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A IMIGRAÇÃO E A FOME
aspectos do vivido por
venezuelanos/as em Pacaraima RR
IMMIGRATION AND HUNGER
aspects of life experience for
Venezuelans in Pacaraima - RR
João Carlos Tedesco*
“A marmita que salva”
Resumo: O texto analisa, de uma forma sintética, alguns dos aspectos
presentes no cenário migratório atual; enfatiza a correlação da imigração
com a questão da fome. O cenário de análise empírica é a cidade de
Pacaraima na fronteira com a Venezuela, no estado de Roraima. A análise
conclui demonstrando que a Operação Acolhida do governo brasileiro, em
conjunto com várias entidades, é de extrema importância para amenizar o
sofrimento, permitir alguma esperança de vida melhor no Brasil, bem
como resolver o problema premente e vital da fome para grande parte dos
milhares de imigrantes venezuelanos.
Palavras-chave: Imigração venezuelana. Operação Acolhida. Roraima. Fome
.
Abstract: The text analyzes, in a synthetic way, some of the aspects
present in the current migration scenario; it emphasizes the correlation of
immigration with the issue of hunger. The setting for the empirical
analysis is the city of Pacaraima, on the border with Venezuela, in the state
of Roraima. The analysis concludes by demonstrating that the Brazilian
government's Operação Acolhida, in conjunction with various entities, is
extremely important in alleviating suering, allowing some hope of a
better life in Brazil, as well as solving the pressing and vital problem of
hunger for a large part of the thousands of Venezuelan immigrants.
Key-words: Venezuelan immigration. Operação Acolhida. Roraima. Hunger
.
v. 40, n. 134, Passo Fundo,
p. 50-61, Jan./Jun./2023,
ISSN on-line: 2763-5201
DOI:
dx.doi.org/10.52451/teopraxis.v40i134.140
* Doutor em Ciências Sociais pela
Universidade Estadual de Campinas (1998),
pós-doutor e professor visitante (2009, 2014
e 2018) na Universidade de Verona Itália e
pós-doutor (2011) na Universidade de Milão
(Itália). Professor titular na Universidade de
Passo Fundo (UPF), Passo Fundo, RS, Brasil.
E-mail: jctedesco@upf.br
https://orcid.org/0000-0002-8935-5697
Recebido em 01/12/2022
Aprovado em 16/06/2023
51
INTRODUÇÃO
A partir do início do século XXI, os deslocamentos populacionais assumiram
algumas configurações distintas dos fenômenos anteriores. Países em desenvolvimento
também estão absorvendo contingentes migratórios internacionais, fato esse que não é
mais exclusividade de países ricos, com grande concentração de capitais. A imigração Sul-
Sul Global revela esse dinamismo mais intenso e, de certa forma, diferenciador dos
últimos anos. Imigrantes de algumas regiões da África, em particular, a subsaariana, do
continente asiático e latino-americano vêm imprimindo trajetórias pouco dinâmicas até
então, as quais se direcionam também para o Brasil. O caso de venezuelanos para o Brasil,
Argentina e Colômbia é expressivo disso.
As migrações internacionais recentes para o Brasil vêm se tornando pauta de muitas
manchetes midiáticas (jornais e televisão), polêmicas, discussões acadêmicas, jurídicas e
políticas; demandaram nova legislação a partir de 2017, com muitos avanços, mas
extremamente criticada pelos analistas dos direitos humanos e dos direitos dos imigrantes
em particular, em razão dos cortes governamentais em relação ao texto original aprovado
na casa legislativa, seus constantes aditivos e normativas, configuração de imigrantes em
situação de refúgio, sendo esses, em alguns casos, com intensa ideologização e politização,
em particular, venezuelanos, manifestações sociais em torno de múltiplas questões.
um caminho civilizatório amplo para ser percorrido no sentido de entender,
hospedar e conviver harmonicamente com a imigração e os imigrantes na sociedade atual,
no Brasil em particular. Imigrantes ainda são vistos desde os tempos dos regimes coloniais
como “raças submetidas” (Arendt, 1963), sujeitadas, inferiorizadas, sem direito à
mobilidade social, principalmente no que tange ao horizonte laboral, como invasores e,
por isso, devem ser coibidos pelos estados-nacionais, estigmatizados pela mídia, negados e
discriminados por grupos neofacistas e de extrema direita em várias partes do mundo.
