo seja transformado na perspectiva do seu Criador; e por
fim, no terceiro ponto, compreender a vida e o legado de padre Elli
em seu comitê científico. Foi presidente da
Associação de Teologia e Ciências da
Religião (SOTER) no triênio 1998-2001, da
qual é cofundador. Foi professor convidado
na Universidade Antoniana de Roma, no
Instituto de Teologia e Pastoral da
Confederação Episcopal da América Latina
em Bogotá. Foi professor colaborador na
Faculdade de Filosofia da PUCRS, em Ética
ambiental e Metafísica e na Faculdade de
Filosofia da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, em Ética e Filosofia da
Religião. Em 2011 realizou estágio pós-
doutoral na Georgetown University, de
Washington.
E-mail: lcsusin@pucrs.br
http://orcid.org/0000-0002-9475-8941
Recebido em 27/10/2021
Aprovado em 05/05/2022
391). To address this issue, it is intended to reflect the meaning of a
prophetic theology, who descends to the crucified, honoring the reality of
the victims of history in view of their resurrection/deliverance. A second
aspect follows, in which the mission of Theology is approached as a way of
thinking about wounds and rescuing life for the world to be transformed
in the perspective of its Creator; and finally, in the third point, to
understand the life and legacy of Father Elli Benincá, an inspiring teacher
of the Theology and Pastoral Institute of Passo Fundo-RS, as an organic
intellectual/theologian case. In conclusion, it highlights the importance and
topicality/boldness of this method that has the theologian in the position of
organic intellectual, because it is,in itself,a prophetic posture in the face of
the virtual, individualistic and capitalist reality that marks the 21st Century.
Keywords: Theology. Prophecy. Organic Intellectual.
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1 As expressões “povos crucificados” e “descer da cruz os povos crucificados” foram criados por Ignácio Ellacuría. Cf.
Jon SOBRINO, Jesus, o Libertador, p.366.
2 Jürgen Habermas, na linha de Michel de Foucault, aprofundou a análise da relação entre conhecimento e interesse,
da presença e operação do interesse no conhecimento, o que, até por questão de honestidade, não pode, mas deve
ser explicitado pelo intelectual. Cf. Jürgen HABERMAS, Conhecimento e interesse. São Paulo: Unesp, 2014.
3 Jon SOBRINO, A em Jesus Cristo, p.13 (grifo do autor). Segundo Sinivaldo Tavares, essa é uma das peculiaridades da
Teologia da Libertação. “Gostaríamos ainda de ressaltar uma peculiaridade da TdL que a coloca, para todos os efeitos,
em uma condição de ruptura epistemológica em relação à Modernidade ocidental. À diferença de teologias que,
ingênua ou intencionalmente, não revelam sua perspectiva epistemológica, apresentando-se como neutras e
universais, a TdL assume-se enquanto discurso elaborado a partir de uma situação concreta e de suas respectivas
indagações. Desde o seu nascedouro, a TdL tem manifestado claramente a consciência de se constituir em discurso,
para todos os efeitos, parcial: uma teologia que não tem pudor de se construir a partir dos pobres para libertá-los da
condição à qual encontram-se submetidos injustamente” (Por uma transformação intercultural da teologia. RE B, v.
78, n. 311, 2018, p.717).
4 Pedro TRIGO. Distinción entre orden establecido y realidad: por honradez con la realidad. Disponível em: https://
revistas.uca.edu.sv/index.php/rlt/article/view/5747. Acesso em 8 de janeiro de 2022.
5 Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2019-2023, n.110.
Benincá, um mestre inspirador do Instituto de Teologia e Pastoral de Passo Fundo-RS,
como um case de intelectual/teólogo orgânico.
1 HONRADEZ PELA REALIDADE DAS VÍTIMAS
De alguma forma todas as teologias possuem como fonte originária elementos que
se encontram na realidade, uma vez que o teólogo, como parte integrante deste mundo
real, com ele convive e interage. Consequentemente se assume sempre a partir de uma
tomada de posição nesta realidade, na qual testemunha sua e reflete teologicamente. Por
isso, ao se referir à honradez para com a realidade se está adentrando nela com capacidade
de se colocar em uma situação que a atinge um universo próprio de forma configuradora.
Como intelectual, todo teólogo assume um ponto de vista, toma uma posição e elabora seu
pensamento em vista de objetivos e interesses concretos pessoais e/ou coletivos
2
.
A Teologia da Libertação reconhece que sua teologia toma parte e se posiciona desde
a parte dos pobres, portanto é parcial e notoriamente declarada em vista da opção pelos
pobres e excluídos. Seguindo Jon Sobrino: “todo pensamento se acha situado em algum
lugar e nasce de algum interesse; tem uma perspectiva, um lugar de onde e um para
onde, um para que e um para quem”. E a partir disso declara o objetivo de sua teologia:
parcial, concreta e interessada: as vítimas deste mundo. E o motivo está na revelação de
Deus e tamm na realidade do mundo atual, embora isto sempre se configure dentro de
um círculo hermenêutico
3
.
No caso, de Sobrino, segundo o teólogo Pedro Trigo a “honradez com a realidade” se
configura no modo estruturante de sua preocupação teológica. Para Trigo, em Sobrino é
central este ponto de vista, porque insiste de tal maneira na honradez com a realidade, que
esta pode ser considerada como um elemento estrutural do seu pensamento e modo de ser.
A honradez para com o real não é um simples conteúdo, uma vez que possui suas raízes na
identidade cristã. O teólogo como “animal de realidades” precisa refletir e se deixar afetar
por coisas reais. Dizendo de modo simples: teologia com sentido de realidade
4
.
Os Bispos, nas Diretrizes para a evangelização, reconhecem que “contemplar o
Cristo sofredor na pessoa dos pobres significa compreender as causas de seus agelos,
especialmente as que os jogam na exclusão”
5
. Esta afirmação contempla duas questões
profundas e determinantes que alicerçam a tomada de posição em favor e na opção pelos
pobres por parte da Teologia da Libertação. Uma primeira consiste num verdadeiro
axioma: contemplar Cristo conduz ao pobre. E, assim, não se pode compreender um ou
outro de forma separada, com o grave perigo de perder a identidade cristã. Aqui vale
recordar o debate acalorado e fecundo entre alguns teólogos da libertão em
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.35-46, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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contraposição à perspectiva tornada pública por Clodovis Bo após a assembleia do
CELAM em Aparecida. Para Bo, a primazia da es em Cristo, mas os pobres teriam
ocupado, na Teologia da Libertação, o lugar de Cristo, ocasionando um dano irreparável
à fé. Ele reitera: a Teologia da Libertação “colocou os pobres em lugar de Cristo”. Dessa
“inversão de fundo resultou um segundo equívoco: instrumentalização da fé ‘para’ a
libertação”
6
. O teólogo Érico J. Hammes, tecendo críticas a este argumento, traz à lume o
esquecimento dos pobres ao longo da história do cristianismo. A opção pelos pobres
aparece na Igreja na segunda metade do século XX”. E acrescenta: “os pobres nos ajudam
a encontrar Jesus e, no momento em que percebemos essa relão, muda nossa
concepção cristogica. Falamos aqui de uma espécie de rculo hermeutico entre os
pobres e Jesus Cristo”
7
.
A segunda questão se refere às causas da pobreza e o compromisso de libertação que
tem seu alicerce na cristã. A partir da experiência latino-americana, Gustavo Gutiérrez
lembra que “o compromisso libertador significa para muitos cristãos uma autêntica
experiência espiritual, no sentido original e bíblico do termo: um viver no Espírito que
nos faz reconhecer-nos livres e criativamente filhos do Pai e irmãos dos homens
[humanos]”
8
. Segundo Celso Pinto Carias, estes dois elementos se encontram
intrinsecamente unidos, “o espiritual indica uma teologia como um discurso
predominantemente calcado na experiência de cristã, e o da libertação as consequências
de uma teologia enraizada no Mistério Pascal”
9
.
Esta é uma dimensão e uma experiência pouco valorizada pela maioria dos que se
afirmam cristãos, porque pensam que as realidades de carne e osso ligadas à vida, tais como
a saúde, o alimento, a moradia, o trabalho, a política ... devem acontecer à margem da fé,
como ação social e responsabilidade do Estado, e à margem dos âmbitos e espaços eclesiais
e da própria Igreja, que quanto muito assume a ação social como suplência.
2 A MISSÃO DA TEOLOGIA: PENSAR AS FERIDAS E R ESGATAR A VI DA
Definir o papel da teologia em meio à complexidade das relações e as atuais
conjunturas socioeconômicas, políticas, culturais e religiosas não é uma tarefa cil. Em
diferentes épocas, e a partir de acontecimentos históricos e sociais diversos, a discussão sobre
a missão da teologia volta ao debate. Com o decorrer do tempo o fazer teológico e o próprio
conceito de teologia sofrem as influências da sociedade, às vezes em uma espécie de modismo
passageiro, em outras fixa-se em perspectivas e objetivos lucrativos, com ações e práticas de
cunho idolátrico. Em teologia, como em outros discursos contemporâneos, na sociedade
fluida e que prima por discursos e relacionamentos superficiais, as temáticas parecem não
conseguir se sustentar por muito tempo, especialmente quando tocam em questões
relacionadas à forma como se encontra estruturada a sociedade.
Neste tipo de estrutura de sociedade, aos teólogos e à teologia se exige sem rodeios e
com insistência, para que se diga coisas novas, e quando estas não o ditas ou ainda não
encontram eco junto aos formadores de opinião, são descartadas como produtos fora da
“moda”. Ou são rotuladas e relegadas ao passado como discursos ‘sem lugar’, como sal ‘sem
sabor’. Neste sentido, estão os que dão por encerrada, morta ou ultrapassada, a Teologia da
Libertação, buscando novas inspirações em algumas correntes do pensamento europeu ou
6 Clodovis BOFF, Teologia da Libertação e volta ao fundamento. REB 67, p.1001.
7 Luiz C. SUSIN, e Érico J. HAMMES, Teologia da Libertação após Aparecida volta ao fundamento? Disponível em: <http://
www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=ES&langref=PT&cod=33420>. Acesso em: 16 ago. 2011.
8 Gustavo GUTIÉRREZ, Práxis de libertação. Teologia e anúncio. Concilium, n. 10 (1974/6). p. 742.
9 Celso Pinto CARIAS e Aurelina de Jesus CRUZ CARIAS, Outra teologia é possível, outra Igreja também. p.61.
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.35-46, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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norte-americano. Outros apontam com entusiasmo e sereno otimismo sua validade nas
sugestivas insinuações de Aparecida, com relação à contribuição de um método e de um
pensamento em vista da formão de discípulos-missionários na Igreja do Continente,
assegurada através do método ver, julgar e agir (DAp 19). De toda maneira é preciso reconhecer
os sinais de que algo novo vem ocorrendo em relão à reflexão teológica latino-americana,
mais sutil e senvel: algo assim como a presea do Reino de Deus, nem sempre evidente
10
.
O modo de fazer teologia que se desenvolveu na América Latina e no Caribe depois
do Concílio Vaticano II e da recepção criativa/profética da Conferência de Medellín
produziu uma época de orescimento teológico. A originalidade desta teologia encontrou
seu alicerce/sustentáculo na grande tradição teológica que unificou a em Jesus Cristo
com a dura realidade dos pobres e marginalizados, tradição que remonta a Antônio
Montesinos, Bartolomeu de las Casas e tantos outros e outras que alargam a lista de
testemunho martirial
11
.
Neste sentido, assumindo a perspectiva levada a cabo pelos teólogos da libertação,
tais como Leonardo Bo, Jon Sobrino, Pedro Trigo e outros, se aprende que este modo de
produção teológica permanece (sempre a mesma), enquanto existirem estruturas
excludentes que produzem marginalizados e desigualdades sociais. Na opção pelos pobres e
contra a pobreza se fixa a pedra angular da teologia cristã. E isso não por modismo, mas por
exigência do Evangelho, pois como afirma o Papa Francisco, “existe um vínculo indissolúvel
entre a nossa e os pobres” (EG 48). Ora, aqui se pode compreender a insistência profética
de Sobrino quando elabora a paráfrase “fora dos pobreso há salvação”
12
.
É evidente que os contextos se transformam e a reflexão teológica precisa estar
atenta aos “sinais dos tempos” (Mt 16,3), mas é certo que, como assegura Ellacuría, os
pobres são o sinal perpétuo de Cristo neste mundo injusto, porque são expressão da
crucificação de Jesus na história. Por isso, “esse povo [crucificado] é a continuação
histórica do Servo de Javé, a quem o pecado do mundo continua a tirar toda figura
humana, à qual os poderes desse mundo continuam a despojar tudo, continuam
arrebatando-lhe a vida, sobretudo a Vida”
13
.
As teologias, portanto, precisam certamente acompanhar as mudanças da sociedade
e das épocas, sem, no entanto, se desviar do ser humano caído no caminho, critério
sempre válido e atual que imprime salvação ou condenação para os cristãos segundo o
critério cristão originário do Evangelho. É o próprio Papa Francisco que recoloca os
pobres no centro da cristã como caminho salvífico devido à sua presença em toda a
tradição cristã. “Todo o caminho da nossa redenção está assinalado pelos pobres” (EG 197).
Francisco compreende que o imperativo evangélico que mais urge ser anunciado neste
momento da história agravado especialmente pela pandemia da Covid-19 e pela ameaça
de guerra difusa – é a fraternidade humana. Progressivamente, ele tem acentuado esta nota
essencial do cristianismo, propondo como “ícone iluminadora” a parábola do Bom
Samaritano (Lc 10,25-37), “capaz de manifestar a opção fundamental que precisamos fazer
para reconstruir nosso mundo ferido” (FT 67). Ser, portanto, “bons samaritanos” e não
“viandantes indiferentes”, por mais sagradas que consideremos outros empenhos, é a
opção que se impõe a cada pessoa de boa vontade neste momento (FT 69).
10 Pedro TRIGO, ¿Ha muerto la teología de la liberación? Bogotá: Pontificia Universidad Javeriana, Facultad de Teología,
Departamento de Teología, 2005. Entre outros elementos analisados, assinala o que disse os opositores, as razões
alegadas e algumas propostas significativas da teologia da libertação.
11 Ignacio Madera Vargas. Algunas consideraciones acerca del todo en teología latinoamericana. p.17. ¿Es
pertinente la Teología de la Liberación hoy? Aportes de Amerindia Colombia. Amerindia. Septiembre 2020,
p.15-34.
12 Cf. Jon SOBRINO, Fora dos pobres não salvação: pequenos ensaios utópicos-proféticos. São Paulo: Paulinas, 2008.
13 Ignacio ELLACURÍA, El pueblo crucicado signo de los tiempos, p.1.
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
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Dessa forma, os pobres e a salvação são dimensões que se implicam, exigem-se
mutuamente e remetem à mais profunda mensagem da cristã. Mais: os pobres, além
disso, se constituem no lugar o locus theologicus - do qual tudo se melhor e mais
profundo. Inclusive que observar que o “desde os pobres”, que é uma parcialidade
histórica, além de ser uma exigência da cristã não causa limitação à plenitude
escatológica. No entanto, “desde os pobres” faz acontecer uma mudança epistemológica
transformadora, não observável a partir de outro ponto. Assim indica o Papa Francisco em
sua visita à paróquia dos santos Isabel e Zacarias, na periferia de Roma: “se entende melhor
a realidade não a partir do centro, mas das periferias”
14
. Assumir a realidade desde baixo
significa atentar para esses movimentos que principiam uma nova lógica para o mundo.
Em palavras de Ellacuría: “há lugares mais propícios ao surgimento de utopias proféticas e
de profetas utópicos”
15
.
Em tempos de vários ópios e distrações, como futebol, fake news e outros
espetáculos, vislumbram-se sinais de esperança. Criar oportunidades de avançar desde o
reverso da história e nas brechas da história para outro mundo possível, como se tem
afirmado, tornou-se absolutamente necessário e extremamente urgente. Por isso, com
razão e urgência, seguindo o veio libertador do evangelho, o Papa Francisco vem
desafiando os teólogos e as comunidades eclesiais para um estilo de vida de acordo com o
projeto do Reino de Deus. Retoma-se, desta forma, a primazia do pastoral sobre o teogico,
o que para muitos teólogos e mesmo cristãos de escritório, causa calafrios e relutância
16
.
O recuo para a teologia de escritório trouxe limitações teológicas, tal como o
distanciamento dos teólogos da realidade do povo. Não seria essa uma das causas que
forçou a um certo academicismo dentro do mundo teológico? Novamente o Papa
Francisco tem exortado para essa realidade: não se contentar com uma teologia de
escritório. O lugar de reflexão teológica devem ser as fronteiras, as ruas, onde os teólogos
e pastores sintam o odor do povo e da rua, derramem azeite e vinho sobre as feridas das
pessoas
17
. Por isso, é importante questionar-se: “em quem pensamos quando fazemos
teologia? Que pessoas temos diante de nós? Sem este encontro com a família, com o Povo
de Deus, a teologia corre o grande risco de se tornar ideologia”
18
.
Esse chamamento do Papa Francisco parece ser novamente um reenvio para “realmar”,
dar alma novamente à atuação e inserção junto às CEBs, buscar a honradez que se deve para
com a realidade... Segundo o Papa, o risco maior de ideologia está em construir uma teologia
de escritório, desde as sacadas ao invés do meio da rua, ou uma Igreja de sacristia, fechada
sobre si e com medo do mundo. Ambas as coisas levam ao perigo histórico de sempre: o
docetismo teológico e eclesial
19
. Neste sentido, Jon Sobrino, mantendo fidelidade à
tradição teológica latino-americana e preocupado com um fazer teológico encarnado nos
problemas e dores dos pobres, sentenciava antes do Papa o perigo da teologia atual.
14 Papa FRANCISCO. Visita à paróquia romana dosSantos Isabel e Zacarias.
15 Ignacio ELLACURÍA, Utopía y profetismo. In: I. ELLACURÍA e J. SOBRINO (Org.). Mysterium Liberationis. v. 1,
p.393. Tradução nossa.
16 Cf. Antonio MANZATTO, Jesus Cristo, p.10-13.
17 Cf. Carta do Papa Francisco por ocasião do Centenário da Faculdade de Teologia da Pontifícia Universidade Católica
Argentina. Disponível em:https://www.vatican.va/content/francesco/pt/letters/2015/documents/papa-
francesco_20150303_lettera-universita-cattolica-argentina.html. Acesso em 19 de abril de 2022.
18 (VATICANO. Mensagem do Papa Francisco ao congresso de teologia junto da Pontifícia Universidade Católica
argentina). Ibidem.
19 Doutrina existente nos séculos II e III que negava a existência de um corpo de carne a Jesus Cristo, que seria espírito
com aparência corpórea apenas. Traduzindo para o contexto latino-americano e caribenho, seria uma teologia sem
corpo, sem o chão dos pobres.
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
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O que mais me preocupa na teologia é sua tendência ao docetismo, isto é, a
criar um âmbito próprio de realidade que a distancie e a desentenda da
realidade real, ali onde o pecado e a graça se fazem presentes. Este docetismo,
que normalmente é inconsciente, pode muito bem levar ao aburguesamento,
isto é, a prescindir dos pobres e vítimas que são maioria na realidade e são a
realidade mais flagrante
20
.
Outra querela atual que também intriga a teologia, uma realidade com graves
consequências, é a falta de utopia. Não serve qualquer utopia, mas aquela que melhor
corresponda à teologia do Reino de Deus pregado por Jesus. Em uma sociedade onde
crescem as disparidades sociais, políticas e econômicas, a teologia precisa fazer valer sua
esperança profética. Neste quesito a teologia pode surgir, segundo Susin, como uma teologia
“exorcista”, capaz de desmascarar a violência legitimada pela sacralidade, e assim refazer
saudavelmente o tecido social e eclesial. Haja vista os momentos históricos em que a religião
tem servido para justificar e promover uma paz sem justiça, onde os pobres e as vítimas são
responsabilizados pelo fracasso do sistema dominante, em nosso caso o sistema capitalista
21
.
Nesta mesma direção tem observado Aquino Junior:
Basta ver como os grupos e os governos de extrema direita na América Latina,
nos EUA e na Europa se reconhecem como ‘cristãos’, justificando
‘religiosamente’ sua política econômica neoliberal, sua aversão aos direitos
humanos, suas mais diversas formas de preconceito e racismos e até mesmo seu
caráter e suas práticas fascistas e/ou nazistas. O atual governo brasileiro é o
exemplo mais claro e transparente de perversão e manipulação da cristã:
‘Brasil acima de tudo; Deus acima de todos’
22
.
Bem de acordo com as denúncias do Papa Francisco é preciso superar esta “economia
que mata”, o que exige caminhar em direção a “adotar outro estilo de vida, menos voraz,
mais sereno, mais respeitador, menos ansioso, mais fraterno” (QA 58).
Para agir com honradez dentro deste contexto é fundamental trabalhar com uma
“teologia exorcista”, com a finalidade de esconjurar falsas teorias e concepções que são
avessas à mensagem do Reino de Deus. É neste horizonte de trabalho por uma inversão
plena, no sentido de colocar o mundo no caminho real da vida, que supere as práticas de
violências justificadas, que Susin fala de uma teologia como exorcismo. Para Susin, hoje
precisamos de uma teologia que seja capaz de exorcizar todas as formas de violência; a
libertação pode ser entendida também como o resultado positivo do exorcismo que
nome à realidade e desmascara seus falsos nomes. Assim, a teologia da libertação é uma
teologia que começa por reconhecer o pecado presente na sociedade e as responsabilidades
por estes pecados incrustados em sua estrutura infetada pelo vírus letal do mercado
capitalista em que o capital está acima, é mais sagrado, do que as pessoas e seu trabalho.
Para esta tarefa profética e exorcista o necessários teólogos, sociólogos,
historiadores, que atuem como intelectuais orgânicos, capazes de apontar as contradições,
denunciar as injustiças e, de certa forma, desconstruir os “intelectuais convencionais”, na
linguagem de Antonio Gramsci, ou ainda mais claramente, desconstruir os intelectuais de
corte. Trata-se de uma teologia de libertação capaz de desmascarar os ídolos fascinantes do
sistema imperialista que provocam a morte de multidões de pobres e excluídos.
20 Jon SOBRINO, Teología desde la realidad. In: Luiz C. SUSIN (Org.). O mar se abriu, p.168.
21 Anotação de palestra proferida online para o colegiado superior do ITEPA, 09/12/2021.
22 J. AQUINO, Francisco de. Teologia e o poder da libertação. Concilium, 386, (2020/3), p.91.
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.35-46, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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3 ELL I BENINCÁ: UM TEÓLOGO-INTELECTUAL ORGÂNICO
Despois deste caminho reflexivo, nossa atenção se volta para o legado do padre Elli
Benincá como intelectual orgânico. A intenção, aqui, é explicitar sua proposta
metodológica como um verdadeiro ‘intelectual orgânico’, considerando-se o conceito
clássico formulado pelo filósofo italiano Antônio Gramsci
23
.
