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dobro. A diferença fica ainda mais explícita em estados como Ceará, Rio Grande do Norte e
Paraíba, onde as taxas de homicídios de mulheres negras foram quase quatro vezes maiores
do que aquelas de mulheres não negras. Em Alagoas, estado com a maior diferença entre
negras e não negras, os homicídios foram quase sete vezes maiores entre as mulheres negras
3
.
Desde que a pandemia do coronavírus começou, 497 mulheres perderam suas vidas.
Foi um feminicídio a cada nove horas entre março e agosto/20, com uma média de três
mortes por dia. São Paulo, com 79 casos, Minas Gerais, com 64, e Bahia, com 49, foram os
estados que registraram maior número absoluto de casos no período
4
.
A Secretaria da Segurança do Rio Grande do Sul, também publicou os indicadores de
violência contra mulher, listados entre ameaças, lesão corporal, estupro e feminicídio
tentado e consumado dentro do período de janeiro até outubro de 2020, foram registrados:
27.176 ameaças, 15.299 lesões corporais, 1.466 estupros, 67 feminicídios consumados e 288
feminicídios tentados; cabe destacar, que segundo dados oficiais inúmeras mulheres não
denunciam a situação de violência que vivem, o medo é um dentre os motivos que
camuflam esta realidade
5
.
Esta violência atinge diretamente as mulheres, e se personifica, conforme prevê a Lei
Maria da Penha, de diversas formas: patrimonial, sexual, física, moral e psicológica e
indiretamente quando atinge seus filhos e pessoas próximas. Muitas destas realidades
encontram espaços dentro dos lares, o local que deveria ser de construção da subjetividade,
dos afetos, torna-se “campo do medo”, da dor, das lágrimas e até da morte, como
demonstrado acima.
Por outro lado, outra nuance desta realidade é que as relações fragilizadas, a
desigualdade social, insensibilidade, a demanda massiva de trabalho e a falta de
investimentos nas políticas sociais também são fontes de violências, que nos desafiam.
Frente a esta realidade e na perspectiva do cuidado, vislumbra-se que através da
promoção de ações de escuta sensível, acolhimento, partilhas de experiências e afetos,
reflexões, resiliência, olhares, informações e fortalecimento coletivo é que efetivamente
mudam e endossam igualdade de gênero na prática.
3 PROJETO CIRCU(LAR): O MOSAICO DOS CUIDADOS
Neste sentido, fazemos referência a uma experiência bem sucedida, ocorrida na
Comarca de Guaporé, na area da abrangência da Arquidiocese de Passo Fundo.
No ano de 2018, a ONG ECOPAZ
6
, com sede em Guaporé firmou parceria com o
Poder Judiciário, na Comarca de Guaporé-RS, com a finalidade de desenvolver o projeto
chamado: Circu(LAR): O mosaico dos cuidados.
Este projeto foi concretizado através de convênio firmado com o Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul
7
, tendo sido desenvolvido e coordenado por mulheres, durante todo o
3 IPEA. ATLAS DA VIOLÊNCIA 2020. Disponível em: <https://dx.doi.org/10.38116/riatlasdaviolencia2020>
4 BRASIL DE FATO. Uma mulher é morta a cada nove horas durante a pandemia. Disponível em: <https://
www.brasildefato.com.br>
5 SSP-RS. Indicadores da Violência Contra a Mulher - Lei Maria da Penha. Disponível em: <http://www.ssp.rs.gov.br/
indicadores-da-violencia-contra-a-mulher>
6 A ECOPAZ é uma Organização Não Governamental que foi instituida em 2007. Direciona-se desde então, ao
desenvolvimento de trabalhos voltados para o protagonismo, resolução de conflitos, formação humana, construção de
culturas de paz, fortalecimento da auto estima, empoderamento e promoção dos direitos humanos.
7 O Projeto Circu(LAR): O mosaico dos cuidados, foi contemplado através do Edital nº002/2017-VEC, realizado pela
Vara de Execuções Criminais da Comarca de Guaporé, sendo o firmado o primeiro Termo de Convênio 01/2017, e o
mesmo renovado para a continuidade do projeto no periodo de 2018, 2019 e 2020. Os relatórios, prestação de contas,
avaliações, registros fotográficos e demais apontamentos encontram-se arquivados junto ao Fórum de Guaporé e
também junto à secretaria da ECOPAZ.
MAULE, Mari Teresinha Maule
Cuidado, partilha, resiliência: princípio da igualdade e a violência de gênero
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.38, n.131, p.103-113, Jul./Dez./2021. ISSN on-line: 2763-5201.