A realidade migratória atual vem demonstrando que imigrantes e imigrantes;
os que conseguem com mais facilidade entrar nos países, os que entram, mas não
podem retornar, pois não como voltar ou levar os filhos porque não possuem o visto.
Devemos considerar que os imigrantes são sujeitos que transitam em múltiplos territórios
e, por isso, conectam-se e se articulam por rias redes em fronteiras também diversas
(religiosas, linguísticas, culturais, geográficas e políticas), porém, sempre em correlação
com a esfera do trabalho. Desse modo, eles diversificam seus pertencimentos, suas relações
com os espaços e com as esferas que se retroalimentam. Entendida assim, a imigração é
também circulação, ou seja, processo que se em interligação do aqui e do acolá, rede de
relações possibilitadas por estratégias (retornos, trânsitos, relações mais fortes ou não num
determinado lugar, identificação linguística e/ou religiosa com determinados grupos,
Dito isso de uma forma genérica, nosso artigo objetiva analisar alguns dos processos
que reconfiguram a imigração internacional contemporânea, com centralidade para
venezuelanos no Brasil. É um texto sintético, escrito a partir de uma experiência de
pesquisa e de trabalho desenvolvida em Roraima, mais precisamente, nas cidades de
Pacaraima e Boa Vista, durante todo o mês de novembro de 2022. Estivemos nesses
espaços para auxiliar em atividades burocráticas e assistenciais, bem como buscar entender
alguns dos processos que envolvem as ações do estado e de várias entidades junto aos
imigrantes venezuelanos que se inserem no Brasil por aquela fronteira.
Em termos metodológicos, buscamos entrevistar imigrantes venezuelanos sem
nenhum recorte ou particularidade de sexo, idade, profissão, etc. Nossos contatos
permitiam um diálogo mais aberto, com indagações em torno de aspectos da vida deles
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antes de emigrar, a decisão de sair, os meios para chegar até a fronteira, a existência ou
não de redes e que tipos de vínculos, os processos efetivados no interior das políticas
governamentais brasileiras, as idealizações, bem como aspectos da situação econômica e
política de seu país.
Para efeito de um texto sintético
1
que nos foi solicitado e que correlacionasse o tema
da imigração com a fome, buscamos, ainda que de uma forma genérica, pontuar alguns
elementos nesse sentido. Desse modo, estruturamos o presente texto, primeiramente,
abordando alguns elementos genéricos do atual quadro migratório e, posteriormente,
daremos ênfase a alguns aspectos da realidade vivida por imigrantes venezuelanos e que
configuram um quadro de desespero e de fome vivido no país de origem e, de algumas
esperanças em sua inserção no horizonte laboral no Brasil.
1 PARA MUITOS, UM MUNDO DE POUCAS ALTERNATIVAS...
Tive fome e me deste de comer (Mt 25,35-45).
Tenho a convicção de que não há uma correlação mais adequada para a imigração do
que fome; ou, então, uma alternativa de esperança para amenizar esta que esteja o em
evidência quanto aquela. É claro que nem toda a imigração é fruto da fome, da falta de
condições financeiras e de sobrevivência material. outros horizontes e causalidades que
produzem as saídas de pessoas de um lugar para outro, em particular, para o que nos
interessa que é de um país para outro. Mas, não temos dúvida em afirmar que a dimensão
econômica, ou seja, a falta de trabalho/emprego, o salário baixo, as secas, as enchentes,
como a do Paquistão nos meses de agosto e setembro, a impossibilidade de sustentar a
família, de colocar alimento à mesa, impulsionam grandes contingentes de pessoas a
saírem e tentarem uma vida melhor em algum espaço/país que não seja o seu de
nascimento ou o que se encontram no momento.
A imigração sempre existiu; é parte constitutiva da História e, não temos dúvida que
sempre se fará presente, inclusive com tendência de se ampliar em razão do aumento da
pobreza do mundo ocasionado pelas formas predadoras de produção, que excluem,
exploram, substituem força de trabalho e concentram capitais e riquezas em poucos
espaços mundiais, do aumento da automação, das tecnologias substitutivas da presença
humana no campo produtivo, seja esse no espaço urbano e/ou rural/agrícola.
Nunca esquecendo também o aquecimento global cada vez mais intenso, que,
produz catástrofes ambientais de grandes proporções, salinização de solos, principalmente
na África Ocidental, secas cada vez mais intensas, concentração de população em grandes
centros urbanos, bem como o aumento da população (chegando em 8 bilhões, ou, talvez,
até mais, segundo alguns estudiosos do tema) (Giudici; Wihtol de Wenden, 2020).