Em primeiro lugar, precisamos elucidar a categoria de intelectual orgânico, para
julgar quanto cabe a Benincá e quanto ele mesmo ajuda a compreender melhor este papel.
Sabe-se que para um teólogo da libertação, comprometido com a práxis teológica é
adequado o conceito de “intelectual orgânico”, ou mais especificamente “teólogo orgânico”.
É aquele que está intrinsecamente comprometido com uma classe social, que assume a sua
causa e reflete caminhos alternativos sempre com uma preocupação de superar as mazelas
sociais e resgatar a vida a partir dos últimos. O conceito de intelectual orgânico,
originalmente de Gramsci, foi incorporado pela Teologia da Libertação porque o
verdadeiro teólogo precisa estar conectado indispensavelmente com a base das minorias
sociais mesmo aquelas que são maiorias em número que são subalternas e que sofrem
as consequências de assimetrias injustas. O Papa Francisco, pastoralmente cuidadoso em
suas palavras, mas ao mesmo tempo sem meias palavras, aponta recorrentemente, de
forma ampla, para as “periferias existenciais e sociais”.
Este pertencimento direcionado às periferias e aos pobres é condição e critério de
atuação de um intelectual orgânico, segundo Antônio Gramsci.
O erro do intelectual consiste em acreditar que se possa saber sem compreender
e, principalmente, sem sentir e sem estar apaixonado (não pelo saber em si,
mas também pelo objeto do saber) isto é, em acreditar que o intelectual possa
ser um intelectual [...] mesmo quando distinto e destacado do povo nação, ou
seja, sem sentir as paixões elementares do povo, compreendendo-as e, assim,
explicando-as em determinada situação histórica, bem como relacionando-as,
dialeticamente às leis da história, a uma superior concepção do mundo,
científica e coerentemente elaborada, que é o “saber”
24
.
Seja em Gramsci ou seja na Teologia da Libertação, a falta de vínculo orgânico pode
distorcer a visão do intelectual e como consequência tirá-lo do solo sagrado da práxis. É na
práxis, na verdade, o lugar onde se encontram os reais fundamentos de todo engajamento
teológico na luta das pessoas, dos grupos excluídos e dominados, com o objetivo da
libertação/salvação. Partindo do conceito ou da compreensão de intelectual orgânico, e de
um ponto de vista de um fazer teológico crítico que tenha por finalidade a libertação de
todas as opressões e desigualdades sociais, em última análise o teólogo orgânico está
presente e intervém intelectualmente na realidade a partir de baixo, tendo como ponto de
partida os sofrimentos e as esperanças, as lágrimas e alegrias dos pobres e excluídos.
Ao analisar agora o pensamento teológico de Benincá pode-se aproximá-lo do
conceito de intelectual orgânico elaborado por Gramsci. Em sua pesquisa de mestrado,
23 Antônio Gramsci, escritor italiano nascido em 1891 na ilha de Sardenha, uma das regiões mais pobres da Itália,
cresceu numa família de classe baixa e desde cedo conviveu com o fato de ter que deixar os estudos para ajudar em
casa. Quando retornou à escola, destacou-se entre os demais estudantes. Cursou Letras em Turim, onde ingressou no
Partido Socialista Italiano (PSI) no qual teve grande atuação como jornalista escrevendo para o órgão oficial do
partido e para outros órgãos socialistas da Itália. Entretanto, o PSI seguia uma linha economicista de interpretação
do marxismo, combinada com uma influência positivista da qual Gramsci discordava. Através da discussão sobre
uma “filosofia da práxis” desenvolvida por Giovanni Gentile intelectual provindo também do sul da Itália
Gramsci, inspirado na ação dos bolcheviques na Rússia, argumentava sobre as condições culturais para o início do
processo revolucionário cuja classe operária seria o ator principal. Jordana Souza SANTOS, Gramsci e o papel dos
intelectuais nos movimentos sociais. Revista Espaço Acadêmico, ano IX, n.102, nov. 2009. Disponível em:http://
eduem.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/viewFile/7128/4819 Acesso em: 20 jul. 2017.
24 Antônio GRAMSCI, Concepção dialética da história, p.139.
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.35-46, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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analisando os conflitos religiosos na ação política do Movimento dos Sem-Terra (MST),
ele mesmo realça a importância dos intelectuais orgânicos. Em sua dissertação retoma este
conceito aplicando-o ao MST, que forma seus líderes em vista dos processos de
conscientização, organização e lutas sociais e políticas
25
. Afirma Benincá que o MST: “tem
seus próprios intelectuais, que procuram não se distanciar da cultura e religiosidade
popular dos trabalhadores”
26
. Na ocasião, retoma o exemplo do deputado estadual, Adão
Preto, que, no ano de 1987, no exercício de legislador, reconheceu em entrevista que se
identificou com a Teologia da Liberação e com a parte da Igreja que assume essa teologia.
A mudança na consciência de Adão ocorreu enquanto agente de pastoral engajado nas
lutas dos sem-terra e nas atividades sindicais
27
.
Benincá reconhece que o MST forma seus líderes que pensam e refletem a ação de
sua classe.
São intelectuais a seu modo, uma vez que não são escritores nem artistas, mas
os cérebros do movimento; aqueles que se imiscuem na vida prática, constroem
o processo de luta social, organizam os agricultores “Sem-Terra”, atuam junto
aos acampados e aos agricultores, persuadindo-os a continuarem na luta,
buscando sempre uma fundamentação teórica, religiosa ou social para dar
compreensão às suas lutas políticas
28
.
Desentranhando estas palavras de Benincá, é possível chamar atenção ao menos para
três questões, no que contribui para a identidade ao intelectual orgânico. Uma primeira,
quando se refere a intelectuais ao seu modo, ou seja, que não dependem exclusivamente da
educação formal, mesmo que esta não seja desprezada. Significa que podem ser analfabetos
nos critérios da sociedade vigente e intelectuais ao seu modo. Entraria aqui a concepção de
saberes diferentes, pluralismo de saberes defendido pelo educador brasileiro Paulo Freire.
Uma segunda questão, a necessidade da inserção prática na vida e na luta social, de onde
brota o testemunho e a necessidade de trabalhar para mudança de mentalidade e a
transformação social/política/religiosa. Uma terceira e última questão, a necessidade de
fundamentação teórica, religiosa e social para avançar na compreensão e conscientização
das massas. No caso, Benincá utiliza a simbologia da Bíblia e da cruz para ressignificar a
prática e a concepção teológica entranhada nos acampados.
A função do intelectual orgânico é encontrar estratégias de luta, formar na prática
política, e mesmo fazer conexão com outras categorias de intelectuais, como sociólogos,
antropólogos e cientistas políticos. Desta forma, segundo Benincá, a organização do MST
estudada por ele conseguiu criar uma camada de intelectuais próprios, nem todos com o
mesmo nível formal, mas capazes de compreender a lógica ou, melhor, a dialética do
processo histórico, e em condições de dirigir e orientar o movimento. Todavia, seguindo o
estudo de Benincá, o reconhecimento e a legitimidade da função que os líderes do MST
exercem como intelectuais não lhes vêm apenas da classe, ou, no caso, dos acampados que
dão consentimento às suas propostas políticas, mas de outras categorias de intelectuais e,
principalmente, dos seus inimigos, justamente quando os combatem
29
. Característica
similar ao que aconteceu com a Teologia da Libertação, pois foi uma atribuição de outros,
de modo especial dos seus inimigos, representantes das classes dominantes e
25 Cf. Elli BENINCÁ, Conito religioso e pxis: o conflito religioso na ação política dos acampados de encruzilhada
Natalino e da Fazenda Annoni, p.151-153.
26 Elli BENINCÁ, Conito religioso e práxis, p.151.
27 Elli BENINCÁ, Conito religioso e práxis, p.151-152.
28 Elli BENINCÁ, Conito religioso e práxis, p.152-153.
29 Elli BENINCÁ, Conito religioso e práxis, p.153.
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.35-46, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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conservadoras que buscam reprimi-la ou negá-la para torná-la ilegítima justamente
porque percebem o perigo em seu potencial conscientizador e transformador.
É esta perspectiva que orienta o trabalho de Benincá junto aos pobres, no sentido de
ajudar na ressignificação das imagens e da concepção de Deus. Em sua pesquisa junto ao
MST, Benincá constata que os acampados sem-terra, nos acontecimentos e nas lutas diárias,
revelam imagens a configurar um Deus que justifica a dor e que os mantém alienados seja
das causas históricas de sua condição seja da real configuração de Deus segundo o Evangelho.
Como se fosse vontade de Deus a exisncia dos sem-terra. Foi uma tarefa exigente a de
ressignificar a simbologia da cruz e a própria blia, para que deixassem de ser instrumentos
de opressão e de submissão para se tornarem fonte de libertação. No caso específico da cruz,
ela foi revisitada como modo de execução humilhante, utilizada originalmente pelo império
romano como instrumento pedagógico para impedir rebeldias e manifestações do povo.
Pedagogicamente, os romanos deixavam expostos os corpos dos crucificados com o objetivo
de mostrar publicamente o destino de quem contrariasse a ordem legal do Império Romano.
A recuperação da “cruz histórica” corrige assim a mistificação da cruz como um drama intra-
trinitário, a cruz como vontade e desígnio do próprio Deus. A blia em geral, de forma
semelhante, foi frequentemente invocada e utilizada como ferramenta para moralizar na
forma de submissão, reprimindo e dificultando a compreensão da realidade histórica,
política, social, econômica e religiosa. Como na carta a Timóteo, Benincá professa e ensina
que a Palavra de Deus o se deixa acorrentar (2Tm 2,9); ou como o salmista, ele lembra
que a Palavra de Deus é lâmpada para os pés e luz para o caminho (Sl 119,105); ou tal como
um agricultor ele atenta para a força libertadora da Palavra de Deus, assim como na
semente a força que a faz germinar enquanto o agricultor dorme.
CONCLUSÃO
O presente artigo buscou adentrar a concepção de intelectual/teólogo orgânico. Na
perspectiva de Antônio Gramsci, o pensamento convencional ou tradicional é decorrente
de um tipo de intelectual que se mantém ligado a uma determinada classe social, atuando
como seu porta-voz e, consequentemente, continua a repetir indefinidamente a mesma
visão e compreensão, servindo assim aos mesmos interesses: as classes hegemônicas.
Romper com esta epistemologia permeada de ideologia foi a missão preliminar
desencadeada pela Teologia da Libertação, ao colher os ventos transformadores
provenientes do Concílio Vaticano II, particularmente na recepção criativa e profética de
Medellín que escutou seriamente os clamores dos povos latino-americanos e colocou as
bases de um movimento revolucionário, o de resgatar a vida e dignidade dos pobres e
excluídos. O teólogo orgânico, nessa nova postura eclesial, explicita uma verdade
evangélica fundamental: os pobres o elevados a sujeitos na compreensão de que eles não
são somente destinatários do Evangelho, mas, inspirados pelo Evangelho, se tornam
criadores de suas próprias vidas e sujeitos de transformação da vida social e mesmo eclesial
em que vivem e atuam, em seu aspecto tanto histórico como salvífico, porque
experimentam Cristo vivo em sua carne. Coerentemente o Papa latino-americano, Papa
Francisco, ensina com toda a força de seu magistério que os pobres são sujeitos ativos e
criativos, que têm muito a oferecer e que se tornam critério de julgamento da sociedade.
Assim, denuncia: “Não fazer os pobres participar dos seus próprios bens é roubá-los e
tirar-lhes a vida” (EG 57).
O resgate da metodologia benincaniana sublinha o testemunho de meio século de
coerência metodológica, a constituição de um método que, em primeiro lugar, mantém a
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
Revista Teopráxis,
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“honradez para com a realidade”, na esteira do todo do Mestre Jesus, e em conformidade
com a essência da mensagem evangélica traduzida pela teologia latino-americana e
caribenha. Ao mesmo tempo, Beninexplicita claramente ao lado de quem e a serviço de
quem deve estar uma verdadeira teologia comprometida, viva e fiel aos passos do Mestre.
Propondo em seu método pastoral e teogico os passos ordenados de 1. Observação; 2.
Registro; 3. Sessão de estudo; 4. Reencaminhamentos, o teólogo, bem como qualquer cristão
que busca pensar responsavelmente, se mantém vinculado com a práxis, sendo este vínculo
fundamental no processo metodológico elaborado com sucesso por Benincá.
A metodologia benincaniana contempla de modo extremamente prático e
transparente a teologia como “ato segundo”, com a precedência pelo ato primeiro da práxis
da cristológica e eclesial no Reino de Deus. Segundo um dos pais da Teologia da
Libertação, Gustavo Gutiérrez: “O discurso sobre Deus vem depois porque o dom da é
anterior e fonte da teologia”
30
. Não se pode descurar de que a realidade dos pobres e das
vítimas do sistema que, ao mesmo tempo que privilegia também vitimiza, é uma realidade
que não somente desperta, mas também perturba, abala, e questiona o sentido da teologia.
Na compreensão de Geraldina Céspedes, “o encontro da com a realidade vivida é o que
vai determinar o caráter específico de nossa teologia”
31
.
O itinerário brevemente percorrido acima demonstra a importância e atualidade/
ousadia deste método que tem o teólogo na postura de intelectual orgânico, pois é em si
uma postura profética diante da realidade virtual, individualista e capitalista que marca o
século XXI. A rapidez com que acontecem os fatos, a interação virtual das notícias e o
discurso e incentivo ao ‘mérito’ e à meritocracia visando a legitimação da acumulação dos
bens materiais são referências cada vez mais clamorosos na sociedade atual. Apresentar
convincentemente, com coerência, a necessidade urgente e inadiável de um estilo de vida
com práticas comunitárias, participativas, a partir dos mais vulneráveis, é certamente
colocar-se na contramão do “sistema-mundo” do mercado globalizado por sua economia
“que mata” (Papa Francisco) a começar pela produção de vasta exclusão.
O Padre Elli Benincá, como teólogo-intelectual orgânico, partindo de uma efetiva
opção pelos empobrecidos e vulneráveis da sociedade, construiu uma metodologia pastoral
e teológica que é capaz de abraçar a teoria e a prática, respeitando a historicidade dos
acontecimentos e demonstrando a necessidade da ‘honradez para com a realidade’, assim
como tem feito a Teologia da Libertação. Ora, na verdade, se “método” tem o sentido de
caminho que conduz para além, para uma meta e uma superação, temos aqui um caminho
obrigatório para que os cristãos como discípulos-missionários que tem as mesmas
aspirações, sentimentos e ágape de Cristo. Benincá traçou um modelo extremamente
prático e compreensível, que traz em seu interior mais profundo uma espiritualidade
profética e criativa e que possibilita atuar na realidade social e eclesial como sal da terra e
luz do mundo (Mt 5,13-14), porque produz libertação histórica/salvação transcendente
sem confusão nem separação. O método mesmo sinaliza o Reino de Deus, na
concretização do bem maior, que, segundo a revelação nas Escrituras é o atributo por
excelência do Deus Vivo, o dom da Vida!
30 Gustavo GUTIÉRREZ, Teologia da libertação, p.33.
31 Geraldina CÉSPEDES, Novos fios para um novo tecido. In: Agenor BRIGHENTI e Rosario HERMANO (Org.),
Teologia da libertação em prospectiva, p.32.
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.35-46, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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2022.
ZANINI, Rogério L.; SUSIN, Luiz C.
O Intelectual Ornico: A teologia não se deixa acorrentar (2Tm 2,9)
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.35-46, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
OUSAR SONHAR
Por uma Educação que
promova a Fraternidade
DARE TO DREAM
For an Education that
promotes Fraternity
Silvio Antônio Bedin*
Resumo: o artigo tem o propósito de refletir e fazer ressoar a Campanha
da Fraternidade de 2022, cujo tema é Fraternidade e Educação. Tomando
por base a Doutrina Social da Igreja, busca retomar alguns
posicionamentos históricos em torno da educação. Intenciona também
estabelecer pontes de diálogo com alguns pesquisadores que transitam pelo
campo da educação e que enaltecem sua importância, desde uma
perspectiva integral e humanizadora. Aponta para os desafios colocados à
pastoral da educação, convidada a se reinventar e reorganizar para ser uma
presença evangelizadora, de escuta sensível, nos espaços educativos.
Palavras-chave: Campanha da Fraternidade. Educação. Formação
integral. Pastoral da educação.
Abstract: The article has the purpose to reflect and to reverberate the
2022 fraternity campaign, whose subject is Fraternity and Education.
Based on the Church's Social Doctrine, it aims to retake some historical
positions about education. It also aims to establish dialogue connections
with some researchers, who transit through the education field and praises
its importance, from an integral and humanizing perspective. It points to
the challenges posed to the education pastoral, that its invited to reinvent
and reorganize itself to be an evangelizing presence and sensitive listening,
in educational spaces.
Key words: Fraternity Campaign. Education. Integral formation. Pastoral
of education.
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 47-55, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.76
* Mestre e Doutor em Educação (FACED-
UFRGS). Professor aposentado da
Universidade de Passo Fundo (UPF).
Diácono Permanente e da coordenação da
Pastoral da Educação e Cultura, da
Arquidiocese de Passo Fundo.
E-mail: sbedin@upf.br
https://orcid.org/0000-0002-4791-0699
Recebido em 22/11/2021
Aprovado em 20/03/2022
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1 INTRODUÇÃO
Desejo ardentemente que, neste tempo que nos cabe viver,
reconhecendo a dignidade de cada pessoa humana,
possamos fazer renascer, entre todos,
um anseio mundial de fraternidade.
Aqui está um ótimo segredo para sonhar
e tornar a nossa vida uma bela aventura.
Ninguém pode enfrentar a vida isoladamente (...);
Precisamos de uma comunidade que nos apoie,
que nos auxilie e dentro da qual nos ajudemos mutuamente
a olhar em frente.
Sozinho corre-se o risco de ter miragens,
vendo aquilo que não existe;
É junto que se constroem os sonhos (FT 8).
Pela terceira vez na história da Campanha da Fraternidade, a Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil (CNBB) propõe à Igreja e à sociedade uma reflexão sobre a
importância da educação na construção da fraternidade e dos valores que dão sustentação à
vida em sociedade, de forma saudável e democrática
1
. A proposta está em sintonia com o
magistério do Papa Francisco que tem chamado a Igreja a se envolver com as questões da
educação e colocá-la a serviço da fraternidade. Basta aqui relembrar seu chamamento a um
Pacto Educativo Global e a sua mais recente Carta Encíclica Fratelli Tutti sobre a
fraternidade e a amizade social, de onde retiramos a epígrafe que abre este texto.
De fato, a temática da Campanha da Fraternidade de 2022 (CF22) encontra-se assim
expressa: Fraternidade e Educação, e tem por lema de inspiração um provérbio bíblico que
fundamenta a missão do educador: fala com sabedoria, ensina com amor (cf. Prov 31,26).
Tomando por referência o texto-base da CF22, este artigo tem o propósito de fazer ressoar
e reforçar tais reflexões, abrindo perspectivas para a tomada de novos compromissos e
apostas neste campo tão fértil, desafiador e promissor. Quer ainda contribuir para que, de
acordo com a proposta de Igreja em saída do Papa Francisco
2
, possamos ir ao encontro das
periferias geográficas, sociais e existenciais, dentre elas o vasto e múltiplo campo da
educação, assumindo-as como campo de missão, como propôs o XX Encontro nacional da
Pastoral da Educação
3
. A preocupação com a educação fora manifestada pela própria
CNBB no documento Educação, Igreja e Sociedade, de 1992:
A comunidade cristã não pode ficar indiferente diante do descaso com que é
tratada a educação no Brasil. Se quisermos superar o círculo vicioso da miséria
que gera a miséria’, a Igreja e toda sociedade brasileira deve passar a assumir a
Educação como verdadeira PRIORIDADE NACIONAL (CNBB, 2014, n.99).
Com uma postura pastoral missionária, que envolve escuta sensível, diálogo e
compromisso, somos desafiados a assumir a educação como um lugar teológico singular
para viver e pensar nossa própria fé, tendo por referência a prática de Jesus e os valores
que bebemos no poço do Evangelho, bem como a longa tradição da Igreja e o seu
magistério neste campo educacional.
1 A Campanha da Fraternidade teve seu começo em 1964. Em 1982, a Igreja propôs como tema de reflexão
“Fraternidade e Educação”, que se inspirou no lema “A verdade vos libertará”; em 1998, pela segunda vez voltou à
temática com o lema “A serviço da vida e da esperança”.
2 Papa FRANCISCO, Exortação Apostólica do Papa Francisco Evangelii Gaudium - A alegria do Evangelho. Edições
CNBB: Brasília, 2013.
3 CNBB, Comissão Episcopal Pastoral para a Cultura de Educação – setor educação. XX Encontro Nacional da Pastoral
da Educação- texto de trabalho. Brasília – DF, 2020.
BEDIN, Silvio Antônio
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.47-55, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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2 DA EDUCAÇÃO
Tendo consciência de que o conceito de educação não é unívoco, torna-se necessário
sempre dizer de qual perspectiva falamos quando tratamos de educação.
A educação se traduz sempre como um constructo histórico e circunstanciado que
responde a finalidades, que por sua vez, precisam ser definidas previa e conscientemente.
Quando não se reete sobre a educação, ela se processa dentro de uma cultura cristalizada e
perenizada
4
que tende a reproduzir o senso comum, salienta Luckesi. Por sua vez,
Benincá
5
sempre apontou para a práxis educativa como ferramenta permanente a ser
utilizada pelos profissionais da educação em suas práticas cotidianas, visando transformá-
las. Nada permanece igual quando entra o pensamento crítico que produz reflexão, e
remete a ações aprimoradas. De forma que é imperioso que a educação seja sempre
pensada nos seus fundamentos, finalidades e múltiplas dimensões.
Neste sentido, torna-se imprescindível compor uma teleologia da educação que
tomando por referência fundamentos antropológicos, axiológicos, epistemológicos e
pedagógicos, defina-se previa e conscientemente os objetivos que se deseja alcançar, aquilo
que se almeja como horizonte da ação educativa. Espera-se que tais propósitos possam
responder às urgências e desafios do nosso tempo. É fundamental, ademais, que se conheça
o que a Pedagogia, que bebe sempre de conhecimentos produzidos pelas demais ciências, já
elaborou em relação a como se desenvolvem os processos de conhecimento e de formação
em cada ser humano. Sem isso, corre-se o risco de reproduzir formas ultrapassadas de
pedagogias que o senso comum cristalizou, e que não correspondem mais à atualidade,
como bem salienta Becker em suas pesquisas
6
.
Voltar a se questionar e buscar compreender questões como o que é educar, para quê
educar e como educar, nos ajuda a oxigenar o pensamento, e atualizar os novos
conhecimentos que as diferentes ciências humanas oferecem à compreensão do fenômeno
da educação. Assim, sempre se pode trazer à discussão: que tipo de ser humano deseja-se
formar? Com que valores deseja-se formar? Qual a pedagogia mais apropriada? Com que
metodologia? É imperioso recordar que todos nós vivemos e somos movidos por valores,
internalizados e materializados em nossas ações. Ter conscncia disso pode ajudar a ter uma
relação ctica, a fazer opções e a dar uma direção consciente à nossa vida e à miso educativa.