Tudo isso acaba produzindo mais e mais pobreza, mais e mais fome e, mais e mais
estratégias de saídas como desespero para sobreviver e/ou não mais do que continuar a
viver, ter algum tipo de abrigo, sustentar a família, lutar por um prato de comida
(Bauman, 2017).
1
Uma análise mais ampla está sendo desenvolvida e será objeto de um livro com previsão de término em meados
de 2023.
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Pensar que isso possa se reverter de imediato, se é que existam ainda condições e
interesses nesse sentido, é pura ingenuidade. Parece que o mundo não caminha para essa
estrada. Ao contrário, vimos todos os dias derrubadas de florestas que ainda existem (vide
o caso brasileiro), exploração sem medida de recursos naturais não renováveis, sede
egoísta e irracional de lucros imediatos, guerras civis, guerras armamentistas, muros e
mais muros, fronteiras cada vez mais fechadas, dentre uma longa lista de processos que
não nos deixam animados.
Não para imaginar que a natureza vegetal e animal possa se renovar
imediatamente, muito menos processos de desenvolvimento sustentável, equitativo e
solidário sejam passíveis de produzirem efeitos de uma forma imediata no mundo. Além
de que precisaríamos de um amplo conjunto de pré-requisitos para viabilizar isso e, ao que
parece, experiências nesse sentido evidenciam-se em conta-gotas, num ritmo muitíssimo
menor do que as destruições. São décadas de alerta sobre a irreversibilidade do
aquecimento global, das catástrofes, dos custos de vidas humanas (Pandemia do Covid
19), dos custos para reconstruir os estragos e as consequências, das perdas de milhares de
vida. Parece que tudo isso não encontra eco em sociedades maiores, em governos que têm
poder mundial, empresários, cientistas, agricultores, dentre outros (Macedo, 2019).
Mas, o que isso tem a ver com a fome e a imigração? Tudo. É a sua face visível; aliás,
é tudo isso somado e, tão evidente, que acaba tirando a comida do prato de milhões e
milhões mundo afora. Além disso, com o aumento da pobreza, das contradições sociais,
intensificam-se as conflitualidades. As relações sociais se tornam sempre mais tensas,
desesperadoras, violentas, de exclusão, de disputas não éticas e muito menos que revelam a
humanidade dos humanos, e, com isso, a vida se coloca em perigo (Lemke, 2017). A fuga
desesperadora de intensos contingentes, em boa parte dos continentes, é expressão clara
disso tudo; é a sua contradição, sua negativização.
Migrantes, de rios países, tentando atravessar uma das pontas do muro que separa o xico dos Estados Unidos, em Tijuana.
Foto:Atlas/Vídeo. Ancia Getty Images. David Mcnew. Fonte: https://elpais.com/internacional/2018/04/29/mexico/
1525033999_476242.html. Acesso em 12 de novembro de 2022.
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O mundo já não pode mais fechar os olhos para essa realidade que expressa sua
contradição. Não mais como viver isolado e muito menos virar o rosto para essa face
contraditória e perigosa do mundo atual. Especialistas enfatizam que regiões ricas estão
ficando sempre mais ricas e as empobrecidas se ampliando em quantidade e intensidade,
ou seja, em outras palavras, o fosso que separa enriquecidos e empobrecidos está cada vez
maior (Bauman, 2017). Parece que a sede capitalista para o lucro e à acumulação de capitais
produzem um imaginário escatológico de que os fins dos tempos estão próximos, logo,
precisamos nos proteger acumulando riquezas como tábua de salvação e/ou protelação
frente ao seu próprio fim.
O capitalismo desenvolve o imaginário do dinheiro, do lucro, da acumulação, da
mercadoria como representação do bem-viver, mas ele não pode e nem deve distribuir
tudo isso para todos; logo, não indo ao encontro de todos, os excluídos ou incluídos
marginalmente vão ao seu encontro. Por isso, países que concentram mais a riqueza,
uma maior presença de imigrantes.
Ao que nos parece, o desenvolvimento do subdesenvolvimento, bem como, nações e
regiões desenvolvidas o são na proporção em que provocam subdesenvolvimento em
outras. Essa é a lógica perversa que perdura.
2 UM MUNDO EM MOVIMENTO...
Alguém já disse que “tudo é ilusão, menos a fome”
O mundo continua sendo cada vez mais migrante (Ambrosini, 2020). As tecnologias
de comunicação e informação, as quais permitem conhecimentos sobre o que se passa no
mundo também fornecem meios para a mobilidade populacional; porém, mesmo com esse
recurso, os imigrantes continuam a sofrer bloqueios, dificuldades, contraposições,
restrições de mobilidade e muros físicos e de outras dimensões; ou seja, não basta conhecer
mais, ter mais informações, ser atraído pelas propagandas de agências de viagens e
imagens do mundo enriquecido e de vida melhor se a dinâmica política, a concepção de
Uma inédita caravana de quase 20 mil migrantes partindo do sul do México para tentar entrar nos Estados Unidos, em 6 de junho de
2022. Niem-Migrão, 21/06/2022. Fonte:https://www.eldiario.es/desalambre/inedita-caravana-15-000-migrantes-parte-sur-mexico-
eeuu_1_9058514.html. Acesso em 14 de novembro de 2022.
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fronteira nacional, de nacionalismo étnico e racializado impedem passagens aos mais
empobrecidos do mundo.
Dados mais recentes informam que em torno de 4% da população mundial como
migrantes internacionais, ou seja, mais ou menos 290 milhões. Uma entre 30 pessoas vive
fora de seu país (Acnur, 2022). As mulheres representam quase 50% dos imigrantes
internacionais, fato esse que marca e diferencia o cenário atual de outros tempos da
dinâmica migratória. Ser forçado a deixar tudo para trás e tentar a vida em outro lugar,
este é o dilema enfrentado pelo número recorde de 82,4 milhões de pessoas, de acordo com
dados do relatório Tendências Globais, do Alto Comissariado das Nações Unidas para
Refugiados (Acnur), divulgado em junho deste ano (2022). O contingente de refugiados
entre os imigrantes vem aumentando sempre mais.
A América Latina vem se revelando nas últimas décadas uma ampla região de
migrantes. Segundo dados da OIM, em 2021, mais de 4% da população são migrantes. A
fome, a turbulência política, a pobreza, governos insanos, desastres ambientais, embargos
econômicos, somados às políticas imperialistas e/ou neocoloniais de algumas nações
centrais, vêm produzindo e ampliando essa realidade de êxodo. Países como o México, o
Haiti, o Peru, a Venezuela, inclusive o Brasil, revelam isso (Idos, 2022). Países desse
continente convivem numa situação aparentemente ambígua: possuem um índice elevado
de emigrantes (o Brasil, segundo dados do Ministério de Relações Exteriores, por volta de
4 milhões), e, também, o receptores, como é o caso do Brasil e da Colômbia em relação
aos venezuelanos, ou, então, vários outros, como é o caso da Argentina, Chile, República
Dominicana, México e mesmo o Brasil que recebem também de vários outros continentes.
A crise no Haiti, na Síria, na Ucrânia, no Afeganistão, na Venezuela, dentre outros, nos
últimos anos, ampliou esse contingente.
3 A FOME E O REFÚGIO, OU O REFÚGIO DA FOME...
O direito à alimentação é expressivo de um dos direitos humanos, pois, revela defesa
da vida; está no rol dos direitos fundamentais da pessoa humana e, por isso, abarca uma
dimensão transnacional e transfronteiriça. No entanto, isso não é levado em conta por
governos, pela lógica econômica e de mercado, muito menos por sociedades enriquecidas.
Muitos alimentos estão servindo para os biocombustíveis e para outros fins e, não para a
alimentação humana (Dupas, 2005).
Imigrão de venezuelanos em Pacaraima. Foto: Marcelo Camargo/Ancia Brasil. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/
foto/2018-08/venezuelanos-saem-de-pacaraima-em-busca-de-abrigo-em-boa-vista-1582311558-8
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Todos sabemos que, com as tecnologias e as pesquisas científicas, a produção de
alimentos no globo vem aumentando. É por isso e para isso que elas existem e se
intensificam cada vez mais. Porém, então, por que a fome vem se ampliando? Alguma
coisa não fecha nessa equação. Aumenta a oferta de alimentos e a fome aumenta! O
problema nisso tudo está nas dinâmicas de poder, na distribuição, no uso dessa fonte
de vida para outros fins, no desperdício, no consumo exagerado de muitos, nas estratégias
de dominação econômica e política e na produção da dependência, na guerra pelos grãos
que faz com que muitas regiões do mundo tenham de trocar suas riquezas naturais (ouro,
madeira e outros minérios) por comida. Os alimentos, como qualquer outro recurso, são
mercadorias, fazem parte de uma geopolítica de lucro e poder e, não de defesa e
preservação da vida.