Faz-se mister ainda salientar que tudo decorre da concepção de educação que
fundamenta e orienta o nosso agir de educadores e que se busca concretizar no dia a dia.
Pois que dela decorrem iniciativas, decisões, criações, prioridades. Neste sentido, a crise da
pandemia que vivemos nos suscita a pensar em novas formas de promover a formação
humana, fazendo ecoar a perspectiva humanista da educação, superando a racionalidade
instrumental técnico-utilitária.
No Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o
Século XXI, Delors (2001) reconhece que, historicamente, a educação vem sendo orientada
por uma visão instrumental voltada para a formação profissional adequada às demandas do
mundo do trabalho. Contudo, ele defende que é preciso superar esta visão instrumental,
reducionista, ainda predominante nas nossas instituições, buscando ampliar o seu leque de
possibilidades de modo a descobrir, reanimar e revelar o tesouro escondido em cada um de
nós. Enfatiza que a educação precisa voltar-se para a plenitude da realização da pessoa, na
sua totalidade, na sua inteireza de ser
7
.
4 Cipriano Carlos LUCKESI, Filosoa da Educação, p.32.
5 Elli BENINCÁ e Flávia E. CAIMI, Formação de Professoresum diálogo entre teoria e prática. 2ª ed. Passo Fundo: 2004.
6 Fernando BECKER, Epistemologia do professoro cotidiano da escola. 12ª.ed., Petrópolis: Vozes, 1993.
7 Jacques DELORS et al. Educação um tesouro a descobrir. 6ª.ed., São Paulo: Cortez, 2001, p.89-102.
BEDIN, Silvio Antônio
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.47-55, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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No relatório, apresenta e defende como princípio fundamental, que a Educação deve
ser concebida como um processo dialético para toda a vida, que começa com uma viagem
interior, de autodescoberta, para abrir-se à descoberta do outro como companheiro de
viagem. Para cumprir este processo que é individualizado, mas também social-interativo,
o autor propõe que ela contemple e integre o que ele denomina de os quatro pilares da
educação: 1) aprender a conhecer: a educação precisa oferecer os instrumentos intelectuais
necessários à compreensão do mundo em que vivemos, para que se possa nele mover-se e
viver com dignidade; 2) aprender a fazer: A educação precisa voltar-se à formação
profissional para o mundo do trabalho, buscando desenvolver qualidades como a capacidade
de comunicar-se, de trabalhar com os outros, de gerir e resolver conflitos; 3) aprender a
viver juntos: a educação precisa promover a descoberta progressiva do outro, a partir da
convivência, favorecendo a participação em projetos comuns e 4) aprender a ser: a
educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa, contemplando espírito e
corpo, inteligência e sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal, espiritualidade.
Brandão corrobora com esta perspectiva em seus escritos, fazendo crítica às
concepções de uma racionalidade instrumental, simplificadora e redutiva da educação. Em
seu livro “Minha casa, o mundo”, acentua que
A educação não existe pra treinar produtores de bens, mas para formar
criadores de suas próprias vidas e da vida social dos mundos em que vivem (...).
Nós nos educamos, antes de mais nada, para conviver e para ser. Não para o
desenvolvimento econômico, mas para o desenvolvimento humano, ao qual
devem servir todos os outros
8
.
Em “a flauta de Prata – escritos sobre o saber e a educação” anuncia alguns passos entre
caminhos de outra educação
9
, propondo reflexões sobre um ideário de princípios e de valores
voltados a uma educação humanista e humanizadora, transformada e transformadora
A finalidade da educação é essencialmente o desenvolvimento humano e, não, o
desenvolvimento econômico. A Pessoa Humana e não o mercado de trabalho
do mundo dos negócios é o seu destinatário e a razão do seu exercício
10
.
O mesmo autor destaca ainda que a educação deve voltar a ser, em cada pessoa, um
instrumento de criação do presente e do futuro, para que ela possa viver em plenitude, a
cada momento, a felicidade compartilhada, imerso em comunidades de vida. Para a
efetivação desse projeto, precisa desenvolver o senso de corresponsabilidade com o
mundo, capaz de abraçar todas as pessoas em uma vida de partilha da felicidade.
Ele defende que é tempo de reencantar a educação, em consonância com os
paradigmas emergentes nos campos de conhecimentos humanos, sejam os das ciências,
sejam os da própria vida. E, dentre eles, sugere que se considerem os conhecimentos
relacionados à emoção, fonte ordenadora de comportamentos e racionalidades as mais
distintas e fluidas. É na emoção compartilhada que se geram a confiança e o amor. Por fim,
salienta que devemos ousar pensar e praticar uma educação para um projeto de vida, fundado na
criação de culturas de paz, e de partilha amorosa da vida e da felicidade
11
.
Corroborando com tal entendimento, Maturana agrega outros conhecimentos
fundamentais à compreensão do humano e da educação, advindos de suas pesquisas no
campo da biologia. Para ele, assim como todos os animais, os humanos são embalados pelas
8 Carlos R. BRANDÃO, Minha Casa, o mundo, p.117.
9 Carlos R. BRANDÃO, A Flauta de Prataescritos sobre o saber e a educação, p.153-159.
10 Carlos R. BRANDÃO, Minha Casa, o mundo, p.153.
11 Carlos R. BRANDÃO, A Flauta de Prataescritos sobre o saber e a educação, p.154.
BEDIN, Silvio Antônio
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.47-55, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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emoções, que constituem a estrutura profunda desse ser. Biologicamente as emoções são
disposições corporais dinâmicas que denem os diferentes domínios de ação em que nos movemos
12
.
As emoções definem atitudes, comportamentos, ações, relações, guiando o fluir do
comportamento humano, dando-lhe o seu caráter de ação. Não é a razão que nos leva à
ação, mas a emoção
13
, pensamos e agimos conforme sentimos. Na base de cada ação está
uma emoção que a configura. Assim, o humano se constitui no entrelaçamento do emocional
com o racional
14
. Para o autor, a emoção fundamental e central na constituição do humano,
que tornou possível a história da nossa hominização, foi o amor, que é a emoção que
constitui o domínio de ações em que nossas interações recorrentes com o outro fazem do outro um
legítimo outro na convivência
15
. Assim,
O Amor, a aceitação do outro como um legítimo outro na convivência, é uma
condição necessária para o desenvolvimento físico, comportamental, psíquico,
social e espiritual normal da criança, assim como para a conservação da saúde
física, comportamental, psíquica, social e espiritual do adulto
16
.
Segundo Maturana, o o reconhecimento ou o desprezo desta emoção fundante, a
negação do amor, é responsável pela maior parte das enfermidades que afligem os seres
humanos, isso porque Nós seres humanos nos originamos no amor e somos dependentes dele. Na
vida humana, a maior parte do sofrimento vem da negação do amor: os seres humanos somoslhos
do amor
17
. Para ele existe o fenômeno social quando as relações se fundam na aceitação
do outro como legítimo outro na convivência:
Relações humanas que não estão fundadas no amor não são relações sociais.
Portanto, nem todas as relações humanas são sociais (...). Comunidades
humanas fundadas em outras emoções diferentes do amor, (...) não serão
comunidades sociais
18
.
Partindo dessas premissas, Maturana lança desafios à compreensão da educação
como um fenômeno natural em que a criança e o adulto aprendem recíproca e
espontaneamente ao conviver, transformando-se e tornando-se progressivamente mais
congruente seu viver com o do outro no espaço de convivência. A educação ocorre todo o
tempo, permanentemente, e de forma recíproca, as pessoas aprendem a viver de forma
configurada ao conviver na comunidade de pertença. A educação é um processo contínuo,
que dura toda a vida e que faz da comunidade em que vivemos um mundo
espontaneamente conservador, ao qual o educar se refere, tendo efeitos de longa duração
que não mudam facilmente.
Como vivermos é como educaremos e conservaremos no viver o mundo que
vivermos como educandos. E educaremos outros com nosso viver com eles, o
mundo que vivermos no conviver
19
.
Mostra-se pertinente e necessário, após discorrer sobre os fundamentos apontados
pelos autores, que se volte a pensar sobre o assunto da educação, como o propõe a CF22,
pois é dela que depende a educação das novas gerações que terão preponderância na
construção do mundo que desejamos habitar. Para além de todo conformismo, de quem
12 Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.15.
13 Cf. Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.23.
14 Cf. Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.18.
15 Cf. Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.22.
16 Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.25.
17 Cf. Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.25.
18 Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.26.
19 Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.30.
BEDIN, Silvio Antônio
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade
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Passo Fundo, v.39, n.132, p.47-55, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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pensa e age como se não houvesse alternativas ao mundo de competição, de lutas e de
violências, Maturana, em consonância com a proposta lançada pela CF22, propõe outros
olhares e ferramentas intelectuais para compreender a missão educativa. No seu livro
“Formação Humana e Capacitação”
20
defende trabalhar, através de vivências no cotidiano,
os valores que configuram o que ele chama de Biologia do Amor. Assim, remete a
questionamentos fundamentais na tarefa educativa:
Para quê educar? Para recuperar a harmonia fundamental que não destrói, que
não explora, que não abusa, que não pretende dominar o mundo natural, mas
que deseja conhecê-lo na aceitação e respeito para que o bem-estar humano se
no bem-estar da natureza em que se vive. Para isso é preciso aprender a
olhar e escutar sem medo de deixar de ser, sem medo de deixar o outro ser em
harmonia, sem submissão
21
.
3 DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE
Em consonância com esses e outros autores que transitam pelo mundo da pesquisa
em educação, a CF22 nos incita a pensar a educação como ferramenta para construir
comunidades humanas de vida, tecidas por relações fraternais, que promovam a
cooperação e a solidariedade. Em suma, educar para viver em comunhão.
Importante reconhecer que nos afetamos mutuamente na convivência, seja em que
âmbito for. Ela nos convida a refletir sobre a educação na perspectiva humanizadora, como
uma ação humana e divina de criação; considera-a uma ferramenta imprescindível na
formação humana voltada a reconhecer, valorizar e investir na multidimensionalidade
constituinte de cada ser humano, a promover a fraternidade e a amizade social. Reforça o
humanismo solidário que está presente na bimilenar história da Igreja e que se encontra
compilado na Doutrina Social da Igreja
22
. Acredita no processo de transformação
permanente de cada pessoa, durante a vida toda. Compreende também que esta é uma
tarefa da Família, da Escola, da Igreja e da Sociedade, como o próprio Concílio Vaticano II
o afirmara na Declaração Gravissimum Educationis (GE). Nela afirma que os pais o os
primeiros e principais educadores (...) a família é a primeira escola de virtudes sociais de que
precisam todas as sociedades (...); Cabe à Igreja o dever de educar (...) para promover o
desenvolvimento integral da pessoa humana...” (GE 1506)
23
. Na Declaração também enaltece a
missão dos professores, dizendo que
(...) é bela e de grande influência a vocação de todos aqueles que, para ajudarem
os pais no desempenho do seu ofício e para fazerem às vezes da comunidade
humana, se incumbem a tarefa de educar nas escolas. Vocação que exige dotes
peculiares de espírito e de coração, preparação muito esmerada, prontidão
contínua de renovar-se de adaptar-se (GE 1511).
O Papa Francisco apresentou ao mundo a proposta de um Pacto Educativo Global,
onde destaca elementos constitutivos para uma educação humanizadora integral que
forme pessoas abertas ao diálogo e à compreensão de que estamos todos integrados e
interligados na mesma caminhada. O Pacto propõe que a educação contribua para
desenvolver o espírito de fraternidade, assumindo o cuidado como uma forma
corresponsável de ser e de estar juntos nesta Casa Comum que habitamos.
20 Humberto MATURANA e Sima N. REZEPKA, Formação Humana e Capacitação. Petrópolis: Vozes, 2000.
21 Humberto MATURANA, Emoções e linguagem na educação e na política, p.34.
22 PONTIFICIO CONSELHO “JUSTIÇA E PAZ”. Compêndio da doutrina social da Igreja/Pontifico Conselho “Justiça e
Paz”; tradução da CNBB, São Paulo: Paulinas, 2011.
23 COMPÊNDIO DO VATICANO II – Constituições, decretos, declarações. Petrópolis: Vozes, 1980.
BEDIN, Silvio Antônio
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade
Revista Teopráxis,
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Para levar adiante esta agenda, o Papa propõe encarar sete itens fundamentais: 1)
Colocar no centro de cada processo educativo a pessoa, seu valor, a sua dignidade,
enfocando sua especificidade, beleza, singularidade e capacidade de estar em relação com
os outros e a realidade, rejeitando a cultura do descarte; 2) ouvir a voz das crianças,
adolescentes e jovens, a quem transmitimos valores e conhecimentos, para construir
juntos um futuro de justiça e paz, uma vida digna para todos; 3) Favorecer a plena
participação das meninas e jovens na instrução; 4) ver na família o primeiro e
indispensável educador; 5) Educar para o acolhimento, abrindo-nos aos mais vulneráveis e
marginalizados; 6) Empenhar-nos no estudo para encontrar outras formas de compreender a
economia, a política, o crescimento e o progresso, para que estejam a servo da família
humana na perspectiva da ecologia integral; 7) Guardar e cultivar a nossa casa comum,
protegendo-a da exploração dos seus recursos, adotando estilos de vida mais sóbrios e
apostando na utilização de energias renoveis e respeitadoras do ambiente (CNBB, 2021).
Ao propor essa agenda de compromisso comum, o Pontífice reconhece a necessidade
de unir esforços para formar pessoas maduras e com responsabilidade na construção do
bem coletivo. Inspirado no provérbio da sabedoria africana, afirma que para educar uma
criança é necessária uma aldeia inteira.
Em sintonia com ele, a CF22 objetiva incentivar diálogos e reflexões sobre os
sentidos basilares da educação, para que cada pessoa seja educada a viver a fraternidade na
construção do Reino de Deus.
A educação cristã se orienta pela perspectiva da educação integral, que visa formar o
ser humano em todas as suas dimensões, considerando que ele é uma pessoa corporal e
espiritual, singular, única e irrepetível, que não pode ser instrumentalizada, nem reduzida,
mas precisa ser formada no compromisso do humanismo solidário. Um currículo
fundamentado nele, voltado ao conteúdo da vida, além de ser implementado na Educação
Básica e Superior, pode também mobilizar a Família, Igreja, organizações sociais, dentre
outros. A educação diz respeito a toda a sociedade.
É preciso investir numa educação que promova a cultura do diálogo e a interação de
saberes. A Escola e a Universidade, como espaços de educação formal, são um campo fértil
para verdadeiras experiências de encontro, de diálogo, de reflexão e do olhar atento para a
realidade. Nesta direção, o Papa Francisco tem chamado a atenção que a missão da escola é
desenvolver o sentido do verdadeiro, o sentido do bem e o sentido do belo.
Com a pandemia aprendemos muito sobre nossa vulnerabilidade, e que tudo está
interligado. Cientes da nossa fragilidade, diante da morte e do luto, somos desafiados a nos
comprometer com uma educação que desperte o espírito colaborativo e solidário e ajude a
lutar pela vida, pois como diz o Papa Francisco, na Fratelli Tutti “ninguém se salva
sozinho” (2020, p.26).
Não existem soluções fáceis para problemas difíceis. Mas podemos iniciar novos
processos que contribuam para uma nova realidade educacional no nosso país, articulando
as instituições que estão empenhadas nesta causa. Em âmbito eclesial, é fundamental
dinamizar aquelas pastorais especialmente ligadas à educação. A Conferência dos Bispos
do Brasil está propondo que seja reorganizada a Pastoral da Educação e Cultura em torno
de quatro setores inter-relacionados: setor Escolas (públicas e confessionais); setor
Universidades; setor Ensino Religioso; e setor Cultura. Em cada setor, o desafio é o de ser
presença de escuta sensível, de diálogo e de apoio a projetos humanizadores.
No XX encontro nacional da Pastoral da Educação, em 2020, deu-se ênfase à missão
pastoral, especialmente na Escola pública. No texto preparatório ao encontro, lê-se:
BEDIN, Silvio Antônio
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.47-55, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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A escola pública cumpre uma importante função social: investir na formação de
homens e mulheres livres, capaz de interferir, com autonomia e
responsabilidade, na sociedade. Trata-se de um vasto universo, permeado de
desafios e esperanças, terreno fértil para a pastoral da educação. Nele, encontra-
se a maioria da população escolar. Nesse contexto, é fundamental que a Igreja
proponha caminhos para adentrar no chão da escola pública contribuindo,
assim, para a melhoria da qualidade da educação ofertada em nosso imenso país.
(CNBB, 2020, p.10).
Assumir pastoralmente a Escola e a Universidade significa ser presença de diálogo,
tendo presente suas realidades, e promover iniciativas de corresponsabilidade no cuidado e
na construção do respeito e da cultura de paz. Significa assumi-los como espaço teológico
onde se busca perceber a epifanização do Divino e escutar a revelação do que hoje o
Espírito Divino está a dizer.
4 À GUISA DE CONCLUSÃO
Disse o Papa Francisco:É tempo e olhar em frente com coração e esperança. Que para isso
nos sustente a convicção de que habita na educação a semente da esperança: uma esperança de paz,
de justiça; uma esperança de beleza, de bondade; uma esperança de harmonia social
24
. Somos
seres vocacionados e destinados ao amor, à harmonia e à paz e educar é um ato de
esperança no ser humano, é acreditar no seu poder transformador. A educação pode
contribuir para que prospere entre nós o Reino de Deus, apregoado por Jesus de Nazaré.
Impulsionados por tal ideário, torna-se necessário protagonizar processos que
construam novas realidades nos espaços educativos. O próprio texto-base da CF22, acima
referido, apresenta um conjunto significativo de iniciativas que, uma vez assumidas,
podem contribuir nas necessárias mudanças que o nosso tempo exige. Mas tudo começa
com os sonhos e a ousadia, sem os quais, não se conseguirá caminhar.
REFERÊNCIAS BIBLI OGRÁFICAS
BECKER, Fernando. Epistemologia do professoro cotidiano da escola. 12ª. ed. Petrópolis: Vozes, 1993.
BENINCÁ, Elli; CAIMI, Flávia Eloisa. Formação de Professores um diálogo entre teoria e prática. 2ª.
ed., UPF: Passo Fundo, 2004.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Minha Casa, o mundo. Aparecida (SP): Ideias & Letras, 2008.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A Flauta de Prataescritos sobre o saber e a educação. Curitiba: Editora
CRV, 2019, p.153-159.
CNBB. Campanha da Fraternidade 2022: Texto-Base. Brasília: Edições CNBB, 2021.
CNBB. Comissão Episcopal Pastoral para a Cultura de Educação – setor educação. XX Encontro
Nacional da Pastoral da Educação - texto de trabalho. Brasília, 2020.
CNBB. Educação, Igreja e Sociedade. 7ª. ed. São Paulo: Paulinas, 2014.
COMPENDIO DO VATICANO II – Constituições, decretos, declarações. Petrópolis: Vozes, 1980.
DELORS, Jacques et al. Educação um tesouro a descobrir. 6ª. ed. São Paulo: Cortez, 2001, p.89-102.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Filosoa da Educação. São Paulo: Cortez, 1994.
MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educão e na política. Belo Horizonte: UFMG, 1999.
MATURANA, Humberto; REZEPKA, Sima Nisis. Formação Humana e Capacitação. Petrópolis:
Vozes, 2000.
PAPA FRANCISCO. Carta Encíclica Fratelli TuttiSobre a fraternidade e a amizade social. São Paulo:
Paulus, 2020.
24 Cf. https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2020-10/papa-francisco-pacto-educativo-global-educao-
esperanca.html. Acesso em 5.3.2022.
BEDIN, Silvio Antônio
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.47-55, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
55
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica do Papa Francisco Evangelii GaudiumA alegria do
Evangelho. Brasília: Edições CNBB, 2013.
PONTIFICIO CONSELHO “JUSTIÇA E PAZ”. Compêndio da doutrina social da Igreja/Pontifico
Conselho “Justiça e Paz”; tradução da CNBB, 7ª. ed., São Paulo: Paulinas, 2011.
BEDIN, Silvio Antônio
Ousar Sonhar: Por uma Educação que Promova a Fraternidade
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.47-55, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
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International License.
A CAMPANHA DA FRATERNIDADE
2022 E OS DESAFIOS DA
EDUCAÇÃO NA AMAZÔNIA À LUZ
DO SÍNODO ESPECIAL PARA A
AMAZÔNIA
THE FRATERNITY CAMPAIGN AND
THE CHALLENGES OF EDUCATION
IN AMAZON STATE IN LIGHT OF
THE SPECIAL SYNOD FOR THE
AMAZON
Márcia Maria de Oliveira*
Resumo: Neste artigo trazemos para o debate o tema da Campanha da
Fraternidade 2022 ‘Fraternidade e Educação’ em diálogo direto com
algumas breves memórias do processo sinodal que conduziu a Igreja da
Amazônia no processo preparatório ao Sínodo Especial para a Amazônia,
intitulado ‘Amazônia:novos caminhos para a igreja e para uma Ecologia
Integral’. É resultado dos diversos círculos de formação sobre a Campanha
da Fraternidade realizados em diversas comunidades da periferia de Boa
Vista, capital de Roraima durante o período da quaresma. Recolhe
fragmentos do Documento Final da Assembleia Sinodal e da Exortação
Pós-Sinodal ‘Querida Amazônia’ na perspectiva da educação na Amazônia.
Traz para o debate a temática da Ecologia integral que foi o tema
transversal do Sínodo, passando, necessariamente pelo debate da Encíclica
Laudato Si`. Por fim, apresenta a sinodalidade como caminho e caminhada
da Igreja da Amazônia e uma orientação para toda Igreja descolonizar suas
práticas e metodologias pastorais à luz da sinodalidade que representa
importantes rupturas nos itinerários de toda Igreja num processo de
aprendizado com os Povos Indígenas.
Palavras-chave: campanha da fraternidade. Educação. Sinodalidade.
Ecologia Integral. Querida Amazônia. Sínodo Especial para a Amazônia.
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 56-67, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.104
* Doutora em Sociedade e Cultura na
Amazônia; Professora da Universidade
Federal de Roraima; Assessora da Rede
Eclesial Pan-Amazônica (REPAM)
E-mail: marciamariola@gmail.com
https://orcid.org/0000-0001-5511-0942
Recebido em 07/10/2021
Aprovado em 21/05/2022
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
INTRODUÇÃO
No seu anúncio ao Sínodo Especial para a Amazônia, em 15 de
outubro de 2017, o Papa Francisco enfatizava o caráter abrangente do
sínodo, sua preocupação em apontar novos caminhos para a
evangelização e o desafio da escuta aos povos indígenas:
Atendendo o desejo de algumas Conferências
Episcopais da América Latina, assim como ouvindo a
voz de muitos pastores e fiéis de várias partes do
mundo, decidi convocar uma Assembleia Especial do
Sínodo dos Bispos para a região Pan-amazônica. O
Sínodo será em Roma, em outubro de 2019. O objetivo
principal desta convocação é identificar novos
caminhos para a evangelização daquela porção do Povo
de Deus, especialmente dos indígenas, frequentemente
esquecidos e sem perspectivas de um futuro sereno,
também por causa da crise da Floresta Amazônica,
pulo de capital importância para nosso planeta. Que
os novos Santos intercedam por este evento eclesial
para que, no respeito da beleza da Criação, todos os povos
da terra louvem a Deus, Senhor do universo, e por Ele
iluminados, percorram caminhos de justiça e de paz
1
.