Dados recentes informam que mais de 2 bilhões de pessoas vivendo em situação
de insegurança alimentar no mundo, ou seja, não ganham recursos financeiros suficientes
para matar a fome de sua família e/ou para nutrirem-se com o mínimo necessário para
uma vida minimamente saudável. A maioria desse contingente, em termos porcentuais,
está na África, com 20% de atingidos; Ásia com 11,7% e América Latina e Caribe com 6,6%
(Idos 2022). Para muitas destas regiões, principalmente de países da África e da Ásia,
grandes contingentes não idealizam muito mais ao sair do seu país do que ter a
possibilidade de comer; submetem-se a trajetórias perigosas, ultrajantes, constrangedoras
de intensa exploração e violência em vários âmbitos, seja em selvas como no Panamá para
chegar aos EUA, em mares, como o Mediterrâneo entre norte da África e Sul da Europa,
os perigos, altos custos financeiros e as prisões nos muros da fronteira entre México e
EUA, nas intensas distâncias, realizadas com longas caminhadas e enfrentando perigos
como as vividas por senegaleses, bengalis, haitianos e venezuelanos para atingir o norte do
Brasil, dentre centenas de outras experiências atuais que expressam desesperos em busca
de pão, trabalho e abrigo (Baeninger; Vedovato; Nandy, 2020). Muitos morrem ao
atravessar, o fazem tentando defender e reproduzir sua própria vida. Se conseguem
atingir o destino, comumente são tratados como “ilegais”, portanto, como contraventores
e, por isso, serão criminalizados. Além da fome que os vitimou, agora o são pelo estado-
nação, pelas legislações de países e da cultura social produzida nos espaços de destino.
Realidades contrastantes: imigrantes hondurenhos na região de fronteira com a Guatemala.
Foto: WFP/Julian Frank. ONU-NEWS, em 14/06/2022. Dispovel em: https://news.un.org/pt/story/2022/06/179235. Acesso
em 10 de novembro de 2022.
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4 VENEZUELAN OS EM PACARAIMA: A MARMITA SALVADORA...
A realidade vivida por venezuelanos no estado de Roraima é por demais
conhecida, em particular, na cidade de Pacaraima e na capital Boa Vista.
2
Já são quase cinco
anos que esse processo vem se desenvolvendo. Dia-após-dia levas imensas de pessoas
atravessam a fronteira e buscam inserir-se no Brasil. Em alguns períodos, histórico de
entradas diárias de mais de mil pessoas. No período que estivemos presente nela
(novembro de 2022), a média diária de chegada, segundo o comando do Pelotão do
Exército de Fronteira presente, girava entre 300 a 400 pessoas. É uma realidade
migratória jamais vivida pelo país em termos de intensidade num tempo tão curto e num
estado com condições limitadas como é o de Roraima.
Dados do Acnur (ONU) informam que são mais de sete milhões de venezuelanos que
buscaram aentão as portas de saída do país. Destes, quase dois milhões foram para a
Colômbia; no Brasil, se aproximam de um milhão; para os Estados Unidos, o número
também é elevado, além de outros países que os estão acolhendo e abrindo suas fronteiras.
É importante enfatizar que os dados são muito imprecisos, pois muitos não são
registrados, entram por caminhos alternativos, migram e vão para casa de familiares,
parentes, amigos e conhecidos; outros entram, solicitam as políticas de Acolhida
Humanitária, e, após, um tempo retornam. Portanto, entradas, retornos e reemigrações
são comuns; é parte da dinâmica e, os dados estatísticos, além de comumente falhos, não
abarcam essas estratégias e racionalidades próprias dos imigrantes.
As causas desse processo migratório específico o complexas e diversas; difícil
explicá-las minimamente aqui num espaço tão curto; mas, podem ser resumidas com
maior expressão pelo âmbito econômico e político. Embargos econômicos promovidos
pelos Estados Unidos, reeleição de Maduro, constituição de governo paralelo pelo auto
denominado presidente Guaidó, em boa parte, com financiamento americano no período
do governo Trump, quebra de contratos de compra e refinamento de petróleo venezuelano
pelos EUA, estratégia do governo de militarizar o país para sufocar a oposição,
enfraquecimento desta com consequente represália aos seus apoiadores pelo governo do
presidente Maduro, boicote de saída de produtos provocado por grandes redes de atacadistas
com a intenção de aumentar o preço dos seus produtos, dentre outros processos.
As consequências de tudo isso, além de outras, podemos elencar, a redução do
emprego, a intensa dependência do país em relação ao petróleo e, este, atrelado a um
país (os EUA), o intenso aviltamento do salário dos trabalhadores, conflitos sociais,
intenso controle social pelo estado, fome e miséria, além, é evidente, as portas de saídas.
Somado a isso tudo, houve o uso político dessa realidade de crise e migração por governos
como o do Brasil e dos Estados Unidos, principalmente a partir de 2018 com políticas de
Acolhida Humanitária
3
e concessão de refúgio a um grupo seletivo (somente aos
venezuelanos, como foi o caso brasileiro) e midiatizado como forma de contraposição e
crítica ao governo Maduro e aos que, em algum período anterior ao conflito social e
político, haviam produzido ações econômicas conjuntas.
A face mais drástica disso tudo se revelou, e continua, para o caso brasileiro, no
estado de Roraima com o total descontrole social e político entre 2018 a 2020, em algumas
2 O espaço reduzido e as informações que dispomos até então não nos permitem ter um amplo processo que se
desenvolveu nesses mais de quatro anos dessa realidade no referido estado e, particularmente, na cidade de
Pacaraima. Situação essa que foi amplamente retratada pela mídia nacional.
3 No Brasil foi denominada de Operação Acolhida. Criada em março de 2018, ela objetiva o atendimento humanitário
a refugiados e imigrantes venezuelanos em Roraima em razão da crise política, econômica e social de seu país. Exerce
ações de ordenamento de fronteira, fornece espaços para o abrigamento e interiorização de imigrantes. As atividades
exercidas nesses três âmbitos são muitas e estão em parcerias com órgãos de apoio internacional e com as
instituições religiosas, do terceiro setor, dentre outras, as quais possuem um amplo horizonte assistencial.
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cidades, em particular, na porta de saída venezuelana que é Pacaraima. A presença efetiva e
ampliada do Exército Brasileiro, dos órgãos ligados à ONU (Acnur, OIM, Unicef), bem
como a Cruz Vermelha, mas, acima de tudo de instituições religiosas, em especial, da Igreja
Católica e de outras entidades da sociedade civil, vêm dando um certo ordenamento, uma
tentativa de gestão do processo, principalmente com obras assistenciais (abrigos para
mães, serviço da Caritas com abrigos, entrega de marmitas, assessorias, cursos de
artesanato, dentre várias atividades de auxílio, assistência, apoio, orientação etc.).
Porém, a problemática é tanta, os limites da mesma forma em razão da quantidade
de imigrantes, da realidade jamais vivida no local e por todo o país, o desespero e
desamparo de milhares de pessoas que, no início do processo não tinham para onde ir,
abrigar-se e o que comer. Fome, noites no relento e na chuva, oposição de boa parte da
população local, destino incerto (a única certeza é que estavam fora de seu país), sem
trabalho, sem domínio da língua, dentre uma série de outros processos, marcaram a vida
deles e vêm ainda, num grau menor, constituindo-se nesse cenário.
Segundo informações colhidas no local, maior número de venezuelanos na cidade
do que de nativos
4
ainda que, por ser uma cidade de fronteira, essas mobilidades
populacionais entre os municípios acontecem de uma forma muito comum. Porém, o
processo é tão intenso que sua gestão se tornou complexa e de difícil resolução. A língua
que mais se ouve na rua é o espanhol. O comércio da cidade ganhou um amplo
incremento; muitos negócios e serviços constituíram-se ou intensificaram-se pela
presença de dezenas de milhares de venezuelanos. O espaço curto não nos permite
descrever algumas destas dinâmicas.
Padaria gerenciada pelas irmãs da Congregação de São José. Para am de sua dimensão comercial, ela presta um amplo servo
assistencial aos imigrantes venezuelanos. Fonte: acervo de pesquisa de campo.
4 Segundo o IBGE, em 2021, a população de Pacaraima girava em torno de 19 mil habitantes. Ver https://
pt.wikipedia.org/wiki/Pacaraima. Acesso em 16/11/2022.