O anúncio do sínodo representa um prenúncio da intensa, ativa
e efetiva participação dos Povos Indígenas em todo o processo sinodal
com importantes logros para a igreja e para as lutas e resistências dos
povos indígenas. Ao mesmo tempo insere no processo sinodal a
dimensão da escuta como atitude de aprendizagem na perspectiva do
lema da Campanha da Fraternidade 2022: “Fala com sabedoria, ensina
com amor” (Pr 31,26)
2
. Na perspectiva indigne, saber falar com
sabedoria implica saber escutar com profundidade.
Abstract: In this article, the theme of the 2022 Fraternity Campaign is
brought to the debate “Fraternity and Education” in direct dialogue with
some brief memories of the synodal process that led the Amazon church in
the preparatory process in the special synod for the Amazon, titled:
“Amazon: new paths for the church e for a Integral Ecology”. It is the result
of several formation circles about the Fraternity Campaign that were held
in many communities on the outskirts of Boa Vista, the capital city of
Roraima State, during the lent period. It collects fragments of the Final
Document of the Synodal Assembly and of the Post-synodal Exhortation
“Dear Amazon” in the perspective of education in the Amazon. It brings to
the debate the subject of Integral Ecology that was the transversal theme,
passing necessarily through the debate of the Encyclical Laudato Si.
Finally, it presents Synodality as the path and the walk of the Amazon
Church and guidance for the whole Church to decolonize its pastoral
practices and methodologies in the light of Synodality that represents
important ruptures in the itineraries of the whole Church in a learning
process among indigenous peoples.
Keywords: fraternity campaign. Education. Synodality. Integral Ecology.
Dear Amazon. Special Synod for the Amazon.
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 56-67, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
1 Sínodo Especial para a Amazônia realizado em outubro de 2019 (https://
www.cnbb.org.br/convocado-um-sinodo-especial-para-a-amazonia-a-ser-realizado-
em-outubro-de-2019/). Consultado em: 20/07/2020.
2 Texto bíblico citado a partir da Bíblia Sagrada, tradução oficial da CNBB. Brasília: Ed.
CNBB, 2018.
58
Em sua convocatória oficial o Papa Francisco afirmou que o Sínodo deveria “debater
temas relacionados à evangelização dos povos da Amazônia, as possibilidades de uma
Ecologia Integral e as lições de convivência e de cuidado com a criação que os Povos
Indígenas ensinam para todo o planeta” e enfatizava: “é bom que agora sejais vós próprios
a autodefinir-vos e a mostrar-nos a vossa identidade. Precisamos escutar-vos”. Disse o
Papa Francisco em Porto Maldonado na abertura oficial do Sínodo Especial para a
Amazônia em 18 de janeiro de 2018
3
.
A ênfase à escuta aos Povos Indígenas nas suas mais variadas línguas, etnias e
experiências culturais, nas florestas e nas cidades da Amazônia, foi constante em todo o
processo preparatório, durante a Assembleia Sinodal e no processo pós-sinodal. A frase
“precisamos escutar-vos” soou como um verdadeiro mandato do Papa Francisco para toda
a Igreja. Nas suas organizações internas e internacionais, os Povos Indígenas participaram
ativamente de todo o Processo Sinodal e revelaram seu entendimento e vivência da Ecologia
Integral como projeto de vida e de sociedade baseado no Bem Viver. Também ensinaram a
prática da sinodalidade,o cara ao Papa Francisco e a todo o colegiado da Assembleia Sinodal.
UMA RELEITURA DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2022 À LUZ DA SINODALIDADE
A Campanha da Fraternidade de 2022 objetivou “promover diálogos a partir da
realidade educativa do Brasil, à luz da cristã, propondo caminhos em favor do
humanismo integral e solidário”
4
. O desafio do diálogo é a base de toda a reflexão em torno
do tema e do lema da Campanha da Fraternidade 2022. Dialogar implica em saber escutar
e saber falar. Uma atitude depende da outra. Deixar os povos indígenas falar implica em
saber calar para os escutar numa atitude decolonial profunda. Escutar não é a atitude
principal da sinodalidade, palavra latina que significa caminhar juntos.
Este foi o fio condutor da Assembleia Sinodal e o caminho do discernimento sob a
orientação do Papa Francisco, para escutar a realidade, discernir os possíveis caminhos a
serem trilhados e promover ações que venham de encontro com as necessidades da região
pensada a partir das particularidades de seu bioma, da diversidade sociocultural de seus
povos e da posição estratégica que ela ocupa no planeta. A sinodalidade fundamenta-se na
Constituição Apostólica Episcopalis Communio sobre o Sínodo dos Bispos, lançada pelo
Papa Francisco em 2018, em pleno processo sinodal na Amazônia.
O Sínodo dos Bispos deve tornar-se cada vez mais um instrumento privilegiado
de escuta do Povo de Deus: Para os Padres sinodais, pedimos, do Espírito Santo,
antes de mais nada o dom da escuta: escuta de Deus, até ouvir com Ele o grito do
povo; escuta do povo, até respirar nele a vontade de Deus que nos chama. Por
isso, embora na sua composição se configure como um organismo
essencialmente episcopal, o nodo não vive separado do resto dos fiéis. Pelo
contrário, é um instrumento adequado para dar voz a todo o Povo de Deus
precisamente por meio dos Bispos, constituídos por Deus autênticos guardiões,
intérpretes e testemunhas da de toda a Igreja, mostrando-se de Assembleia
em Assembleia uma expressão eloquente da sinodalidade como dimensão
constitutiva da Igreja
5
.
3 O Sínodo da Amazônia começou em Puerto Maldonado. Amazônia: novos caminhos para a Igreja e por uma
ecologia integral. É um tema que contém poucas, mas significativas palavras que expressam o conteúdo e a finalidade
que levaram à convocação do Sínodo, e delinearam o primeiro encontro no Vaticano. Disponível em: https://
www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2018-04/sinodo-da-amazonia.html. Consultado em 20/07/2020.
4 Sobre a Campanha da Fraternidade 2022 “Fraternidade e Educação”. Disponível em: https://campanhas.cnbb.org.br/
sobre-a-campanha-da-fraternidade-2022.html. Acesso em 28/05/2022.
5 Papa FRANCISCO, Episcopalis communio: sobre o sínodo dos bispos, p.5-6.
OLIVEIRA, Márcia Maria de
A Campanha da Fraternidade 2022 e os desafios da Educação na Amania à luz do nodo Especial para a Amazônia
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.56-67, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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O processo sinodal, nesta perspectiva da sinodalidade proposta na Episcopalis
Communio, se baseia numa atitude permanente de escuta e discernimento, especialmente
daquela porção do Povo de Deus que foi negligenciada nos espaços de fala desde a
colonização. A Sinodalidade representa uma mudança de paradigmas nas relações de poder
da Igreja, na qual o bispo passa a ser ouvinte numa atitude permanente de escuta.
Entretanto, para escutar profundamente, é preciso calar e dar voz ao povo. Calar como
atitude interior de profunda aprendizagem.
A sinodalidade aponta para uma importante mudança no lugar de fala. Esta mudança
foi amplamente experimentada durante todo o processo sinodal, através dos diversos
instrumentos preparatórios que promoveram a escuta de pequenos grupos da
Comunidades Eclesiais de Base - CEBs, de grupos de mulheres, jovens, comunidades
indígenas, ribeirinhas, quilombolas, grupos de terreiro de matriz africana, grupos de
outras confissões religiosas, movimentos sociais, universidades, instituições internacionais
que atuam na Amazônia como parceiras na defesa dos direitos humanos e das questões
ecológicas
6
. Em clima de sinodalidade, foram realizados diversos seminários, inclusive no
âmbito acadêmico, fóruns de debate, mesas-redondas, rodas de conversas, em todas as
instâncias de participação coletiva da Igreja Católica na Pan-Amazônia e em outras regiões.
Enquanto metodologia, a sinodalidade coloca em debate modelos de participação
popular capazes de gerar processos profundos de transformação observados nas
experiências das Comunidades Eclesiais de Base nas décadas de 1980-1990 em toda Pan-
Amazônia. Nesta perspectiva, o sínodo continuidade ao processo de descolonização da
atuação pastoral da Igreja que passa pelo discurso e pelas práticas religiosas e pastorais.
Entretanto, trata-se de uma tarefa difícil, porque a descolonização implica também em
mudanças profundas no pensamento da Igreja. Acionada inúmeras vezes no Documento
Preparatório e no Instrumentum Laboris, a descolonização implica renunciar a valores
etnocêntricos que não respeitam as demais culturas e seus valores. Implica reconhecer os
saberes, as ciências e as espiritualidades de outros povos com suas línguas, costumes e
culturas. Em poucas palavras respeitar o outro na sua diferença e não o nivelar numa
cultura hegemônica como a proposta pelo capitalismo que não se encontra apenas no
aspecto econômico, mas, incide também com grande força na produção do pensamento, da
religião, da moral, da ética e da política. Descolonizar as práticas pastorais e o pensamento
religioso é um dos grandes desafios a que se propõe o Sínodo da Amazônia. O parágrafo 56
do Instrumentum Laboris afirma que
O desafio que se apresenta é grande: como recuperar o terririo amazônico,
resgatá-lo da degradão neocolonialista e devolver-lhe seu bem-estar
saudável e autêntico? Desde milhares de anos devemos às comunidades
abogenes o cuidado e o cultivo da Amazônia. Em sua sabedoria ancestral
cultivaram a convicção de que a criação inteira está interligada, o que merece
nosso respeito e responsabilidade. A cultura da Amazônia, que integra os
seres humanos com a natureza, se constitui como referente para construir um
novo paradigma da ecologia integral. A Igreja deveria assumir em sua missão
o cuidado da Casa Comum
7
.
No pensamento neocolonial, não nenhum entendimento de uma Casa Comum.
As casas são privadas. Tudo é propriedade privada e cada um cuida do que é seu, e
6 Os relatórios dos diversos grupos, movimentos sociais, organismos pastorais, dioceses e prelazias foram
sistematizados pela Rede Eclesial Pan-Amazônica - REPAM, num documento denominado Síntese das Escutas do
Processo Sinodal. Este documento sinaliza a participação direta de cerca de 100 mil participantes na primeira fase do
processo sinodal de junho a dezembro de 2018. Estão disponíveis para consulta no site da REPAM (http://
repam.org.br/wp-content/uploads/2019/07/Hacia-el-Sinodo-Panamazonico_Libro-digital-Ultimo.pdf.).
7 Papa FRANCISCO, Instrumentum Laboris - Documento de Trabalho do Sínodo Especial para a Amazônia, p.23.
OLIVEIRA, Márcia Maria de
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ninguém se preocupa com a casa de ninguém. Pensar a Casa Comum implica em mudar
drasticamente o pensamento neocolonialista e passar a pensar e encarar coletivamente os
problemas que afetam toda sociedade como a questão ambiental, a fome, a miséria e o
empobrecimento de sociedades inteiras. Pensar juntos e buscar saídas coletivas é o grande
desafio. Mas, para isso, é preciso descolonizar o pensamento etnocêntrico. No artigo 76 o
Instumentum Laboris aprofunda o tema da família e seus desafios na Amazônia e afirma que
Na Amazônia a família foi vítima do colonialismo no passado e de um
neocolonialismo no presente. A imposição de um modelo cultural ocidental
inculcava um certo desprezo pelo povo e pelos costumes do território
amazônico, e chegava-se a qualificá-los como “selvagens”, ou “primitivos”.
Atualmente, a imposição de um modelo econômico ocidental extrativista volta
a atingir as famílias, invadindo e destruindo suas terras, suas culturas e suas
vidas, forçando-as a migrar para as cidades e suas periferias
8
.
Nessa perspectiva, a ruptura com o pensamento neocolonial é fundamental para se
repensar a Amazônia. Em muitas críticas que se tecem contra o Sínodo, seus arguidores
continuam denominando os povos da Amazônia como “selvagens”, ou “primitivos” da
mesma forma que os colonizadores mais de quinhentos anos atrás. A permanência
destes vocábulos comprova que o pensamento neocolonial impede o avanço das ideias e
mantém seus seguidores atrasados no tempo e na história. O parágrafo 103 do Instumentum
Laboris apresenta o colonialismo relacionado com a
Mentalidade economicista-mercantilista, consumismo, utilitarismo,
individualismo, tecnocracia, cultura do descarte. Uma mentalidade que se
expressou historicamente em um sistema de domínio territorial, político,
econômico e cultural que persiste de várias formas até os dias de hoje,
perpetuando o colonialismo. Uma economia baseada exclusivamente no lucro como
única finalidade, que exclui e atropela os mais fracos e a natureza, se constitui
como ídolo que semeia destruição e morte. Uma mentalidade utilitarista concebe
a natureza como mero recurso e os seres humanos como simples produtores-
consumidores, violando o valor intrínseco e a relacionalidade das criaturas. O
individualismo enfraquece os vínculos comunitários, ofuscando a
responsabilidade em relação ao próximo, à comunidade e à natureza. O
desenvolvimento tecnológico trouxe grandes benefícios para a humanidade mas,
ao mesmo tempo, sua absolutização levou-o a ser um instrumento de posse,
domínio e manipulação (cf. LS 106) da natureza e do ser humano. Tudo isto gerou
uma cultura global predominante, a qual o Papa Francisco chamou “paradigma
tecnocrático” (LS 106). O resultado é uma perda do horizonte transcendente e
humanitário, onde se transmite a lógica do “usa e joga fora” (LS 123), gerando uma
cultura do descarte (LS 22) que agride a criação
9
.
Em muitas outras ocasiões, o Instumentum Laboris apresenta o desafio da
descolonização da Igreja e do pensamento hegemônico para se avançar na proposta do
cuidado com a Casa Comum na perspectiva da Ecologia Integral como condição para se
repensar os caminhos da “Igreja com rosto amazônico”. A grande maioria dos Bispos da
Pan-Amazônia tem levado isso muito a sério e vem aprofundamento a temática da
descolonização em suas bases pastorais e elaborando propostas para se materializar a
descolonização nas suas práticas e no pensamento teológico e eclesial.
Descolonizar o pensamento e as práticas é deixar-se amazonizar
10
com outros valores
8 Papa FRANCISCO, Instrumentum Laboris - Documento de Trabalho do Sínodo Especial para a Amazônia, p.30.
9 Papa FRANCISCO, Instrumentum Laboris - Documento de Trabalho do Sínodo Especial para a Amazônia, p.30.
10 Amazonizar foi uma expressão ou neologismo recuperada nas escutas sinodais e passou a ser utilizada para explicar a
mudança de paradigmas com relação à Amazônia. Amazoniza-te foi tema de uma intensa campanha da REPAM no
processo pós-sinodal que mobilizou muitos setores da sociedade em favor da Amazônia e de seus povos. Disponível
em: https://repam.org.br/tag/amazoniza-te/
OLIVEIRA, Márcia Maria de
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e conhecer e experimentar outras possibilidades de convivência com a Amazônia sem
necessariamente destruir suas riquezas naturais, fonte de vida e esperança para seus povos
e para toda humanidade.
De forma pedagógica, as diversas formas de reflexão e formação proporcionadas
durante a escuta sinodal contribuíram para se conhecer melhor a Amazônia, o modo de ser
e de viver de seus povos, com seus recursos de uso coletivo compartilhados num modo de
vida não capitalista adotado e assimilado milenarmente. Desta forma, o processo sinodal
reconheceu a espiritualidade e a sabedoria dos povos dessa imensa região, de modo
especial dos Povos Indígenas, e entrou num processo de aprendizado mútuo e contínuo de
discernimento para uma conversão pastoral e ecológica, apresentada como grande
horizonte no Instrumentum Laboris, o documento de Trabalho da Assembleia Sinodal que
levou a Roma os clamores e a presença viva destes povos em marcha de libertação, tendo
em vista os novos caminhos para uma Igreja com Rosto Amazônico
11
.
A CAMPANHA DA FRATERNIDADE E AS LIÇÕES DA AMAZÔNIA
A Campanha da Fraternidade de 2022 foi impulsionada pelo Pacto Educativo
Global, convocado pelo Papa Francisco
12
. Quando da sua convocação, o Papa Francisco
insiste num projeto de educação humanizada que contribua na formação de pessoas
abertas, integradas e interligadas, que também sejam capazes de cuidar da casa comum,
numa referência aos desafios apresentados na Encíclica Laudato Sì
13
: “a educação será
ineficaz e os seus esforços estéreis se não se preocupar também em difundir um novo
modelo relativo ao ser humano, à vida, à sociedade e à relação com a natureza”.
A educação humanizada proposta no pacto educativo pode ser perfeitamente
reinterpretada como a educação popular amplamente praticada na Amazônia nos
pequenos grupos populares que se reúnem para aprofundar a Palavra de Deus a partir dos
desafios da realidade contextual. Foi essa metodologia que orientou uma infinidade de
rodas de conversas ou círculos populares, de diversos grupos em suas comunidades,
pastorais, paróquias ou dioceses, com espaço para conversar, rezar e celebrar suas lutas e
identidades culturais. Esta dinâmica contribuiu para reconhecer as lutas e resistências dos
Povos da Amazônia que enfrentam mais de 500 anos de opressão e colonização com
projetos desenvolvimentistas pautados na exploração desmedida e na destruição da floresta
e dos recursos naturais.
Apesar da Campanha da Fraternidade não enfatizar a importância da Educação
Popular no itinerário do Pacto Educativo Global, os grupos das Comunidades Eclesiais de
Base espalhados em toda a Amazônia, sabem o seu valor quando se reúnem para debater
suas dificuldades e buscar caminhos de superação dos seus sofrimentos. São saberes
necessários à prática educativa fundamentada na proposta de Freire ao afirmar que
“ensinar não é transferir a inteligência do objeto ao educando, mas instigá-lo no sentido de
que, como sujeito cognoscente, se torne capaz de inteligir e comunicar o inteligido”
14
.
Novamente o desafio da escuta como observação, contemplação, internalização, o
que exige silêncio profundo e abertura para o aprendizado. O texto base da Campanha da
Fraternidade 2022 insiste “que se trata de uma campanha que, mais do que abordar outro
11 Márcia Maria OLIVEIRA, Desaos e perspectivas do processo de preparação do Sínodo Especial para Amazônia, p.10.
12 No dia 15 de outubro de 2020 o Pacto foi lançado no Vaticano e, desde então, todo o globo tem se mobilizado para
discutir, mobilizar e tornar o pacto algo concreto em nossas políticas educacionais e institucionais. Disponível em:
https://anec.org.br/acao/pacto-educativo-global/. Acesso em 25/05/2022.
13 Papa FRANCISCO, Carta Encíclica Laudato Si’: sobre o cuidado da casa comum, p.163-164.
14 Paulo FREIRE, Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, p.134.
OLIVEIRA, Márcia Maria de
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aspecto específico da problemática educacional, vai refletir sobre os fundamentos do ato de
educar na perspectiva católico-cristã”. Dessa forma, a educação é compreendida não apenas
com um ato escolar, mas, acima de tudo, como uma ação transformadora de toda a sociedade.
Assim, a Educação Popular reúne as mais variadas tradições críticas latino-
americanas para apresentar uma proposta educacional e pedagógica para toda a sociedade
comprometida com a construção de uma realidade mais justa e sem desigualdades sociais e
econômicas excludentes. Nesse sentido, buscam formar seres humanos comprometidos
com a construção do respeito às diferenças em seus diferentes cenários de ação, revelando
desigualdades e iniquidades e dispostos a refundar a democracia a partir de identidades
locais. Com os grupos sociais, além de tudo o que se faz, a educação popular concebida e
ensinada por Paulo Freire é uma importante orientação para a aprendizagem ao longo da
vida, o que implica, entre outras metodologias, a multiplicação de agentes sociais
comprometidos com a transformação social.
Da Amazônia brasileira, a herança intelectual do jesuíta Claudio Perani
15
desenvolveu juntamente com lideranças populares, de forma didática e objetiva, os
'Cadernos Populares', subsídios didáticos que representam o reconhecimento da
capacidade interpretativa de lideranças sociais com o objetivo de promover
transformações sociais em conjunto com os setores populares.
No itinerário da sinodalidade, o sínodo especial para a Amazônia foi uma resposta
do Papa Francisco às demandas das conferências episcopais dos países Pan-Amazônicos:
Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname, Venezuela e Guiana
Francesa. Os bispos destes nove países formaram o Conselho Sinodal que contou ainda
com a presença de outros cardeais convidados pelo Papa Francisco para contribuírem com
o debate e com especialistas em temas relacionados às questões centrais do Sínodo
16
. Quem
presidiu todo o processo sinodal até a Assembleia foi o Papa Francisco utilizando-se de
uma metodologia que é eminentemente participativa baseada na Colegialidade. Nesta
perspectiva, Ulloa e Lopes
17
salientam que,
A proposta de Francisco amplia a compreensão do Sínodo como participação
característica do colégio episcopal na solicitude pastoral universal e empenho
missionário (CD 5; AG 29). Sem desconfigurar a instituição canônico-pastoral
do Sínodo dos Bispos, o Papa, com o uso do termo sinodalidade, propõe uma
atitude a ser assumida por todo o corpo eclesial, ou seja, uma disposição
permanente de sinergia, do esforço de caminhar juntos.
Orientadas pela metodologia da sinodalidade, todas as dioceses dos nove países da
Pan-Amazônia realizaram inúmeras atividades em preparação às Assembleias Territoriais
que recolheram e sistematizaram, de forma transparente e participativa, inúmeros
relatórios das mais diversificadas atividades que promoveram ampla participação de toda
comunidade católica neste processo denominado pelo documento preparatório de “escuta
sinodal” conforme prevê o Art. 6 - Consulta do Povo de Deus, da Constituição Apostólica
Episcopalis communio
18
.
15 Padre Cláudio Perani e a Educação Popular na Amazônia. https://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/615483-padre-
claudio-perani-e-a-educacao-popular-na-amazonia.
16 Participei neste grupo na qualidade de “expert” ou perita, para contribuir com reflexões sobre o tema das migrações,
refúgio e crescimento das cidades na Amazônia com todos os desafios pastorais que estes temas implicam. Fui a
única mulher leiga nesse grupo.
17 Boris Agustín Nef ULLOA e Jean Richard LOPES, Sinodalidade, caminho de comunhão e unidade, segundo Atos dos
Apóstolos, p.207.