5 Ação desenvolvida pelo Governo Federal, através de seus órgãos responsáveis em Pacaraima e Boa Vista, a qual
objetiva facilitar a realocação voluntária de imigrantes venezuelanos pelo interior do país em busca de um espaço
laboral e de integração local.
É visível a soma de esforços das entidades civis, militares, religiosas e humanitárias
(ONU, Cruz Vermelha). As ações de interiorização
5
de levas de imigrantes para várias
partes do país onde houver demanda para trabalhadores viabilizam deslocamentos
cotidianos, em geral, de ônibus até Boa Vista e, após, dependendo da região do país, de
avião, com passagem paga pelo governo brasileiro e por entidades humanitárias.
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Porém, as demandas ou os receptores não são muitos em nível de país. A grande
maioria fica em espera por esse espaço de trabalho, fato esse que, somado às entradas
diárias, produz um imenso contingente represado de imigrantes que, segundo
informações de um coronel da Operação Acolhida em Boa Vista, nesse momento, está em
torno de 8 mil venezuelanos. Muitos dos imigrantes permanecem em barracas do Exército
ou em abrigos organizados pela Igreja Católica e/ou outras entidades.
É nesse cenário que a alimentação é fundamental. São distribuídas diariamente
milhares de marmitas. Muitos migram para Pacaraima e Boa Vista em razão delas, pois,
em geral, contemplam basicamente as três refeições diárias. Isso faz parte da política da
Acolhida Humanitária do Governo Federal. Entrevistamos vários imigrantes que nos
disseram que as marmitas “nos salvam. Elas matam o que está nos matando, a fome”.
Abrigos, proteção às noites de temperatura mais baixa, locais para se lavar, para a higiene
e necessidades fisiológicas, fora dos espaços institucionais da Operação Acolhida, o
incipientes, por isso muito estão ainda tendo o espaço da rua como proteção; mas, sem a
marmita, eles morreriam de fome, pois não alternativa, não trabalho na cidade de
Pacaraima para todo o contingente de imigrantes, muito menos em Boa Vista.
Alguns autóctones que dialogamos de uma forma informal, em geral, empresários
lojistas, donos de restaurantes que almoçávamos, foram unânimes em afirmar que “essas
marmitas atraem mais imigrantes ainda, pois, muitos deles têm cama, mesa e banho
gratuito. [...]. Numa penúria como eles dizem que vivem lá, ter tudo isso, o tem quem
não venha, até porque se quiser voltar, o caminho de volta está livre”.
muitas controvérsias, oposição, resistência de membros da sociedade local em
razão de que partes da cidade “viraram dormitório; onde você andar por está tomado de
gente dormindo, de dia e de noite, em frente às lojas, por tudo. Eu queria que tivesse visto
anos atrás, a cidade era um dormitório só. Agora está bem menos. [...], mas ainda é
prato e plástico das marmitas no chão, não jogam nada no lixo. A cidade não é deles, o
é!” No entanto, alguns dos que conversamos afirmaram que o comércio ficou intensamente
mais dinâmico com a presença deles; reconhecem que as próprias marmitas empregam
muita gente, enfim, que a economia da cidade teve um salto imenso nos últimos quatro
anos em razão dos imigrantes venezuelanos, além de que, não são eles que jogam os
pratos e plásticos no chão.
Imigrantes venezuelanos em rua de Pacaraima. Foto: Caíque Rodrigues/G1 RR. Dispovel em: https://g1.globo.com/rr/roraima/
noticia/2021/08/29/nao-temos-um-real-sequer-temos-fome-venezuelanos-que-tentam-vida-melhor-no-brasil-sofrem-para-encontrar-o-
que-comer.ghtml
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.40, n.134, p. 50-61, Jan./Jun./2023. ISSN On-line: 2763-5201.
TEDESCO, João Carlos
A imigrão e a fome: aspectos do vivido por venezuelanos/as em Pacaraima RR
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Um entrevistado disse que “agora a situação está bem melhor, tem as marmitas. Mas,
por meses, no início aqui quem comia alguma coisa era pão e mortadela, ou pão puro, a
família inteira. E quem conseguia isso podia se contar feliz. [...]. Havia muita fome aqui,
muita fome; era gente, mães e crianças chorando de fome”. Todos os entrevistados
disseram que a falta de comida era o que mais os deixavam preocupados, “não ter o que dar
para os filhos comer”. Um deles nos disse que passou 13 dias comendo pão e mortadela.