18 Papa FRANCISCO, Episcopalis communio: sobre o sínodo dos bispos, p.19.
OLIVEIRA, Márcia Maria de
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Por isso, embora na sua composição se configure como um organismo
essencialmente episcopal, o nodo não vive separado do resto dos fiéis. Pelo
contrário, é um instrumento adequado para dar voz a todo o Povo de Deus
precisamente por meio dos Bispos, constituídos por Deus “autênticos
guardiões, intérpretes e testemunhas da de toda a Igreja”, mostrando-se de
Assembleia em Assembleia uma expressão eloquente da sinodalidade como
dimensão constitutiva da Igreja.
Praticamente todo o quinto capítulo do Documento Final da Assembleia Sinodal
dedica-se ao aprofundamento do tema da sinodalidade numa perspectiva de itinerário
metodológico e pastoral que pressupõe instaurar nas igrejas particulares um estilo de vida
inspirado na sinodalidade e na Ecologia Integral. Isso significa romper com estruturas
rígidas e inaugurar outras metodologias pastorais mais leves e participativas, comprometidas
com a revelação de Deus na caminhada do povo. Nessa perspectiva, a sinodalidade
experimentada no processo sinodal implica em mudanças profundas na estrutura de toda
igreja, e não apenas na Amazônia. A este respeito, Ulloa e Lopes, assinalam que,
A sinodalidade caracteriza-se, segundo Atos dos Apóstolos, na convicção de que
a presença do Ressuscitado é atualizada pelo Espírito Santo no caminho das
comunidades desde Jerusalém até os confins do mundo (cf. At 1,8). É o Espírito
que qualifica a vida de todos os batizados para, no exercício da
corresponsabilidade e da participação, responderem juntos, fiéis e pastores,
com coerência ao chamado do Senhor. Por isso, a experiência da sinodalidade
será sempre um caminho aberto que exigirá da Igreja, em todos os tempos, a
coragem de viver, na história, um testemunho maduro e dinâmico capaz de ser
sinal de comunhão e unidade
19
.
De acordo com as características observadas pelos referidos autores, o Sínodo
Especial para a Amazônia exercitou a sinodalidade em todo o seu processo preparatório e,
de modo especial, durante a Assembleia Sinodal. Ao mesmo tempo, o processo sinodal
apresentou elementos concretos de uma Igreja em saída, propostos em Medellín e Puebla.
A este respeito, Sbardelotti afirma que,
A Teologia Latino-Americana e Caribenha é construída com e por rias os,
com e por vários rostos; bebendo do po dablia a partir de uma leitura popular,
por um lado, e de uma pesquisa acadêmica abundante e perseguida por outro;
bebendo do poço do Concílio Ecunico Vaticano II, do Pacto das Catacumbas da
Igreja Servidora e Pobre, dos rtires da Caminhada, da atualização do Vaticano II
pela Confencia de Medellín e pela Opção pelos Pobres na Conferência de Puebla.
Em sintonia com a Igreja em Saída sugerida e querida pelo Papa Francisco,
sementes estão sendo lançadas neste co adubado com o sangue de mulheres e
homens, que, no seguimento a Jesus de Nazaré, assumem, sem medo, todos os riscos
e consequências, o testemunhas fiéis do que pede o Evangelho, são herdeiros de
uma pedagogia e de uma prática libertadora
20
.
Fiel ao itinerário da sinodalidade, a ‘Igreja Servidora e Pobre’ caracterizada no
quinto capítulo do Documento Final da Assembleia Sinodal, caminha com os pobres e vai
assumindo na Amazônia o compromisso com as causas indígenas e camponesas, com os
pobres das periferias das grandes cidades que concentram cerca de 83% da população, com
os migrantes expulsos de seus países e territórios, com as mulheres. A metodologia
participativa foi caracterizada pelo debate em torno da busca coletiva dos ‘novos caminhos
para a Igreja e para uma ecologia integral’, tema central do Sínodo
21
.
19 Boris Agustín Nef ULLOA e Jean Richard LOPES, Sinodalidade, caminho de comunhão e unidade, segundo Atos dos
Apóstolos, p.218.
20 Emerson SBARDELOTTI, De Medellín a Puebla: uma Igreja em Saída, p.7.
21 Márcia Maria OLIVEIRA, Desaos e perspectivas do processo de preparação do Sínodo Especial para Amazônia, p.13.
OLIVEIRA, Márcia Maria de
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Os itinerários da sinodalidade retomam as orientações de uma ecoteologia encarnada
na vida e na história do povo da Amazônia e materializa a experiência da sinodalidade com
bases e fundamentos nas Sagradas Escrituras nas quais, “a sinodalidade é expressa por meio
de uma construção literário-teológica, que reflete e estimula uma práxis, um modo de ser e
agir. A experiência blica, portanto, chama o leitor, individual e coletivamente, a uma
inserção progressiva e permanente no caminho, ao longo do qual Deus se revela
22
.
A ecoteologia representa parte da materialização da proposta do Papa Francisco na
Ecologia Integral apresentada para toda Igreja na Encíclica Laudato Sí publicada em 2015. A
Ecologia Integral foi o tema transversal do Sínodo da Amazônia, do Documento Final e da
Encíclica Querida Amazônia. Os “novos caminhos para a Igreja e para uma Ecologia
Integral” desafiaram e continuam desafiando o Povo de Deus na Amazônia a apresentar
para toda a Igreja Universal um novo rosto que se configura nos rostos diversos dos povos
indígenas, das mulheres, dos migrantes, dos jovens, dos pobres e excluídos na Amazônia.
Na sua Exortação Apostólica Pós-Sinodal ‘Querida Amazônia’ o Papa Francisco
reconhece e confirma que o Sínodo para a Amazônia inaugura um novo tempo para a toda
Igreja. Tempo do escutar, refletir e agir, pois “a Amazônia arde em chamas e não pode
mais esperar”, afirma o documento. De forma didática, a Querida Amazônia apresenta um
diagnóstico preciso e completo dessa imensa região considerada uma das mais complexas,
diversificadas e desafiadoras regiões do mundo, ameaçada pela cobiça e ganância de
interesses internos e internacionais. Uma região com seus recursos hídricos, florestais e do
subsolo, em permanente exploração desde a colonização, o que culmina com a destruição
de povos, culturas e saberes ancestrais.
Didática e pedagogicamente organizada em quatro grandes eixos, Querida
Amazônia’ debate e propõe quatro sonhos na vida de toda Igreja:
Sonho com uma Amazónia que lute pelos direitos dos mais pobres, dos povos
nativos, dos últimos, de modo que a sua voz seja ouvida e sua dignidade
promovida.
Sonho com uma Amazónia que preserve a riqueza cultural que a caracteriza e
na qual brilha de maneira tão variada a beleza humana.
Sonho com uma Amazónia que guarde zelosamente a sedutora beleza natural
que a adorna, a vida transbordante que enche os seus rios e as suas florestas.
Sonho com comunidades cristãs capazes de se devotar e encarnar de tal modo
na Amazónia, que deem à Igreja rostos novos com traços amazónicos (QA 7).
Estes quatro sonhos desafiam a um permanente exercício da sinodalidade, que é a
dimensão de comunhão participativa de toda a Igreja atenta e disposta a escutar a realidade,
discernir os possíveis caminhos a serem trilhados e promoverões que venham de encontro
com as necessidades da região pensada a partir das particularidades de seu bioma, da
diversidade sociocultural de seus povos e da posição estratégica que ela ocupa no planeta.
A INSPIRAÇÃO QUE VE M DOS POVOS INDÍGENAS
Para as lideranças indígenas que participaram do processo sinodal o fato de
retomaram o lugar de fala proposto pelo Papa Francisco “veio confirmar a nossa
participação nas comunidades e respeitar nossa maneira de ser igreja na Amazônia com
nossa espiritualidade de respeito para com a criação, para com os ancestrais, para com as
crianças”, fala orgulhosa a senhora Madalena, catequista do Povo Indígena Macuxi da
Terra Indígena Raposa Serra do Sol em Roraima.
22 Boris Agustín Nef ULLOA e Jean Richard LOPES, Sinodalidade, caminho de comunhão e unidade, segundo Atos dos
Apóstolos, p.207.
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Para muitas lideraas indígenas, uma das maiores vitórias do processo sinodal foi o
reconhecimento dos povos indígenas que vivem nas cidades da Amazônia. Foi o que
constatou Marcivana Sateré-Mawé, a jovem der indígena que participou da Assembleia
Sinodal na qualidade de Auditora. Marcivana reconhece a importância da participação na
Assembleia Sinodal para todos os povos indígenas que ela representa, mas, de modo especial
para a mulheres que atual como lideranças na linha de frente do movimento indígena, nas
organizações locais, regionais e internacionais e destaca o protagonismo de mulheres como
Sônia Guajajara, liderança da APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil),
que é mãe, Nara Baré, que está na coordenação da COIAB (Coordenação das
Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), eu que estou à frente
atualmente da COPIME (Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e
Entorno), tantas outras lideranças mães que estão à frente das nossas
organizações locais, mães que se juntam para fortalecer uma luta
23
.
A professora Enestina, do Povo Macuxi, também esteve em Roma durante a
Assembleia Sinodal para representar o seu povo nas atividades da Tenda da Casa Comum
24
e destaca a importância do Sínodo para os Povos Indígenas que “se sentiram acolhidos e
respeitados pelo Papa Francisco e por toda a Igreja que historicamente os ignorou”. Ao
mesmo tempo, a professora recorda que “muita gente veio de longe, da Alemanha, da
Suíça, da Bélgica, da França e de tantos outros lugares, para nos perguntar como é nossa
vida nas nossas comunidades. Eu fiquei muito feliz de saber que tem muita gente,
especialmente os jovens que querem conhecer nosso modo de viver nas nossas
comunidades”. A professora e catequista lamenta “que ainda tem tanta gente que não
reconhece o nosso valor. Mas, o Sínodo reconheceu o nosso valor
25
.
Elves Ramires, do Povo Warao, um dos milhares de indígenas venezuelanos em
deslocamento residindo na periferia de Boa Vista, recorda que “durante a preparação para
o Sínodo nós participamos de muitas atividades na comunidade e foi bonito como nos
deixaram falar. As pessoas da comunidade pareciam curiosas para saber da nossa vida. Pela
primeira vez me senti acolhido e respeitado como indígena e como cristão em Boa Vista”.
O jovem recorda que a maioria dos warao são católicos e que acreditam que “o Sínodo veio
trazer esperança para os povos indígenas da toda a América Latina”. Desta forma
reconhece a abrangência do Sínodo da Amazônia.
Estas e muitas outras narrativas revelam que os povos indígenas realmente
assumiram o lugar de fala no processo sinodal e que a igreja passou a ter maior atenção e
escuta a estes povos silenciados desde a colonização. Escutar os povos indígenas é um
passo importante num processo importante de descolonização das práticas e discursos
pastorais ainda muito marcados pelo neocolonialismo. De modo especial os povos
indígenas abriram caminhos importantes para compartilhar suas diversas experiências de
espiritualidade, de organização social e política, de vida comunitária baseada na
simplicidade e na partilha.
23 Ser mãe no mundo indígena. Entrevista concedida ao Padre Modino e a Silvonei José Vatican News. Disponível
em:https://www.vaticannews.va/pt/mundo/news/2021-05/ser-mae-no-mundo-indigena.html. Consultado em:
20/06/2021.
24 Espaço inspirado na experiência da Tenda dos Mártires organizada na Conferência de Aparecida (2007). Em Roma, a
‘Tenda Casa Comum’ teve lugar nas imediações da Igreja de Santa Maria em Traspontina, (Via della Conciliazione,
próximo à Praça São Pedro) em salas colocadas à disposição pelos padres Carmelitas responsáveis pela paróquia
romana. A Tenda não foi um espaço alternativo, mas esteve conectado ao Sínodo, que se realizou de 6 a 27 de
outubro, para ajudar os padres sinodais a se manterem em sintonia com a realidade do território amazônico e com
toda a reflexão sobre a missão na região. Disponível em: https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2019-06/
tenda-casa-comum-apresentada-jaime-patias-consolata.html.
25 Fala da professora Enestina Macuxi por ocasião da apresentação do documento Final na Diocese de Roraima no
início de dezembro de 2019.
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Por fim, a sinodalidade experimentada pelos Povos Indígenas abre novos horizontes
de compromisso e comprometimento de toda Igreja com a causa indígena. Desde a
colonização os povos indígenas seguem tão ameaçados, mas, ao mesmo tempo,
representam um testemunho de luta e resistência que faz recordar a vida dos primeiros
cristãos e dos mártires.
Escutar os povos indígenas, conhecer seu modo de vida e reconhecer seu lugar na
igreja representa um convite à conversão ampla e profunda que questiona os padrões
culturais, econômicos e sociais, o modo de vida capitalista que vem tomando conta de toda
a sociedade com suas formas de produção e consumismo exacerbado, de acumulação do
lucro e das riquezas, de obsolescência, de desperdício e da produção descontrolada do lixo
material e humano.
Num caminho sem volta, o Sínodo Especial da Amazônia apresentou os povos
indígenas para toda a igreja que se sentiu profundamente interpelada a conhecer seus
sofrimentos históricos, a reconhecer sua diversidade cultural e sua espiritualidade como
grandes valores a serem compartilhados com toda a Igreja. Ao mesmo tempo, na
perspectiva da sinodalidade, a Igreja reconhece e abraça a luta dos Povos Indígenas em
defesa da Amazônia e os respeita como verdadeiros “guardiões da floresta”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como Igreja, ainda temos muito que aprender e reaprender com os Povos Indígenas
nos itinerários da Sinodalidade. Entretanto, o Sínodo da Amazônia foi um passo
importante que nos preparou para seguir em passos firmes no sentido de reconhecer e
conferir aos agentes pastorais e catequisas, nas mais diversas realidades indígenas, os
ministérios que lhes permitam acesso à Eucaristia como um direito, a condução das
celebrações, o governo e a coordenação de suas comunidades.
Deveras, o Sínodo Especial para a Amazônia representa um modelo de descolonizão
em diversos aspectos. Desde o calar-se para ouvir todos os clamores da Amazônia até a
participação ativa e efetiva das mulheres, dos leigos e leigas e dos povos indígenas na
Assembleia Sinodal, o Sínodo se converteu em uma inspiração para toda a Igreja.
Conclui-se que o processo sinodal foi apenas uma etapa importante da história da
Igreja na Amazônia, mas, indica que os desafios estão por vir no processo pós-sinodal que
implica na aplicação dos resultados das reflexões teológicas e pastorais. Esta nova etapa
promete mudanças importantes não somente para a Igreja da Amazônia, mas, para a Igreja
como um todo. Por fim, o Sínodo reforça a importância da Amazônia para o mundo e, ao
mesmo tempo, desperta a sociedade para atuar em sua defesa e assumir as causas de seus
povos que a vivenciam na perspectiva da Casa Comum.
REFERÊNCIAS BIBLI OGRÁFICAS
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 7ª ed. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1998.
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A Campanha da Fraternidade 2022 e os desafios da Educação na Amania à luz do nodo Especial para a Amazônia
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.56-67, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
67
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Temáticos, Contribuciones.
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Revista Eletrônica Espaço Teológico. Vol. 13, n.24, jul/dez 2019 (p.7-21).
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segundo Atos dos Apóstolos. São Paulo: Revista de Cultura Teológica, Ano XXVII, n.94, Jul/Dez 2019
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OLIVEIRA, Márcia Maria de
A Campanha da Fraternidade 2022 e os desafios da Educação na Amania à luz do nodo Especial para a Amazônia
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.56-67, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
NEGRAS MULHERES E MULHERES
DA BÍBLIA
trajetória de lutas e resistência por uma
educação antirracista
BLACK WOMEN AND WOMEN OF
THE BIBLE
rajectory of struggles and resistance for
an anti-racist education
Ana Maria da Rosa Prates*
Francisca Izabel Da Silva Bueno**
Marcio Luiz de Oliveira***
Resumo: O presente artigo aborda a trajetória de lutas e resistência das
mulheres negras na sociedade brasileira na perspectiva de implementação
de uma educação antirracista na escola e na academia. Trata-se de uma
reflexão sobre a existência do racismo que se faz presente no ambiente
escolar e na sociedade brasileira e indica a necessidade urgente de se pensar
práticas pedagógicas para combater posturas racistas e discriminatórias.
Para tal, utilizamos nossa própria trajetória no movimento de mulheres
negras e experiências profissionais como professoras e hoje discentes do
mestrado e doutorado do PPGEdu/UPF. Para elaborar o artigo foi
realizada uma revisão de literatura visitando as legislações que se referem à
educação das relações étnico raciais, bem como autores que se posicionam
na luta em defesa de uma educação antirracista: Gomes (2008, 2011),
Hooks (2017), Munanga (2006), Silva (2004). Na construção buscamos a
interação com algumas mulheres retratadas na bíblia que mostraram aos
seus pares a necessidade da vida em liberdade sendo referência para outras
mulheres. Na época souberam resistir e agir com coragem e criatividade
diante das ameaças à vida do seu povo. O olhar está no passado e também
nas referências atuais. O artigo está organizado em quatro seções: a
primeira parte inicia sob o título Lutas e resistência das mulheres, a
segunda parte, intitulada Lutas e resistências das mulheres da Bíblia, a
terceira parte sob o título Educação antirracista: tão perto de chegar, mas
longe de enxergar e na quarta e última parte apresenta Uma mística bíblica
antirracista: caminho se faz caminhando.
Palavras Chaves: Negras Mulheres. Mulheres da Bíblia. Lutas. Resistência.
Educação antirracista.
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 68-80, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.87
* Professora de História, Diretora de escola
da rede pública estadual de ensino em Passo
Fundo - RS. Associada da Associação
Brasileira de Pesquisadores Negros/ABPN.
Ativista do movimento de Mulheres Negras
ACMUN-RS. Integrante do projeto de
extensão “UPF: Educação das relações étnico-
raciais". Doutoranda do Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade de
Passo Fundo (UPF). Mestre em História pela
Universidade de Passo Fundo (UPF).
Especialista em Gestão Escolar pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul e
Especialista em Educação de Jovens e Adultos
e PROEJA pelo Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-
grandense (IFSUL) Passo Fundo- RS.
Graduada em História pela Universidade de
Passo Fundo (UPF).
E-mail: anamariadarosaprates@gmail.com
https://orcid.org/0000-0003-4250-0081
** Professora, orientadora educacional da
rede pública estadual de ensino em Passo
Fundo - RS. Atualmente Formadora-Trilha
Antirracista-SEDUC/RS. Associada da
Associação Brasileira de Pesquisadores
Negros/ABPN. Ativista do movimento de
Mulheres Negras ACMUN-RS. Integrante do
projeto de extensão UPF: “UPF: Educação das
relações étnico-raciais”. Mestranda do
Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade de Passo Fundo (UPF)
Especialista em Supervisão e Orientação
Escolar pela Universidade Regional Integrada/
URI-Campus Erechim-Rs. Especialista em
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
Abstract: This article addresses the trajectory of a struggles and resistance
of black women in Brazilian society from the perspective of implementing
an anti-racist education in school and academy. It is a reflection on the
existence of racism that is present in the school environment and in
Brazilian society and indicates the urgent need to think about pedagogical
practices to combat racist and discriminatory attitudes. To this end, we use
our own trajectory in the black women´s movement and professional
experiences as teachers and today students of the master and doctorate
courses at PPGEdu/UPF. For the article to be prepared, a literature review
as carried out visiting the laws that refer to the education of ethnic-racial
relations, as well as authors who stand in struggle in defense of anti-racist
education: Gomes (2008, 2011), Hooks (2017), Munanga (2006) e Silva
(2004). In the construction, we sought interaction with some women
portrayed in the Bible who showed their peers to need for life in freedom,
being a reference for other women. At the time, they knew how to resist
and act with courage and creativity in the face of threats to the lives of
their people. The look is the past and also in the current references. The
article is organized into four sections: the first part begins under the title
Women´s struggles and resistance; the second part, entitled Struggles and
resistances of women in the Bible; the third part, under the title Anti-
racist education: so close to arrive, but so far from seeing and in the fourth
and last part presents An anti-racist biblical mystique: the path is made by
walking.
Keywords: Black Women. Women of the Bible. Struggles. Resistance.
Education. Anti-racist.
Direitos Humanos e Educação Instituto de
Filosofia Berthier -IFIBE/Passo Fundo- RS.
Licenciatura Plena em Biologia/UNIJUI-
Universidade Regional do Noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul Ijuí-RS.
Graduada em Ciências/UNICRUZ-
Universidade de Cruz Alta - RS.
E-mail: francisca.bueno566@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-1209-8485
* Professor, biblista, membro do Centro
Ecumênico de Estudos Bíblicos em Feira de
Santana, Bahia. Atualmente encontra-se na
Coordenação de Extensão da Faculdade
Católica de Feira de Santana, Bahia. Bacharel
em Teologia pela Faculdade Católica de Feira
de Santana - FCFS), licenciado em Filosofia
pela Faculdade Batista Brasileira FBB e
especialista em Hermenêutica Bíblia pela
Universidade Católica de Pernambuco
UNICAP. É professor na Faculdade Católica
de Feira de Santana na área de Teologia
Bíblica. Tem experiência de ensino e pesquisa
em História de Israel, Livros Históricos,
Literatura Profética, Apócrifos da Bíblia,
Bíblia e Literatura e Leitura Popular da
Bíblia.
E-mail: lomarcio7@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-9060-8815
Recebido em 15/12/2022
Aprovado em 23/05/2022
A voz da minha bisavó ecoou [...]
A voz de minha avó/ ecoou obediência[...]
A voz de minha mãe/ ecoou baixinho revolta [...]
A minha voz ainda ecoa versos perplexos[...]
A voz de minha filha/ recolhe todas as nossas vozes/
recolhe em si as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.
A voz de minha filha recolhe em si a fala e o ato.
Vozes Mulheres, de Conceição Evaristo
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Tecer a nossa trajetória de lutas e resistência de negras
mulheres, que buscam romper com o silenciamento e a invisibilidade
impostos ao longo da história brasileira, por uma estrutura
escravocrata, é o objetivo deste artigo. Grande parte das riquezas
deste país construiu-se e ainda se constrói com o trabalho de pessoas
que foram arrancadas de suas terras e escravizadas em terras
brasileiras da pior forma possível. Neste processo de escravização
perderam grande parte de sua condição de humanos, mas nunca
deixaram de resistir e lutar pela sua liberdade, pelos seus direitos e
pelas condições de vida digna. Neste processo desenvolveram saberes
e práticas de lutas de resistência contra todos os tipos de opressão,
especialmente a escravidão e o racismo.
Para compreendermos as razões e as referências
epistemológicas dessas lutas, precisamos retomar o passado e buscar
70
as suas fontes. Pensar e conhecer o passado é condição para se transformar o presente.
Segundo Bakhtin
1
,
um diálogo com o grande tempo é falar do presente levando em consideração o
passado, pois nascemos num tempo presente, mas não nos alimentamos apenas
de sua atualidade. Não se vive nos séculos posteriores se não se impregnou, de
alguma maneira, dos séculos anteriores.
As mulheres negras sempre tiveram um trabalho importante na história de
construção da cultura deste país, mas demoraram e ainda demoram a serem reconhecidas e
ouvidas. É urgente refletirmos e valorizarmos a presença das mulheres negras que
historicamente produzem insurgência contra o modelo dominante e a exploração de sua
condição de mulher negra.
Um dos campos de luta da mulher negra é pelo seu espaço na escola, na academia,
enfim, no desenvolvimento da cultura em geral e da cultura científica. A feminista Lélia
Gonzalez
2
, nos uma perspectiva interessante quando critica a hierarquização de saberes
como produto da classificação racial da população. Ou seja, para ela, quem possui o
privilégio social possui o privilégio epistêmico, uma vez que o modelo valorizado e
universalmente considerado de ciência é o dos grupos sociais dominantes, geralmente
formado por homens e homens brancos. A consequência dessa hierarquização é a
legitimação como superior da concepção epistemológica, eurocêntrica ou norte americana.
Trata-se de uma cultura que não esconde seu viés machista e racista, especialmente contra
a cultura feminista e negra. Isso vem conferindo ao pensamento moderno ocidental a
exclusividade do que seria conhecimento valido, estruturando-o como dominante e, assim,
inviabilizando outras experiências do conhecimento. A autora afirma que o racismo se
constitui “como a ciência da superioridade euro cristã branca e patriarcal”. Esta reflexão
nos uma pista: quem pode falar ou não, quais saberes /vozes são legítimos e quais
saberes devem ser calados ou menosprezados.
Nesta perspectiva, também queremos nos aproximar e buscar luzes no texto bíblico.
Mas como estabelecer caminhos de libertação a partir da Bíblia se, justamente, esta foi
usada como instrumento de dominação dos corpos negros e, mais ainda, dos corpos
negros femininos? Uma leitura histórico-crítica da Bíblia, com chave contextual e
libertadora, precisa nos ajudar a encontrar neste livro controverso “alimento capaz de
sustentar as lutas e esperanças”
3
das mulheres negras hoje, dentro e fora do ambiente
religioso cristão, o qual tem a Bíblia como fonte e luz do caminho.
A proposta do texto é analisar, partindo de referências bibliográficas, quais são os
limites e as potencialidades de se pensar novas epistemologias sustentadas na cultura negra
e na experiência da mulher negra e iluminar esse caminho com a leitura da mulher na
Bíblia, como também da leitura da Bíblia sob a perspectiva do lugar da mulher. Para tanto,
uma das fontes é indicada por Bell Hooks
4
, quando fala sobre o quanto as lutas das
mulheres negras sempre foram ligadas ao corpo e desta relação desenvolveram sua
compreensão de vida e de mundo, seu modo de pensar e agir na realidade. São formas que
revelam dependências e resistência diante de um contexto racista e de origem
escravocrata, mas também, a luta pela manutenção de uma origem e de uma ancestralidade
que coloca em questionamento a dominação de uma epistemologia eurocêntrica
1 Mikhail BAKHTIN, Marxismo elosoa da linguagem, p.349.
2 L. GONZALEZ, Racismo e sexismo na cultura brasileira, p.225.
3 PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, A interpretação da Bíblia na Igreja, p.75.
4 Seu nome é grifado em letras minúsculas no corpo do texto e na bibliografia, por se tratar de um pseudônimo de a
Gloria Watkins.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
Negras mulheres e mulheres da blia: trajetória de lutas e resisncia por uma educação antirracista
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.68-80, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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autoritária e machista. A pensadora afirma que a combinação entre racismo e sexismo
implica, em sermos vistas como intrusas, pois somos portadoras de mentalidade estreita.
Além disso, a própria conceituação ocidental de uma epistemologia branca faz com que o
caminho para a escola, para a academia e para a ciências se torne mais difícil para as
mulheres negras.
A mulher negra tem muito conhecimento a oferecer sobre a realidade humana, sobre
a vida, sobre o corpo e sobre a cultura. Sua capacidade de realizar uma síntese ou uma
síncrese cultural é fonte de muita sabedoria e capacidade de ação prática. Isto é percebido
pela própria Bell Hooks quando a define como uma intelectual que une criativamente o
pensamento, a prática para entender a sua realidade concreta. Pensamento e prática não
são para ela realidades dicotômicas excludentes; ao contrário, são dialéticas que conversam
entre si e produzem compreensões e práticas emancipadoras.
Desde os anos que precederam o fim legal da escravização no Brasil, o movimento
negro organizou várias formas de luta contra a escravidão, vale dizer, contra o racismo e
todas as formas de discriminação racial. Neste processo de análise destacamos,
inicialmente, que as mulheres negras sempre tiveram em suas pautas de luta um papel de
destaque. A seguir pretende-se mostrar a luta e a resistência do movimento negro e do
movimento de mulheres negras no combate à discriminação racial e ao racismo existentes
na sociedade brasileira e suas repercussões. Para tanto buscamos iluminar esta análise
tendo como fonte a luta e a resistência de algumas mulheres da Bíblia. Destacamos, ainda,
a importância da legislação da educação brasileira acerca das relações étnico raciais,
indicando a pertinência e a importância da implementação de tal legislação para o campo
educacional. Neste sentido será evidenciada a educação antirracista da Lei 10.639/2003,
enquanto uma política curricular que visa o reconhecimento da história e cultura da
população negra, bem como, os desafios e as possibilidades de transformações no
enfrentamento do racismo em todas as instâncias. Por fim, será evidenciado o caminho de
uma mística bíblica, destacando o lugar da mulher negra na construção e no
reconhecimento da história de luta por uma cultura antirracista.
LUTAS E RESISTÊNCIAS DAS MULHERE S
O racismo e a discriminação impedem o livre exercício da cidadania bem como o
acesso democrático ao desenvolvimento, portanto devem ser eliminados para permitir o
desenvolvimento com equidade social. O impulso para que a temática racial seja
incorporada na sociedade, se faz necessária a aplicação de ações afirmativas e políticas
voltadas à concretização do princípio constitucional da igualdade.
A conquista da restauração da ordem democrática do Brasil tem como marco legal a
Constituição Federal de 1988, que pela primeira vez e de forma inédita reconhece o
racismo e o preconceito racial como fenômenos presentes na sociedade brasileira e
apresenta caminhos para superação do racismo, das desigualdades, reconhecendo a
pluralidade étnico-racial e abrindo as comportas para o avanço dos movimentos sociais
que lutam contra a discriminação racial.
O estado Brasil um país de muitas leis inovadoras, mas de direitos ainda limitados.
Apesar de inúmeros avanços legais, ainda falta a criação de condições objetivas e efetivas
para superação do racismo e das desigualdades, que permitam a todos se beneficiarem da
igualdade de oportunidades. Diante da desigualdade instituída historicamente no Brasil, é
preciso tratar os desiguais de forma desigual, elevando os desfavorecidos ao mesmo
patamar de partida dos demais indivíduos.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
Negras mulheres e mulheres da blia: trajetória de lutas e resisncia por uma educação antirracista
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.68-80, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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O resultado da luta e resistência da população negra encontra-se presente nos
avanços de muitas legislações, que mesmo apresentando contradições, expressam algum
grau de conquista da luta dos negros contra a situação de exploração. A luta implica na
construção de uma nova história, como no caso da própria Lei Áurea, de 13 de maio de
1888, comumente apresentada como uma data em que ocorreu a concessão da liberdade a
todos os escravos pelo poder imperial. Tal lei precisa ser questionada quanto a sua efetiva
contribuição na libertação dos escravos, considerando que muitos fatores que
determinaram a lei são desconsiderados e desconhecidos. Ademais, as condições em que os
escravos passam a viver com a libertação, revelam que não se tratou de libertação, mas de
abandono dos negros a própria sorte, sem os meios básicos de sobrevivência. Somente a
luta e a busca de alternativas pelos próprios escravos é que os tornou efetivamente livres,
embora em condições precárias. Por isso, pergunta-se: o 13 de maio é uma data para
comemorar? E o dia seguinte, 14 de maio, como foi? Em quais condições passa a viver a
população escravizada que a partir de então? Sem acesso à terra, ao trabalho, aos meios de
sobrevivência, como sobreviveram os escravos então libertados? Que alternativas eles
encontraram para sobreviver? Como sabemos, a população negra, mesmo após a abolição,
nunca teve condições de igualdade e de participação efetiva na sociedade brasileira. No
entanto, resistiu e conseguiu avançar em suas conquistas.
As mulheres negras e os homens negros sempre reagiram e continuam a reagir às
tentativas da mentalidade colonialista de impor, pela força, uma vida totalmente diferente
a que viviam em sua terra mãe África. O movimento negro vem organizando, desde alguns
os anos que precederam o final da escravização, formas de luta e resistência contra o racismo
e a discriminação racial. Essas práticas antirracistas
5
m continuidade nos dias atuais.
Um avanço da luta antirracista no Brasil são as conquistas da Lei 10.639/2003 e da
Lei 11.645/ 2008, que alteraram a Lei 9.394/1996 Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, incluindo no currículo a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-
Brasileira e da Cultura Indígena. Estas leis, apesar de inúmeras dificuldades, têm
possibilitado que as questões que envolvem estas culturas comecem a ser conhecidas e
estudadas nas escolas e no ensino superior, nos cursos de formação de professores.
Entre os marcos legais na luta antirracista destacamos, ainda, a Lei 12.288/2010,
que institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinada a garantir à população negra a
efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos, individuais,
coletivos e difusos e o combate à discriminão e as demais formas de intolerância
étnica. Soma-se a ela a Lei 12.711/2012, a chamada Lei de Cotas, que garante a reserva
de, pelos menos, metade das vagas nas universidades públicas e Institutos Federais de
Educação, Ciência e Tecnologia a alunos pretos, pardos e ingenas, oriundos
integralmente do ensino blico.
São conquistas importantes que precisam ser consolidadas e ampliadas. Para tanto,
uma das lutas que tem sido destacada, é o da descolonização dos pensares e saberes que se
fazem presentes em diferentes contextos. A permanência das visões patriarcais, machistas,
racistas são desafios que precisam ser enfrentados por novas concepções de mundo, de
vida, de conhecimento, de saber. Descolonizar os diferentes espaços de saber envolve,
também, a descolonização da visão espiritual, da visão religiosa e das fontes da formação
5 Destacamos que existem diferentes maneiras de praticar o antirracismo, que vão além de denunciar o racismo, crime
considerado hediondo no Brasil, sem direito a fiança. Outros tipos de antirracismo são as ações do movimento negro
que buscam levar à sociedade o conhecimento sobre a história de lutas dos homens e mulheres negros pela liberdade,
durante a escravatura e no pós abolição, pelo reconhecimento das suas singularidades culturais e civilizatórias.
Também representam outro tipo de antirracismo as iniciativas dos governos, sob a pressão do movimento negro, de
fazerem valer leis que foram criadas para garantir direitos iguais para homens negros e mulheres negras na educação,
na saúde, na segurança, no desenvolvimento cultural e no mercado de trabalho.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
Negras mulheres e mulheres da blia: trajetória de lutas e resisncia por uma educação antirracista
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.68-80, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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das pessoas. Os espaços de saberes ainda são cheios de barreiras e cristalizados na nossa
formação social, cultural, econômica e educacional.
Diante disso, nossa proposição é de buscar descolonizar a própria leitura da Bíblia,
procurando promover um novo olhar antirracista e anticentralista pela revisão dos
conceitos e pela identificação dos preconceitos que reproduzem e alimentam um ambiente
espiritual discriminador. Entendemos que é esse o caminho que permitirá o acesso aos
espaços de poder, a desconstrução dos valores forjados pela mentalidade colonialista, a
superação do racismo institucional que tem marcado a exclusão das negras e dos negros da
escola, das academias e também de muitos espaços eclesiais.
LUTAS E RESISTÊNCIAS DAS MULHERE S DA BÍBLIA
É na perspectiva de descolonizar a leitura e interpretação da Bíblia que buscamos
alumiar todas essas histórias de lutas e resistências com as experiências de mulheres da
bíblia e mulheres negras da bíblia a partir de leitura libertadora e feminista, ou seja, na
perspectiva de “redescobrir a posição e o papel da mulher” nos movimentos do povo
bíblico
6
. O que será que seus gritos marginais têm a nos dizer? Pois, é do lugar da margem
que nos encontramos com essas mulheres
7
, não estão no centro das grandes narrativas
bíblicas, mesmo assim, constituem essencial contribuição para o desenvolvimento do povo
de Israel, e hoje, suas narrativas são “pedagogia de libertaçãoda mulher, do negro, do
pobre, povo de Deus em marcha na história, ontem e hoje.
a) O grito de Agar é ouvido (Gn 16,115; 21,9-21): nas margens das tendas dos
patriarcas e matriarcas ecoa o grito de Agar a escrava egípcia, ou seja, escrava africana. Ela
é a escrava usada, maltratada e expulsa, mas encontrada por Deus em seu sofrimento: De
onde vens e para onde vais?(Gn 16,8); é a pergunta sobre a origem, mas também sobre o
destino, sobre o horizonte. No deserto, com fome e sede, ela desespera pela morte do filho.
Deus faz caminho com essa jovem escrava africana. Primeiro, a partir de aparição de anjo,
Deus ouve seu grito: Não temas, Deus ouviu a voz do menino!(Gn 21,17b); e convida esta
mulher a o se entregar a morte. Depois, abriu seus olhos e ela viu um poço de água(Gn
21,19). Deus ouve o grito de Agar e deu seu filho. É um grito de uma mulher negra
escravizada e injustiçada. Deus ouve, alimenta sua esperança, abre seus olhos e sacia sua sede.
b) As parteiras egípcias enganam o faraó (Ex 13,15-21): nas margens no processo
de libertação do povo hebreu no Egito, temos a contribuição de um importante
movimento de parteiras. O faraó pede a Séfora e Fua para matar os meninos hebreus, por
sua vez elas criam artifício para salvá-los e trazer-lhes a morte: as parteiras, porém,
respeitavam a Deus, e, em vez de fazer o que lhes mandava o rei do Egito, deixavam com vida os
recém-nascidos(Ex 1,17). Essa experiência de educação popular das parteiras revela duas
coisas importantes para nosso caminho: Primeiro, é necessário ouvir e respeitar a voz que
protege a vida; segundo, também, contra impérios de morte, usa-se dos argumentos e
armas que se pode, pois, o mais importante é resguardar a vida para que ela não seja
atirada no rio da morte (cf. Ex 1,22b).
c) Aslhas de Salfaad exigem umpedaçode terra (Nm 27,1-11): nas margens do
caminho pelo deserto, o caminho da libertação e da purificação antes de chegar na terra
prometida, temos o importante testemunho de um grupo de mulheres, as filhas de Salfaad.
Não tinham pai, o tinham irmãos, por isso não tinha terra, os direitos da terra estavam
associados ao homem. Com essas mulheres, Maala, Noa, Hegla, Melca e Tersa, o povo do
6 PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, A interpretação da Bíblia na Igreja, p.79.
7 CNBB, A Igreja e as Comunidades Quilombolas (Estudos da CNBB, 105), p.84.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
Negras mulheres e mulheres da blia: trajetória de lutas e resisncia por uma educação antirracista
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.68-80, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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deserto aprende que as mulheres também têm direitos: Moisés apresentou a causa ao Senhor,
e o Senhor disse a Moisés: As lhas de Salfaad (Nm 27,5-7). Em um mundo em que os
direitos das mulheres são mínimos ou inexistentes, temos aqui uma importante inovação
possível que essa lei seja bem posterior). Não é possível entrar na Terra Prometida sem
conceder o direto da Terra às mulheres. Terra está associada ao básico para se viver e o
se pode viver sem ser concedido o básico. Por sua vez, da pedagogia do deserto temos esse
ensinamento: as mulheres precisam gritar por seus direitos!
d) Raab quer fazer parte do povo (Js 2,1-21): às margens da chegada na terra, as
margens da organização tribal, uma mulher apresenta um importante contraponto: Raab.
Mas uma vez o povo está sob ameaça de poderes quem podem matar e o protegidos por
uma mulher. Raab era uma prostituta, sua casa ou seu prostibulo, visitado pelos espiões
que vieram, quem sabe, atrás de seus serviços sexuais, ficava no muro, de fora, na margem
da grande cidade de Jericó
8
. É provável que tivesse motivos para indignar-se com a classe
dominante da cidade que a usava e discriminava, ao passo que adere ao movimento rebelde
associado a um Deus que liberta escravos
9
: ouvimos que o Senhor secou a água do Mar
Vermelho diante de vós, quando vos tirou do Egito...(Js 2,10). Ela uma possibilidade de vida
nova para si e para seu clã, por isso não tem pudor em mentir, esconder, omitir e enganar,
como também fizeram as parteiras do Egito. Raab tem a sua frente uma promessa de povo,
como nunca experimentou na vida. É preciso fazer parte de um povo onde se tenha um
lugar, uma missão: libertada para libertar.
e) Hulda é voz profética feminina que vem da periferia (2Rs 22,14-20): A
narrativa de Hulda se insere no contexto do reinado de Josias e seus movimento
deuteronomista, que pretendiam grande reforma religiosa a partir do encontro com a Lei
de Deus ou palavra de Deus (2Rs 22,8-13), mas seus reais motivos eram a dominação
política. É ele que pede ajuda a profetisa. Hulda morava na periferia de Jerusalém, não era
profeta oficial da corte. Ela proclama a destruição que virá pelas mãos de Babilônia por
conta dos pecados e povo, das falsas alianças dos reis e poderosos e do esquecimento da
Aliança, ou seja, do que fez pelo seu povo o Deus dos Êxodo. O rei é limitado, não entende
a Palavra de Deus, Hulda, essa mulher sabe ler o Livro da Aliança porque sabe-se
conectada a Deus a história de seu povo. Assim, com esta profetisa aprendemos que é
impossível ler a Bíblia sem íntima conexão com vida e história de seu povo, pois Deus atua
nessa história.
Agar, as parteiras egípcias, as filhas Salfaad, Raab e Hulda são algumas, dentre
muitas, narrativas bíblicas, algumas aesquecidas, que encontramos na leitura crítica do
lugar da margem. Poderíamos explorar até mais, com Débora, guerreira do povo (Jz 4-5),
com uma mulher anônima que quebra a cabeça de um rei opressor (Jz 9,50-55), com Rute
e Judite, que usam dos artifícios que podem para fazer sobreviver o povo. No movimento
de Jesus, o grupo dos discípulos também era seguido de um grupo de discípulas (Lc 8,1-3),
entre ela, Maria de Magdala, Joana de Cusa e Susana. Também nas comunidades de Paulo
inúmeros testemunhos para presença e atuação de mulheres, como na comunidade de
Roma (Rm 16,1-16), com a diaconisa Febe, Prisca ou Priscila, esposa de Áquila, uma tal
Maria, Júnia, chamada de ‘apóstola’, Trifena, Trifosa e Pérside, mulheres que ‘se afadigaram
no Senhor’, e outras mais. Também na comunidade de Filipos (Fl 4,2-3), com a atuação de
Evódia e Síntique, ‘lutadoras do Evangelho’.
8 Amilcar Araujo PEREIRA, O mundo negro: relações raciais e a constituição do movimento negro contemporâneo
no Brasil/Amílcar Araújo Pereira, p.39.
9 Norman K. GOTTWALD, As tribos de Iahweh: uma sociologia da religião de Israel liberto 1250-1050, p.562.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
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Revista Teopráxis,
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Em todas essas mulheres nos encontramos como povo de Deus, de forma particular,
enquanto mulheres negras que tomam a Palavra de Deus para animar as lutas e celebrar as
conquistas. Essas leituras são manifestos bíblicos, ao mesmo tempo pedagogia de
libertação para celebrar cada conquista da mulher negra no contexto da educação
brasileira, que como Agar e as filhas de Salfaad, precisaram gritar, que como as parteiras e
como Raab, tiveram que enfrentar pessoas de poder, que como Hulda, tiveram que
aprender a ler a vida e a história.
EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA: TÃO PERTO DE CHEGAR, MAS LONGE DE ENXERGAR
Nas últimas décadas do século XX e início de século XXI, vivenciamos momentos
ricos de debates, elaboração e implantação de propostas curriculares e uma mudança de
perspectivas teórico metodológica na educação das relações étnico raciais pautadas na
realidade imposta pela modernidade e pela colonialidade, pensando as formas de
dominação e exploração que construíram as relações sociais na América Latina, a
colonialidade e o colonialismo discutida por Quijano.
A colonialidade diz respeito a um padrão de poder que opera através da
naturalização de hierarquias territoriais, raciais, culturais e epistêmicas, possibilitando a
(re)produção de relações de dominação, bem como a destruição de conhecimentos,
experiências e formas de vida dos sujeitos que o explorados. O colonialismo se refere a
um momento histórico marcado pelo processo de domínio político e militar, utilizados
para garantir a invasão e a exploração do trabalho e das riquezas das colônias, em benefício
do colonizador. Para Paim e Pereira:
A epistemologia decolonial e a lógica da decolonialidade não são abordagens
novas, tampouco categorias teórico-abstratas. Elas existem desde a imposição
da colonização e da escravização dos povos americanos, africanos e asiáticos. A
decolonização pauta-se em eixos permanentes de luta dos diversos povos
sujeitos à violência estrutural pensada, assumida e realizada como projeto de
posicionamento político, social, cultural, religioso econômico e epistêmico para
subjugar e dominar os povos não europeus
10
.
De acordo com os teóricos decoloniais, a colonialidade pode se expressar de três
maneiras: colonialidade do ser, do poder e do saber. A ideia de colonialidade defendida por
estes teóricos sustentam que o sistema capitalista se mantém interseccionando
sistematicamente nas mais variadas formas de opressão e está presente em todo o
pensamento negro. A Lei 10.639/2003, trouxe para a realidade escolar e acadêmica,
perspectivas de avanços que enfrentem a colonialidade de saberes ilustrada pela ideia de
um ponto zero de conhecimento. A lei é considerada um marco histórico, ao mesmo
tempo, um ponto de chegada das lutas antirracistas no Brasil e um ponto de partida para a
renovação da qualidade social da educação brasileira
11
. Gomes destaca:
O Brasil do século XXI tem um perfil étnico-racial mais diverso do que
séculos. Sabemos que muito ainda precisa avançar. A luta não trégua. Mas
não podemos desconsiderar que a sociedade brasileira, na atualidade reconhece
a existência do racismo e que os negros e as negras, aos poucos, ocupam mais
espaços sociais, políticos e acadêmicos. E que conseguimos construir, a partir de
2003, políticas públicas de igualdade racial bem como inserir o recorte étnico-
racial – não sem resistências - nas várias políticas sociais existentes”
12
.
10 Elison PAIM e Nilton PEREIRA, Interfaces: educação e temas sensíveis na contemporaneidade, p.13.
11 BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica.
12 Nilma Lino GOMES, O Movimento Negro educador: saberes construídos nas lutas por emancipação, p.19.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
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Um dos principais campos de luta contra a discriminação e o racismo é a escola.