Imigrantes, ao entrar no Brasil, fazem uma verdadeira maratona de atendimentos,
várias filas para realizar as ações exigidas pela Operação Acolhida. De uma forma sintética,
primeiramente, eles vão à Polícia Federal para registro, após, para o setor de teste de
Covid-19 e recebem vacinas previstas no calendário nacional de imunização. Após esse
processo, há o encaminhamento para a emissão de documento (permissos) que os autorizam
a entrar no país; posteriormente, a retirada do CPF. Finda essa parte, a elaboração e
expedição dos protocolos de seu pedido específico, ou seja, de refúgio ou de autorização de
residência temporária, dentre outros procedimentos.
Essas exigências podem levar o dia todo ou até mais em razão do número de
chegadas e dos documentos disponíveis pelos imigrantes. Para o pernoite, em Pacaraima,
os imigrantes são separados por sexo, dentre outras seleções e requisitos. Segundo
informação do Coronel responsável pela Operação, em diálogo conosco, não espaços
para todos. muitas entradas e saídas. Conforme as saídas vão acontecendo
(interiorização pelo país), vão abrindo-se espaços para novas entradas. Os fluxos o
contínuos. Nem todos os imigrantes desejam ir para os alojamentos, preferem outros
espaços, ou a própria rua, ou alugam pequenos cômodos para permanecer
temporariamente. Nos alojamentos do Exército, acomodações para dormir,
alimentação, água, banheiros, assistência em saúde, segurança, dentre outros serviços.
Tendas do Acnur/ONU em Boa Vista (RR) para abrigar venezuelanos. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil. Ramana Rech Duarte
- MigraMundo Equipe, em 14 de dezembro de 2020. Dsipovel em: https://www.camara.leg.br/noticias/920703-comissao-vai-debater-
operacao-de-acolhimento-de-imigrantes-venezuelanos
ENFIM...
Sem poder avançar muito em razão do espaço restrito, o que posso dizer é que é uma
realidade-em-ato, está acontecendo, revela-se ímpar na região e, em boa parte da história
do país. Muitas das precariedades vividas por imigrantes no início da imigração não se
fazem mais presentes em razão da Operação Acolhida e da intensa participação de
instituições religiosas, em especial da Igreja Católica, do município de Pacaraima e da
Diocese de Boa Vista e de outras entidades ligadas à ONU; porém, a dinâmica é intensa.
Revista Teopráxis,
Passo Fundo, v.40, n.134, p. 50-61, Jan./Jun./2023. ISSN On-line: 2763-5201.
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Não se sabe quando isso tudo vai terminar e, muito menos se todos os problemas
estão resolvidos. Cada dia é um dia segundo o comando do Exército presente em
Pacaraima. O sonho dos imigrantes é a busca de uma vida melhor. Entendemos que se faz
necessário estudos localizados onde estão os imigrantes interiorizados para saber se
realmente isso vem acontecendo.
É imperativo que a sociedade brasileira tenha consciência do período vivido no país
de origem desses imigrantes, que esteja aberta para a aceitação, hospitalidade e auxílio.
Tem-se a consciência de que não se está resolvendo a questão pelas suas causas, nem cabe
isso aos brasileiros, mas, se pode amenizar e/ou evitar o mal da fome. Para muitos
imigrantes, a marmita salvadora de hoje é sua idealização principalmente para seus filhos
pequenos, pois lhe permitem simplesmente continuar a viver e a sonhar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Documento, 2022.
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BAENINGER, R.; VEDOVATO, L. R.; NANDY, S. (Coord.). Migrações internacionais e a pandemia
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BAUMAN, Z. Estranhos à nossa porta. Rio de Janeiro: Zahar, 2017.
DUPAS, G. Atores e poderes na nova ordem global: assimetrias, instabilidades e imperativos de
legitimação. São Paulo: Editora UNESP, 2005.
GIUDICI, C.; WIHTOL DE WENDEN, C. I nuovi movimenti migratori. Il diritto alla mobilità e le
politiche di accoglienza. Milano: Franco Angeli, 2020.
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LEMKE, T. Biopolítica: críticas, debates e perspectivas. São Paulo: Editora Filosófica Politeia, 2017.
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Grande Florianópolis (SC): UFSC, 2019. Tese em Antropologia Social.
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