Segundo a concepção hoje predominante, os espaços escolares devem ser compreendidos
como espaços de troca de conhecimentos, no qual se constituem aprendizagens e
experiências docentes e discentes coletivas, de mútuo reconhecimento e livres de todas as
formas de racismo ou desigualdade.
Para tanto, é preciso incluir na escola e nos currículos escolares a cultura, o saber e a
história produzidas pelas populações negras. Pois as negras e negros carregam em si uma
rica história da ancestralidade africana, de experiências de luta e de resistência no Brasil,
que pode e deve ser positivamente incluída no cotidiano escolar, com vistas a tirar a
população negra da visão de uma cultura de inferioridade, diminutiva, subordinada. É
preciso recuperar a riqueza da cultura afro-brasileira, colocando-a em uma posição
afirmativa de construção no desenvolvimento da sociedade brasileira.
Paulo Freire é um dos autores que tem uma grande contribuição para pensar uma
educação antirracista e de valorização da cultura popular negra. Freire, preconiza os
homens como seres inacabados e que se educam em comunhão por meio do diálogo. Sua
concepção de educação nos convida a refletir sobre a relação que precisa se estabelecer
entre educador e educando:
Não mais educador do educando, não mais educando do educador, mas
educador-educando com educando-educador. Desta maneira, educador não é
o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o
educando que, ao ser educado, também educa
13
.
A legitimação de uma educação antirracista, que contribua com a inclusão social,
será possível de ser realizada, se houver escuta e participação efetiva dos sujeitos que
sofrem a discriminação: o se trata de uma educação para alguém, mas com alguém,
entendendo que o conhecimento deve servir para transformar uma realidade e que as
práticas educativas possam agregar e trocar saberes alternativos e transformadores.
A educação formal, por meio do currículo, alfabetiza e ensina saberes convencionais,
além de valores para a formação cidadã. Esta educação acontece na escola e na academia
que tem a responsabilidade de debater e incluir em seus currículos a temática das relações
étnico-raciais na perspectiva de romper, de superar e de combater às desigualdades sócio
raciais. Cabe aos educadores não silenciar diante dos pré-conceitos, da discriminação racial
e construir práticas pedagógicas que promovam a igualdade racial no cotidiano escolar. Para
isto, acontecer precisam saber sobre a história e a cultura africana e afro-brasileira, superar
pré-conceitos sobre as negras e os negros, combater o racismo e a discriminação racial.
Em consequência do período escravocrata brasileiro a população negra ficou fora de
vários espaços de poder, as egressas e egressos das senzalas foram colocados à margem da
sociedade. Sem políticas de inserção a população recém liberta no projeto do pós abolição
e apoiados no preconceito de cor e inferioridade, não tiveram acesso à cidadania plena.
Para ressignificar os valores da tradição africana e fortalecer o pertencimento racial,
promovendo de fato um desenvolvimento integral das educandas e dos educandos,
devemos estar atentos como educadores para que o fazer pedagógico promova sentimento
de pertencimento e de respeito, reivindicando um espaço para a epistemologia africana na
construção e disseminação do saber e a compreensão de que somos iguais enquanto
humanos, embora diferente como indivíduos.
Educar para as relações étnico-raciais é educar para conhecer e respeitar as
diferentes matrizes culturais, éticas e epistemológicas que compõem os diferentes espaços
13 Paulo FREIRE, Pedagogia do Oprimido, p.78-79.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
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da sociedade. Ela se insere em um processo de luta continua pela superação do racismo e
das desigualdades raciais e pode contribuir para modificar e fazer repensar a lógica das
instituições escolares, fazendo destes espaços para produção de conhecimento não racistas
e não discriminadores.
A compreensão das diferenças raciais deve ser o ponto de partida para construir o
currículo escolar e as práticas pedagógicas que dão vida à escola. O momento político atual
é preocupante em vários aspectos, inclusive no que se refere à educação, autonomia das
escolas, das educadoras e dos educadores estão ameaçadas, considerando que a Base
Nacional Comum Curricular BNCC não dialoga com as políticas de ações afirmativas
conquistadas desde 2003. Mais do que nunca todo o docente precisa rever seus conceitos e
pré-conceitos, oferecendo a si próprio a oportunidade de desconstruir e libertar-se da
mentalidade colonialista e dar continuidade a estas conquistas históricas.
O ponto de partida para uma prática pedagógica comprometida com a inclusão
racial, se faz necessário propor e executar ações efetivas de enfrentamento dessa realidade,
começar pelo acolhimento de crianças, adolescente, jovens e adultos ao ambiente escolar.
A educação tem um papel fundamental na busca da equidade e oportunidade para todos,
lembrando que as relações de poder, as diferenças socialmente construídas entre negros e
brancos foram naturalizadas e até justificam as desigualdades entre os grupos. Não basta
no discurso dizer que a diversidade nos enriquece, quando na realidade discrimina e
classifica. Precisamos de ações prática no cotidiano escolar. Ao reconhecer que o sexismo,
a opressão e o racismo estão interligados, que violentam e matam podemos indicar
caminhos para o seu enfrentamento e superação das diferenças sociais e raciais.
Entender que as mulheres negras têm um protagonismo na educação, que permite
discutir estas relações, refletir sobre os lugares de fala e quem pode falar. É preciso
mergulhar na história real do Brasil e redescobrir as suas memórias de luta e
sobrevivência, pois o desconhecimento causa a perpetuação do sofrimento.
O reconhecimento da história de mulheres, negros, indígenas é ainda muito recente,
por isto há uma necessidade urgente de estimular e apoiar iniciativas que apresentem essas
outras histórias. Uma educação emancipadora não se constrói com silêncio das histórias
ou com uma história única. A educação deve resgatar estes silenciamentos ao longo da
própria história de sua construção.
UMA MÍSTICA B ÍBLICA ANTIRRACISTA: CAMINHO SE FAZ CAMINHANDO
Então, o que a Bíblia pode oferecer para corroborar com esses avanços na luta
antirracista na educação e conquista para o povo negro na escola, entre crianças, jovens e
adultos, de forma particular, as mulheres? Como vimos, o é verdade que a Bíblia fala
de homens, do centro à margem, muitas mulheres ajudaram a consolidação do povo de
Deus. De modo que elas criam para nós uma metodologia de luta, uma “mística bíblica”
para alumiar a experiência de luta na escola. Mas isso é possível a partir de uma
“hermenêutica afro-brasileira, feminista, libertadora e popular” que reconsidere o rosto de
Deus, o significado da leitura, o papel das mulheres e as mulheres com o papel:
1) o rosto de Deus: É óbvio que rosto do Deus da Bíblia é masculino: ele é o pai e criador,
o senhor, o rei. Numa perspectiva decolonial, é preciso ir além do óbvio para perceber que “ele
é pai, mas ele é tamm Deus de ternura e de amor maternais”
14
, como aparece no livro do
profeta Oseias: Quando Israel era menino, eu o amei e do E gito chamei o meu lho... Fui eu,
contudo, quem ensinou Efraim a caminhar, eu os tomei pelos braços” (Os 11,1.3). Ora, é de um pai
14 PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, A interpretação da Bíblia na Igreja, p.81.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
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que o profeta fala, mas os gestos o de uma mãe: Deus é pai, mas também é mãe, mulher.
É urgente reencontrar-se de junto das crianças e jovens negras e negros rosto materno e
feminino de Deus.
2) o signicado da leitura: a leitura é um processo libertador. Paulo Freire nos
lembra que “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”
15
: ler para ler a vida e com a
vida ler a Bíblia. Descobrir novas formas de ler a vida com as crianças e jovens negras na
escola, leituras estas que tragam suas tribos, gírias e lutas, também, seus medos, angústias e
apreensões. Essa mística bíblica na escola precisa aprender o jeito do Deus materno do
Êxodo: “Eu vi a miséria do meu povo que está no Egito. Ouvi seu grito por causa de seus
opressores; pois eu conheço as suas angústias. Por isso, desci a fim de libertá-los (Ex 3,7-8).
Uma mística para ver, ouvir, conhecer (sentir), descer e libertar onde esses sujeitos que
sofreram e sofrem discriminação possam ser protagonistas de seu processo libertador.
3) o papel das mulheres: como fizemos aqui, essa mística bíblica busca referência
na experiência de mulheres com o Deus e de Israel e de Jesus: suas experiências são
referências. Ao tempo que, contemplando as mulheres da Bíblia, conectamos essa
caminhada feminina do povo de Deus com a longa marcha das mulheres no Brasil e no
mundo que deram e dão sua contribuição. Assim, de Miriam, a profetisa irmã de Moisés
(Ex 15,19-21) até a mais simples mulher negra de uma periferia do Brasil, encontramos
ligações, correspondências e esperanças compartilhadas.
4) as mulheres com o papel: feito esse caminho, de redescoberta do rosto materno
e feminino de Deus, da importância do ato de ler e do papel das mulheres, as mulheres
negras tomam o papel na mão: o papel da Bíblia, o papel da História do Brasil e da África,
o papel da escola para ler e reler, fazer novas leituras e interpretações. Percebendo o rosto
materno, ou seja, de um Deus, que também é mulher, é possível perceber o “rosto negro de
Deus”, ou seja, de um Deus que se associa a escravos e movimenta libertações (cf. Ex 3).
Assim, feita essa leitura com as mulheres, ao mesmo tempo que a Bíblia se torna um livro
na mão e continua sendo um livro muito importante, também faz com que as mulheres
negras passem a perceber a necessidade de escrever sua página à Palavra de Deus, a partir
de sua história, de seus desenhos, de seus gritos e de suas esperanças.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O artigo teve como propósito refletir e discutir a trajetória de lutas e resistências das
mulheres negras na sociedade brasileira na perspectiva da implementação de uma educação
antirracista, iluminado por relatos bíblicos que revelam a presença da mulher na Bíblia,
mesmo que à margem. Procuramos tecer as trajetórias de lutas de negras mulheres, na
perspectiva do revelar a importância do romper com o silenciamento e a invisibilidade que
as acompanham durante os processos de sua formação.
O título do artigo “Negras mulheres e mulheres da Bíblia, trajetória de lutas e
resistência: por uma educação antirracista” é oportuno para o momento em que vivemos e
assistimos às discussões sobre a maioridade da Lei 10.639/2003, que traz para o debate os
avanços conquistados e a possibilidade de desenvolver discussões que enfatizam a dificuldade
e a resistência da implementação da referida legislação nos espaços escolares e na academia.
Pela análise efetuada constatamos que a inclusão da educação para as relações étnico
raciais na formação dos professores mostra-se um caminho para uma efetiva mudança nas
instituições que coíba a reprodução do racismo, do preconceito e da discriminação,
analisando as questões raciais de forma a se desprenderem e dos bitos eurocêntricos,
15 Pulo FREIRE, A importância do ato de ler, p.19.
PRATES, Ana Maria da Rosa; BUENO, Francisca Izabel Da Silva; OLIVEIRA, Marcio Luiz de
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patriarcais, machistas e racistas. Consideramos que a Lei 10.639/2003, apesar de suas
limitações, traz algumas contribuições que poderão contribuir para a normatização na
qualificação da organização escolar, na formação dos educadores na qualificação da gestão
escolar numa perspectiva antirracista. Entendemos que sem incluir na pauta escolar e no
plano pedagógico a questão racial não haverá educação antirracista que promova equidade
de oportunidades a todos.
E assim encerramos entendendo que:
Nossa dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e
vivemos como nossos pais... (Elis Regina, música “Como os nossos pais”)
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Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
CHRISTUS VIVIT
novidades na evangelização da juventude
CHRISTUS VIVIT
news in the evangelization of youth
Luis Duarte Vieira*
Diego Isotton**
Resumo: A mudança de época tem colocado à Igreja vários desafios para a
evangelização, exigindo da mesma um movimento de ruptura com a
pastoral de manutenção para ser uma Igreja em Saída, com renovado ardor
missionário e profético. Cresce a consciência de que é preciso encontrar
caminhos para que a Boa-Nova seja comunicada às pessoas hoje e que a
Civilização do Amor seja plenamente realidade. A Pastoral Juvenil também
é chamada a inserir-se nesse processo de ser e construir uma Igreja em
saída, pobre e para os pobres. E é nesse contexto que o Papa Francisco
escreveu a Exortação Apostólica Pós-Sinodal Christus Vivit, publicada em 2019.
O presente artigo, mediante pesquisa bibliográfica, teve como objetivo
analisar as novidades que a Christus Vivit apresenta para a Evangelização da
Juventude. A análise das orientações pastorais contidas na Exortação
permitiu identificar algumas novidades no campo da Evangelização da
Juventude e, dentre elas, é possível citar o reconhecimento da juventude
como realidade teológica, o ser pastoral juvenil popular e o ser uma
pastoral sinodal. Essas novidades dialogam com o universo educacional,
quando se analisa este em sua relação com as juventudes.
Palavras-Chave: Juventude. Evangelização. Christus Vivit.
Abstract: The change of epoch has posed to the Church several challenges
of evangelization, demanding from it a movement of rupture, with the
maintenance pastoral to be an outgoing Church, with animated and
prophetic renewer. It grows the awareness that is necessary to find ways
for the Good News to be communicated to people today and that the
Civilization of Love is fully reality. Youth Ministry is also called to be part
of this process of being and building an outgoing Church, poor and for the
poor ones. And it is in this context that Pope Francis wrote the Post-
Synodal Apostolic Exhortation Christus Vivit, published in 2019. This article,
through bibliographic research, aimed to analyze the novelties that Christus
Vivit presents for the Evangelization of Youth. The analysis of pastoral
guidelines contained in the Exhortation allows to identify some novelties
in the field of Youth Evangelization, and, among them, it is possible to
mention the recognition of youth as theological reality, being a popular
youth ministry and being a synodal ministry. These novelties dialogue with
the educational universe, when it is analyzed in its relationship with youths.
Keywords: Youth. Evangelization. Christus Vivit.
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 81-88, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.75
* Doutorando em Ensino de Ciências e
Matemática pelo Programa de Pós-
Graduação em Ensino de Ciências e
Matemática da Universidade de Passo Fundo
- UPF. Mestre em Ensino de Ciências e
Matemática pela mesma instituição (2020).
Possui graduação em Matemática pela
Universidade Estadual de Goiás (2016).
E-mail: duarteluis05@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-9153-7393
** Licenciado em Filosofia Universidade
Federal da Fronteira Sul e Bacharel em
Teologia Itepa Faculdades. Vigário
Paroquial, Paróquia Santa Inês, Diocese de
Chapecó - SC.
E-mail: diego_isotton@yahoo.com.br
https://orcid.org/0000-0001-6603-0171
Recebido em 23/01/2022
Aprovado em 14/04/2022
82
INTRODUÇÃO
O mundo mudou radicalmente nos últimos anos, fruto de diferentes, diversos,
desiguais e complexos processos. Assim sendo, aquele modo de compreender o mundo, a
religião, a família, a educação, a sociedade, a política, a escola, a Igreja e as relações também
mudou drasticamente. O Documento de Aparecida, em 2007, falava de uma mudaa de
época: “vivemos uma mudança de época, e seu nível mais profundo é o cultural. Dissolve-se a
concepção integral do ser humano, sua relação com o mundo e com Deus” (DAp 44).
Todo esse processo de mudança de época, afeta a vida da Igreja. Os bispos reunidos
na Conferência de Aparecida assim afirmavam:
No fiel cumprimento de sua vocação batismal, o discípulo deve levar em
consideração os desafios que o mundo de hoje apresenta à Igreja de Jesus, entre
outros: o êxodo de fiéis para seitas e outros grupos religiosos; as correntes
culturais contrárias a Cristo e à Igreja; a desmotivação de sacerdotes frente ao
vasto trabalho pastoral; a escassez de sacerdotes em muitos lugares; a mudança
de paradigmas culturais; o fenômeno da globalização e a secularização; os graves
problemas de violência, pobreza e injustiça; a crescente cultura da morte que
afeta a vida em todas as suas formas (DAp 185).
É fato que a mudança de época tem colocado à Igreja vários desafios para a
evangelização, exigindo da mesma um movimento de ruptura com a pastoral de manutenção
para ser uma Igreja em Saída, com renovado ardor missionário e profético. Cresce a
consciência, nesse contexto, de que é preciso encontrar caminhos para que a Boa-Nova seja
comunicada às pessoas hoje e que a Civilização do Amor seja plenamente realidade.
Essas mudanças que se processaram e processam constantemente no mundo e que
desafiam a Igreja, também afetam os jovens e afetam igualmente os processos educativos.
O próprio processo do Sínodo sobre “Os Jovens, a Fé e o Discernimento Vocacional”,
realizado em 2018, apontou diversos aspectos da realidade que os jovens vivem e como
essas mudanças todas afetam a vida dos mesmos.
E é nesse contexto que o Papa Francisco escreveu a Exortação Apostólica Pós-
Sinodal Christus Vivit, publicada em 2019. O presente artigo, mediante pesquisa
bibliográfica, teve como objetivo analisar as novidades que a Christus Vivit apresenta para a
Evangelização da Juventude.
1 EXOR TAÇÃO APOSTÓLICA CHRISTUS VIVIT
A Exortação Apostólica Pós-Sinodal Christus Vivit é um documento pontifício,
escrito pelo Papa Francisco aos Jovens e a todo o povo de Deus, a partir das reflexões
Sínodo sobre “Os Jovens, a Fé e o Discernimento Vocacional”, realizado em 2018. É o
terceiro documento desenvolvido no processo sinodal. O primeiro elaborado foi o
Instrumentum Laboris, que reúne as escutas dos jovens feito no período preparatório, o
segundo foi o Documento Final com as conclusões da XV Assembleia Ordinária do Sínodo
dos Bispos. Sobre a Christus Vivit o Papa Francisco descreve:
Escrevo a todos os jovens cristãos com carinho esta Exortação apostólica, isto é,
uma carta que recorda algumas convicções de nossa e que ao mesmo tempo
nos encoraja a crescer em santidade e no compromisso com a própria vocação.
Mas como se trata de um marco dentro de um caminho sinodal, dirijo-me ao
mesmo tempo a todo o povo de Deus, a seus pastores e fiéis, porque a reflexão
sobre os jovens e para os jovens convoca e estimula a todos nós. Por isso, em
alguns parágrafos falarei diretamente para os jovens e em outros oferecerei
abordagens mais gerais para o discernimento eclesial (ChV 3).
VIEIRA, Luis Duarte; ISOTTON, Diego
Christus Vivit: novidades na evangelização da juventude
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.81-88, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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Francisco comenta e aprofunda os conteúdos da XV Assembleia Geral Ordinária do
Sínodo dos Bispos. Na Exortação, apresenta a sua leitura do Sínodo, depois de ouvir
atentamente os jovens e os padres Sinodais. Francisco se dirige a cada jovem com um
fraterno apreço, falando-lhe ao coração, também se dirige à Igreja e às pessoas de boa
vontade, visto que “a reflexão sobre os jovens e para os jovens convoca e estimula a todos
nós” (ChV 3) As motivações de Francisco em escrever a exortação advém de todo processo
sinodal, e alerta que algumas propostas, devem ser consultadas nos documentos anteriores.
Logo, para Francisco, todos os documentos produzidos e todo o processo Sinodal têm seu
valor, a fala dos jovens, sejam eles católicos ou não, foram valorizadas e acolhidas pelo
Papa. Segundo o Papa Francisco:
Deixei-me inspirar pela riqueza das reflexões e dos diálogos do Sínodo do ano
passado. Não poderei recolher aqui todas as contribuições que vocês poderão
ler no Documento Final, mas tratei de assumir na redação desta carta as
propostas que pareceram mais significativas para mim. Deste modo, minha
palavra está carregada de milhares de vozes de fiéis de todo o mundo que
fizeram chegar suas opiniões para o Sínodo. Mesmo os jovens não fiéis, que
quiseram participar com suas reflexões, propuseram questões que me
apresentaram novas perguntas. (ChV 4).
O Papa promoveu, por meio do Sínodo, um amplo caminho de diálogo, não com
os jovens católicos, mas com todos os jovens, independentemente de sua crença.
Procurou-se ouvir também os não crentes. Todos os jovens puderam ter vez e voz em
algum momento do processo sinodal. Aqui uma inspiração para uma educação que
deseja ser integral: dar vez e voz aos sujeitos que participam dos processos educativos.
Francisco coloca em destaque um jeito sinodal de ser Igreja e propõe esse método para
toda a Igreja universal adotar junto à Pastoral Juvenil e nos processos educativos que
efetiva. Na Christus Vivit Francisco aponta a Pastoral Sinodal como um dos horizontes a
serem adotados a partir de agora na evangelização da juventude. O processo sinodal do
Sínodo sobre os Jovens representou como é possível desenvolver a sinodalidade com os
jovens, para isso, é preciso que a Igreja em todas suas instâncias promova a escuta e o
diálogo com os jovens, possa acolher e ir ao encontro dos mesmos, confiar no seu
protagonismo e acompanhá-los com ternura e misericórdia. A vivência educacional pode,
inclusive, ser uma vivência educacional.
A Christus Vivit possui nove capítulos nos quais o Papa Francisco reflete e convida os
jovens a refletir. Segue os capítulos da exortação (2019):
1. O que a palavra de Deus diz sobre os jovens?
2. Jesus Cristo sempre jovem
3. Vocês são o agora de Deus
4. O grande anúncio para todos os jovens
5. Caminhos de Juventude
6. Jovens com Raízes
7. A Pastoral dos Jovens
8. A vocação
9. O discernimento
Sinteticamente, a exortação percorre um caminho que passa pela Palavra de Deus,
dialoga sobre a realidade juvenil, aponta diretrizes e possibilidades pastorais e reflete sobre
a vocação e o discernimento vocacional, sempre no horizonte de gerar vida aos jovens,
pois, como afirma Francisco: Cristo “vive e quer-te vivo!” (ChV 1).
VIEIRA, Luis Duarte; ISOTTON, Diego
Christus Vivit: novidades na evangelização da juventude
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.81-88, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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2 A IGREJA E OS JOVENS: REFLEXÕE S DA EXORTAÇÃO
A Igreja tem plena ciência que quem é jovem hoje, vive a ppria condição neste
mundo, diferente das gerações dos seus pais e educadores. Essa consciência precisa
existir nas instituições educativas: os jovens de hoje não são os mesmos jovens do
passado e nem do futuro.
Os jovens sentem a necessidade de figuras de referências próximas, credíveis,
coerentes e honestas, bem como lugares favoráveis para a vivência e integração com as
pessoas e seus coetâneos
1
.
Nesse caso entra a Igreja, como um ambiente para os jovens matarem sua sede de
convivência e relações. Mas nem sempre os espaços eclesiais são receptivos com os jovens,
pelo contrário, não são poucos casos que os condenam e não possuem a paciência de
adentrar em suas vidas e acompanhar os seus processos de vida que muitas vezes diferem
com aqueles constituído pelos católicos participantes.
Nesse sentido, a Igreja instituição passa a ser olhada pelos jovens com ressalvas, com
desconfiança e até indignação diante de posturas de julgamento, perseguição, abusos,
contratestemunho e corrupção. Os jovens não deixam de se aproximar de Jesus, mas se
desencantam com aqueles que anunciam Jesus, visto, estes, o conformarem suas vidas
com aquilo que pregam (ChV 40).
Mesmo diante do contratestemunho de alguns integrantes da Igreja, a Igreja confia,
sem reservas que ainda é o ambiente saudável para o crescimento pessoal e espiritual de
cada jovem, em vista da vida em plenitude que cada um é chamado a viver. Paulo VI na
Mensagem do Concílio Vaticano II aos jovens disse que a Igreja possui: “aquilo que faz a
força e a beleza dos jovens: a capacidade de alegrar-se por aquilo que começa, de doar-se
sem reservas, de renovar-se e de novamente partir para novas conquistas”
2
. Assim, a Igreja
possui as riquezas da sua tradição espiritual que continua sendo um recurso infalível e um
auxílio no acompanhamento da maturidade da consciência dos jovens em vista de uma
opção vocacional autêntica e livre
3
.
Os jovens durante o processo sinodal reconheceram e ressaltaram a importância e o
valor dos clérigos, religiosos e religiosas, lideranças que os acompanham e que oferecem seu
tempo, suas vidas e recursos financeiros para acompanhá-los (ChV 99). Assim, no Sínodo a
Igreja reconhece os seus erros diante dos jovens, pede desculpas, evidencia que não é esse o
seu caráter e pergunta aos jovens como desenvolver uma pastoral juvenil coerente:
a Igreja decidiu perguntar-se sobre como acompanhar os jovens para
reconhecer e acolher o chamado ao amor e à vida em plenitude, e também para
pedir aos próprios jovens para ajudá-los a identificar as modalidades hoje, mais
eficazes para anunciar a Boa Nova. Por meio dos jovens, a Igreja poderá
perceber a voz do Senhor que ressoa também hoje
4
.
Nesse sentido, para o Sínodo dos Jovens, a Igreja anuncia e reitera a sua missão
diante dos jovens que é: “o desejo de encontrar, acompanhar e cuidar de cada jovem, sem
exceção. Não podemos nem queremos abandoná-los à solidão e às exclusões às quais o
mundo lhes expõe”
5
. A Igreja não pode ter as mesmas atitudes da cultura do descarte e da
1 SÍNODO DOS BISPOS, Documento preparatório (com questionário anexo) com Carta do Papa Francisco aos Jovens p.21.
2 Papa PAULO VI, Mensagem do Papa Paulo VI na conclusão do Concílio Vaticano II aos Jovens 1965. Disponível em: <http://
www.vatican.va/content/paulvi/pt/speeches/1965/documents/hf_p-vi_spe_19651208_epilogo-concilio-
giovani.html>. Acesso em 02nov2020.
3 NODO DOS BISPOS, Documento preparatório (com questionário anexo) com Carta do Papa Francisco aos Jovens, p.14.
4 SÍNODO DOS BISPOS, Documento preparatório (com questionário anexo) com Carta do Papa Francisco aos Jovens, p.13.
5 SÍNODO DOS BISPOS, Documento preparatório (com questionário anexo) com Carta do Papa Francisco aos Jovens, p.27.
VIEIRA, Luis Duarte; ISOTTON, Diego
Christus Vivit: novidades na evangelização da juventude
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.81-88, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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indiferença, pelo contrário, deve ser a casa da ternura e da misericórdia, para que a alegria
na vida dos jovens seja completa. Este mesmo convite é feito às instituições educativas:
serem espaços que contribuem com os projetos de vida dos/as jovens e lhes permitam
encontrar sentidos.
3 A PASTORAL J UVENIL
A Exortação Apostólica Pós-Sinodal Christus Vivit convida à reflexão, mas também à ação.
Por isso, propõe orientações e diretrizes para a Pastoral Juvenil no mundo. O capítulo sete da
Christus Vivit denominado “A Pastoral dos Jovens” reúne oito indicativos ou reflexões feitas
pelo Papa para serem levadas em questão na organização da Pastoral Juvenil nas Igrejas
Particulares. Esses indicativos necessariamente não são puramente uma novidade para
algumas realidades eclesiais, para algumas Igrejas Particulares sim, para outras não.
O Sínodo congregou várias experiências de evangelização da juventude de toda a
Igreja e os documentos do Sínodo reuniu as diversas e exitosas experiências e vivências de
evangelização juvenil espalhadas pelo mundo. Assim uma das contribuições da Christus
Vivit é apresentar iniciativas pastorais que estão dando resultados na evangelização da
juventude neste tempo histórico de mudança de época. Outros elementos, o Papa
Francisco recuperou da história da Igreja e os acentuou.
A Christus Vivit apresenta indicativos pastorais, mas salienta que estes não são
receitas prontas a serem aplicadas de forma literal em cada diocese (ChV 65). De imediato,
percebe-se que o Papa não tem interesse de apresentar uma ideia fechada. O próprio Papa
Francisco salienta: “Exorto as comunidades a realizarem com respeito e com seriedade um
exame de sua própria realidade juvenil mais próxima para poder discernir os caminhos
pastorais mais adequados” (ChV 103). Cada realidade eclesial deverá conhecer o público
jovem de suas cercanias e desenvolver uma ação pastoral de acordo com esse grupo. O
mesmo convite e desafio pode e precisa ser feito às Instituições Educativas: conhecer a
realidade juvenil dos jovens que dela participam e a partir dessa realidade realizar o
planejamento de sua ação educativa.
Mesmo o Papa dirigindo algumas palavras sobre a Pastoral dos Jovens, no capítulo
sétimo, a Exortação não elimina o que cada um, em seu respectivo espaço e situação
eclesial, deve fazer. A Christus Vivit não fecha a reflexão sobre os jovens, ela exorta para
acontecerem outras, de modo sinodal, em cada realidade. Havendo uma aprofundada
análise do mundo juvenil, em cada território, favorecerá preparar linhas pastorais mais
adequadas. Dessa forma, a Exortação indica um modo de fazer pastoral, aquele refletido
localmente, não propõe uma unicidade universal homogeneizante da Pastoral Juvenil.
É importante ressaltar que ao tratamos da Pastoral Juvenil, estamos falando de uma
pastoral que visa encontrar o Cristo no jovem. Ele mora na localidade onde os jovens se
encontram, vivem e se socializam. Ou seja, encontrar o jovem em todos os espaços, não
somente na Igreja, ou nos locais considerados “santos para estar-se com os jovens”. O
encontro com o Jesus, ou o anúncio e o testemunho Dele, pode ser na mesa de um bar, em
uma boca de fumo, em uma escola. Nesses lugares os jovens também se encontram e
precisam experimentar a alegria completa oriunda de Deus.
Portanto: “A Pastoral Juvenil, tal como estávamos acostumados a levá-la adiante,
sofreu embate das mudanças sociais e culturais. Os jovens, nas estruturas atuais, muitas vezes
não encontram respostas para suas inquietações, necessidades, problemáticas e feridas” (ChV
202). A Igreja deve ser presença nos espaços onde os jovens se encontram, ser receptiva a
todos os jovens, não só aqueles que estão no redil, ou dentro de suas cercanias geográficas, é
VIEIRA, Luis Duarte; ISOTTON, Diego
Christus Vivit: novidades na evangelização da juventude
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.81-88, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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preciso a coragem evangélica de romper com todas as iniciativas seletivas e excludentes, é
preciso ouvir as inquietações dos jovens e colocá-las como pauta pastoral.
4 METODOLOGIA
Para refletir sobre as novidades da Exortação Apostólica Pós-Sinodal Christus Vivit para
a evangelização da juventude realizou-se uma pesquisa qualitativa e bibliográfica. Para Gil
a este tipo de trabalho “é desenvolvido com base em material elaborado, constituído
principalmente de livros e artigos científicos”
6
.
Nesse contexto de pesquisa, tomou-se como referência os documentos de todo o
processo sinodal que refletiu sobre “Os Jovens, a Fé e o Discernimento Vocacional”.
5 RESULTADOS
Ao analisar a exortação em busca de novidades para a Evangelização da Juventude,
foi possível identificar alguns elementos, mas destacam-se ts: o reconhecimento da juventude
como realidade teológica, o ser Pastoral Juvenil Sinodal e o ser Pastoral Juvenil Popular.
Ao propor os indicativos pastorais, Francisco pede que cada Igreja particular analise
se a Pastoral Juvenil que desenvolve está dentro do seu tempo. Caso as ações não atendem
mais as demandas, precisa ser encerrada e dar abertura aos novos horizontes, por meio da
sinodalidade, diálogo, escuta, acolhida, protagonismo, acompanhamento, anúncio e
testemunho. Se antes pensava-se uma pastoral para os jovens, a C hristus Vivit pede para
ser, para, com e pelos jovens. Os jovens o são os receptáculos da evangelização, pelo
contrário, são os agentes promotores do Anúncio. Eles são os evangelizadores dos seus
coetâneos, no trabalho, na escola, na universidade, na balada, nas atividades esportivas, nas
iniciativas caritativas e solidárias, nas lutas em prol da ecologia e dos direitos humanos etc.
Diante disso, é preciso desenvolver uma Pastoral Juvenil Sinodal, que confia na
capacidade dos jovens serem os agentes da pastoral da evangelização da juventude.
“Existem jovens que sabem discernir os sinais do nosso tempo que o Espírito aponta.
Ouvindo as suas aspirações podemos vislumbrar o mundo de amanhã que vem ao nosso
encontro e os caminhos que a Igreja é chamada a percorrer”
7
. Por muito tempo a Pastoral
Juvenil no mundo não contou com a presença ativa dos jovens na evangelização voltada a
eles mesmos. Agora o Papa pede para a Igreja, sem demora, rever suas metodologias e
lançar-se a novas estratégias no Espírito de caminhar juntos, respeitando a tradição e os
carismas oferecidos pelo Espírito Santo aos jovens.
Essa atitude é aquela, descrita pelos Bispos Sinodais no Documento Final (DF)
vivenciada no Sínodo: “caminhamos juntos e colocando-nos à escuta da voz do
Espírito” (DF 1). “Caminhamos juntos, com o sucessor de Pedro, que nos confirmou na fé e
nos fortaleceu o entusiasmo...” (DF 1). Assim, a Pastoral Sinodal, em última instância, é
caminhar juntos, sem excluir ninguém jovens, idosos, adultos, crianças, religiosas,
religiosos, leigos, padres e bispos, no mesmo itinerário, com o mesmo compasso.
Ninguém à frente nem atrás, nem cima nem embaixo, nem perto demais nem distante;
mas juntos, na mesma sintonia, em espírito comunitário. Cada um contribuindo com seu
dom, virtudes e carismas.
A Igreja reconheceu a novidade de ter a juventude no centro do debate pastoral e
ainda mais, tendo os jovens como interlocutores do processo, lado a lado com os padres
6 Antonio Carlos GIL, Como elaborar projetos de pesquisa, p. 44.
7 SÍNODO DOS BISPOS, Documento preparatório (com questionário anexo) com Carta do Papa Francisco aos Jovens, p.13.
VIEIRA, Luis Duarte; ISOTTON, Diego
Christus Vivit: novidades na evangelização da juventude
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.81-88, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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sinodais. Toda essa iniciativa é um grande sinal de reconhecer a graça batismal de todos os
fiéis, sem excluir ninguém, sem menosprezar a contribuição do batizado mais jovem. Nas
palavras dos Bispos:
A presença dos jovens representou uma novidade: por meio deles, a voz de toda
uma geração ressoou no Sínodo. Caminhando com eles, peregrinos ao túmulo
de Pedro, experimentamos que a proximidade cria as condições para que a
Igreja seja um espaço de diálogo e testemunho de fraternidade que fascina. A
força dessa experiência supera toda dificuldade e fraqueza (DF 1).
Esse desafio da sinodalidade também é posto à educação. Nossas instituições
educacionais precisam ser sinodais, ou seja, precisam caminhar junto com os jovens,
construindo com eles o percurso formativo.
Além de ser sinodal, segundo o Papa Francisco, a Pastoral Juvenil precisa ser Popular
(ChV 230). Essa proposta é especialmente instigante porque parte da consideração de que
os ambientes habituais da pastoral (igrejas, centros de juventude, escolas, associações,
movimentos) conseguem atender uma parcela do mundo juvenil e, infelizmente, excluem
outras. Os jovens de outras religiões e os não crentes, e aqueles que muitas situações são
marcadas por dúvidas, traumas ou erros, teriam dificuldades para se integrar na pastoral
ordinária, mas nem por isso têm menos necessidade de encontrar portas abertas e de
serem apoiados para realizar o bem possível.
Uma outra perspectiva de ação para a Pastoral Juvenil é a Pastoral Juvenil Popular.
Através dessa proposta o Papa chama a Igreja à ousadia, instigando-a a sair dos seus
esquemas e reorganizar outros para atender aqueles jovens que não encontram espaço nos
planos pastorais. A Pastoral Juvenil Popular deve atingir os jovens populares sem
ressalvas, ir ao encontro deles e acompanhá-los nos locais onde vivem, se inserindo em
seus contextos, encontrando uma linguagem que estabeleça a comunicação.
A Pastoral Juvenil Popular não se caracteriza em arrebanhar jovens para a Igreja,
pelo contrário é acompanha-os para que estes possam ter a vida em plenitude, pois nem
todos jovens são católicos e isso o deve ser empecilho para acompanhá-los. O Papa
Francisco provoca a Igreja para esta ser coerente na sua evangelização indo a todos os
povos, sem discriminação de classe, religião, cor e cultura. A maioria da população jovem é
pobre e vive em realidade adversas e por estarem nessas condições são considerados
desajustados para a assistência da Pastoral Juvenil e não são evangelizados. O Papa pede o
inverso, todos os jovens devem ser assistidos pela Igreja. Por isso é urgente a Pastoral
Juvenil Popular.
Não haverá uma Pastoral Juvenil Popular sem diálogo com as Instituições
educativas, formais e não formais. Estas instituições, em via de regra, estão em todas as
realidades e encontram jovens que normalmente não estão nos ambientes eclesiais.
A Pastoral Juvenil será sinodal e popular se reconhecer firmemente a juventude
como realidade teológica. O Sínodo e o Papa Francisco o fazem. Francisco convida e
convoca toda a Igreja a esse reconhecimento.
CONCLUSÃO
O mundo passa por constantes mudanças e transformações. A educação igualmente
tem se alterado profundamente. A Igreja em sua missão evangelizadora é afetada por essas
mudanças. A Pastoral Juvenil também. Assim sendo, é preciso coragem e profecia para
avançar e ser sempre mais uma Pastoral Juvenil que reconhecimento o Divino no Jovem é
sinodal e popular. O desafio é grande, mas é o Espírito que guia a missão da Igreja.
VIEIRA, Luis Duarte; ISOTTON, Diego
Christus Vivit: novidades na evangelização da juventude
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.81-88, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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REFERÊNCIAS BIBLI OGRÁFICAS
CELAM. Documento de Aparecida: texto conclusivo da V Conferência Geral do Episcopado Latino-
Americano e do Caribe. Brasília: Edições CNBB, 2007.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4ªed. São Paulo: Atlas, 2002.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Pós-Sinodal do Papa Francisco: Christus Vivit - para os
jovens e para Todo o povo de Deus. Trad. Décio José Walker. Brasília: Edições CNBB, 2019.
PAPA PAULO VI. Mensagem do Papa Paulo VI na conclusão do Concílio Vaticano II aos Jovens
1965. Disponível em: <http://www.vatican.va/content/paulvi/pt/speeches/1965/documents/
hf_p-vi_spe_19651208_epilogo-concilio-giovani.html>. Acesso em 02nov2020.
SÍNODO DOS BISPOS. Documento preparatório (com questionário anexo) com Carta do Papa
Francisco aos Jovens. Trad. D. Hugo C. da S. Cavalcante. Brasília: Edições CNBB, 2017.
SÍNODO DOS BISPOS. Os jovens, a e o discernimento vocacional Documento Final (DF). Trad.
João Victor Gonzaga. Brasília: Edições CNBB, 2019.
VIEIRA, Luis Duarte; ISOTTON, Diego
Christus Vivit: novidades na evangelização da juventude
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.81-88, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
RESENHA
Este artigo está licenciado com a licença: Creative
Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0
International License.
ECLESIOLOGIA
perspectivas teológico-pastorais
André Luiz dos Santos*
A Igreja como continuadora da missão de Jesus, e que está
inserida no mundo, deve buscar a partir de situações concretas dar
segmento ao Reino, e como bem sabe, muitas alegrias neste
mundo, mas muitas limitações, muitos desafios que precisam ser
enfrentados e encaminhados, mas sempre à luz do Evangelho.
No número 112 da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium,
Papa Francisco aponta que a Igreja é enviada por Jesus como
sacramento da salvação, ou seja, se apresenta como mestra e
aprendiz do povo, percorrendo os caminhos da história e fazendo
acontecer os sinais do reinado de Deus.
Papa Francisco vem testemunhando uma Igreja aberta ao
diálogo sempre à luz do Espírito Santo, uma Igreja retratada na
humildade e simplicidade, que jamais perde suas raízes fundamentadas
no Evangelho e na vivência do próprio Cristo Ressuscitado, ou seja,
uma Igreja que vem buscando colocar em prática tudo o que o
Conlio Vaticano II apresentou. Nisso tudo abundam os sinais de
alegrias impulsionadas pelo testemunho do Santo Padre, porém, nessa
crescente abertura há também crescentes resistências que paralisam os
avanços e dão as costas à realidade do mundo atual.
cabe a reflexão constante, Qual o papel e a missão da Igreja?
Novamente retomando o Papa Francisco no início de seu
pontificado em 2013, que busca sempre retomar a essência da Igreja,
como atuante no mundo e sempre se preocupando com os
sofrimentos e alegrias das pessoas, pois elas são de Cristo.
A missão central da Igreja é o reinado de Deus, centrada
sempre na vida e no ministério de Jesus, e assim que deve ser na
prática eclesial. Esse centro todo centrado no próprio Cristo está
fixado na evangelização dos pobres e excluídos, sendo como prática
essencial da Igreja ir ao encontro dos mais necessitados, nas
periferias, ou seja, naqueles lugares que ninguém quer chegar, sendo
como o Pastor que vai em busca da ovelha perdida (Lc 15,4).
Diante daquilo que Francisco propõe, o livro Eclesiologia:
perspectivas teológico-pastorais publicado pela Editora Berthier se
apresenta através de sete capítulos, que ajudam a refletir a missão da
Igreja no tempo presente, que busca responder aos desafios atuais,
ou seja, tem como objetivo contribuir para a reflexão e o diálogo da
v. 39, n. 132, Passo Fundo,
p. 89-91, Jan./Jun./2022,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v39i132.105
* Acadêmico do quinto período do Curso de
Teologia Bacharelado da Itepa Faculdades. E-
mail: andreluizdv@yahoo.com.
Recebido em 04/03/2022
Aprovado em 21/05/2022
90
missão da Igreja no contexto atual.
O presente livro foi fruto de profunda e constante reflexão, encontros e estudos
conduzido pelos professores e alunos do Instituto de Teologia e Pastoral de Passo Fundo
(ITEPA), e busca sistematizar as reflexões produzidas e contribuir para a caminhada da
Igreja, cuja centralidade não é dar respostas, mas apontar caminhos que direcionam a ão.
O primeiro capítulo mostra diretamente a profundidade da eclesiologia de Francisco
e o processo de sinodalidade, e pontua ainda o percurso metodológico da Metodologia
Histórico-Evangelizadora no Itepa, que produz belos frutos na vida das comunidades a
qual é aplicada e vivida.
O segundo capítulo busca, a partir das comunidades de Corinto, compreender os
conflitos existentes e discernir à luz do Evangelho aquilo que Deus espera da comunidade.
O autor ênfase ao tema da subjetividade e traduz suas implicações para o homem no
contexto atual, mostrando sempre que a subjetividade é um bom ponto de partida, desde
que nunca pare em si mesmo, mas que vá além, sempre ao encontro do outro.
O terceiro capítulo apresenta três questões importantes no caminhar cristão;
primeiro, apresenta a identidade e a missão da Igreja; depois, o aprendizado enquanto
rebanho, onde busca-se ouvir e seguir aquilo que o pastor apresenta; e por fim, o
aprendizado enquanto pastor, num processo daquele que conhece as ovelhas.
O capítulo quarto reflete a função dos ministérios na vida da Igreja, bem como para
que eles servem e a serviço de quem estão sendo usados. Apresenta nesta reflexão que os
minisrios na Igreja são e devem sempre ser o servo configurado segundo o coração de Cristo.
O capítulo quinto traz a crise civilizatória da sociedade contemporânea, onde tem
como fundamento o neoliberalismo. Aponta que o desafio da Igreja em estar no mundo,
não no centro, mas a partir das fronteiras, e indica o caminho da pastoral social como
resposta de enfrentamento a essa crise civilizacional.
O capítulo sexto nasce de análises feitas a partir das necessidades provocadas pelo
tempo pandêmico, caracterizadas pelo isolamento físico, e as dificuldades de promover a
experiência da catequese. Apresenta uma nova realidade catequética que desperta
significativas mudanças nesse meio, avanços no modo de transmitir os conteúdos da e
resgatando valores primários do cristão.
O catulo sétimo retoma a Encíclica Fratelli Tutti que traz como centro da
refleo o lugar do ser humano na obra da criação, bem como sua responsabilidade com
o Criador. Interessante notar que o se dirige somente aos crentes, mas a todas as
pessoas dotadas de humanidade.
Eclesiologia perspectivas teológico-pastoraisreúne os seguintes textos:
- A Eclesiologia do Papa Francisco e a Metodologia Histórico-Evangelizadora
escrito por Ivanir Antonio Rampom e Ivanir Rodighero;
- A perplexidade atual à luz da Igreja de Corinto, escrito por Ademir Rubini e Acildo
Luiz Kunzler;
- “Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,16.17) o pastoreio, paradigma da missão da
Igreja, escrito por Jair Carlesso e Lucas Stein;
- O Ministério do catequista: O Reino de Deus e sua justiça (Mt 6,33), escrito por
Rogério L. Zanini;
- A pastoral social e a comunidade cristã como presença sociotransformadora nas
fronteiras da justiça, escrito por Regiano Bregalda e Junior Bufon Centenaro;
SANTOS, And Luiz dos
Eclesiologia: perspectivas teogico-pastorais
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.89-91, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.
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- A catequese em tempos de pandemia; escrito pelos professores e alunos da disciplina
de MPP II.
- A fraternidade universal na prática pastoral: O bem do outro por desígnio de Deus,
escrito por Antonio de Lisboa Lustosa Lopes.
INFORMAÇÕES TÉCNICAS
Título: Eclesiologia perspectivas teológico-pastorais
Organizadores: Rogério Luiz Zanini E Ari Antonio Dos Reis
Ano: 2022
Editora: Berthier
Local: Passo Fundo
ISBN: 9786586647471
Páginas: 196 páginas
SANTOS, And Luiz dos
Eclesiologia: perspectivas teogico-pastorais
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.39, n.132, p.89-91, Jan./Jun./2022. ISSN On-line: 2763-5201.