Cartas de Espiritualidade…

No segundo semestre de 2020, a Itepa ofereceu alguns cursos online com a temática da pandemia. Um destes cursos, foi o de Vultos da Espiritualidade em tempos de pandemia.

Segundo o professor, Pe. Ivanir Antonio Rampon, o objetivo do mesmo é o de revisitar alguns vultos da espiritualidade cristã que viveram durante períodos de epidemias, a fim de meditarmos algumas lições espirituais para este tempo de pandemia do covid-19. Busca-se revisitar o passado, com olhos esperançosos num futuro saudável, para assumir no presente, com criatividade e imaginação, os desafios espirituais do nosso tempo, buscando caminhos novos, sem medo de seguir Jesus Cristo.

A monitora do estudo, Elisabete Gambatto comentou que está sendo promovida uma reflexão a partir do testemunho espiritual de alguns vultos da espiritualidade que, com a graça de Deus se santificaram em tempos de epidemias. O curso provoca para que os estudantes façam suas meditações espirituais em vista de um caminho espiritual personalizado, integrado e solidário.

Durante o curso, a turma foi surpreendida com uma Carta que nos foi enviada por “São Vicente de Paulo”. Vários estudantes responderam à carta deste vulto espiritual, modelo e intercessor. Partilhamos agora, duas cartas espirituais “enviadas” a São Vicente!

 

 

Carta da Maria Goretti

Salvador, 11 de novembro de 2020.

São Vicente de Paulo:

Paz e bem!

Quando o carteiro chegou e uma carta me entregou, fiquei com dois sentimentos, imediatos: surpresa e alegria. Surpresa, pois não esperava receber uma carta sua, pessoa que gostaria muito de ter conhecido, pois o meu professor fala muito de você, de sua história de vida. Alegria, pois ao ler sua carta, vi o quanto do seu cuidado e da sua atenção, para conosco, que pertencemos a essa turma, que estuda os Vultos de Espiritualidade. A alegria de poder ler coisas tão significativas, que me fizeram pensar e dar novo sentido ao meu viver.

Sua história de vida, nos leva a crer que os caminhos para Deus, são feitos de dúvidas, questionamentos constantes, desafios, sofrimentos, mas acima de tudo, ele são transformadores e nos tornam felizes. Você foi um ser humano, que apesar da complexidade de pensamentos, ações, teve a coragem de se permitir viver cada experiência, para que delas pudesse fazer a escolha certa. Sei que seu coração, muitas vezes, ia na contramão dos seus desejos, mas ele sinalizava fortemente o valor do saber olhar, do saber sentir. Isso foi muito bom, o tornou um homem fiel, corajoso, que assumiu uma postura de compaixão verdadeira, que o levou a tomar decisões transformadoras.

Uma das coisas que você fez e fala, aqui, nesta carta, que eu fiquei muito reflexiva, foi sua atitude de revelar, sem medo, o seu amor pelos mais pobres e sua dedicação ao tempo de oração.

Realmente, é muito bom a formação espiritual, o conhecimento, isso nos fortalece na caminhada, porém a vivência, o pisar o chão do outro nos faz dar passos significativos. A ação, sempre é mais forte. O testemunho agrega mais, do que só as palavras.

Você soube escolher o melhor do caminho, porque pode viver, experimentar, as contradições do mundo, das pessoas, da sociedade.

As pessoas pobres são sábias, pois vivem na realidade dura e crua da vida e com isso sabem dar valor ao outro, sabem dar valor à vida, sabem escutar o que Deus tem a dizer. Os pobres, realmente são “os nossos senhores”, eles nos provocam a sair do nosso comodismo e prestar mais a atenção ao que está ao nosso redor. Eles são plateias, nos assistem, e por isso, podem nos ensinar a ver de forma diferente.

Outra coisa, que você nos diz, que é necessário e importante: ser organizados, no que fazemos. Tudo, na vida deve ter um planejamento, uma direção. Porém o que é mais importante é o processo, é o como fazemos, o como dizemos, o como somos. Essa organização perpetua as ações e as tornam mais visíveis e eficazes. A caridade organizada atinge muito mais a essência humana do que a sua aparência. Torna-se mais profunda, cria raízes e com isso dar bons fruto.

Por fim, mas não menos importante, o trecho das conferências que você escolheu para partilhar conosco, é oportuno e vem na hora certa. Estamos vivendo momentos fortes de uma pandemia, que assola o mundo inteiro. Mexe com os pulmões, ou seja, mexa com a essência do viver. Isso impactou a todos. Ninguém esperava. Estamos vivendo um distanciamento   social. E, você nos traz pontos para nos fazer pensar. Destaco alguns deles e desde já agradeço, pois tenho certeza, que já não sou mais a mesma depois, que li sua carta.

      São esses trechos que quero rezar: “Não temos de avaliar os pobres por suas roupas e aspecto, nem pelos dotes de espírito que pareçam ter” … Hoje estamos vivendo com muito limites, de consumo e isso nos diz o quanto somos superficiais, olhamos muito as aparências e esquecemos a humanidade que habita em cada ser e veste o nosso corpo.

      … “Devemos ter os mesmos sentimentos de Cristo e imitar aquilo que ele fez: ter cuidado pelos indigentes, consolá-los, auxiliá-los, dar-lhes valor” … Sentir a importância do cuidado com o outro, do ser solidário, do ser humilde.

      … “Com efeito, Cristo quis nascer pobre, escolheu pobres para seus discípulos, fez-se servo dos pobres e de tal forma quis participar da condição deles, que declarou ser feito ou dito a ele mesmo tudo quanto de bom ou de mau se fizesse ou dissesse aos pobres” … Percebemos, que não precisamos de muito, mas sim do necessário para vivermos. Que o que mais nos enriquece é a experiência comunitária. Vivermos próximos uns dos outros.

      … “Fiz-me tudo para todos (1Cor 9,22). Por este motivo, se é nossa intenção termos o coração sensível às necessidades e misérias do próximo, supliquemos a Deus que derrame em nós o sentimento de misericórdia e de compaixão, cumulando com ele nossos corações e guardando-os repletos” … Aqui, podemos sentir a importância de sermos simples, transparentes. Viver com integridade as riquezas partilhadas com o outro, no chão da nossa realidade.

      … “Portanto, ao abandonardes a oração, a fim de socorrer a algum pobre, isto mesmo vos lembrará que o serviço é prestado a Deus. Pois a caridade é maior do que quaisquer regras, que, além do mais, devem todas tender a ela. E como a caridade é uma grande dama, faz-se necessário cumprir o que ordena” … Finalizo dizendo, que a ação diária à serviço do outro, nos faz revelar a presença do Deus da vida, da sua ternura, da sua compaixão e do seu amor, logo é uma ação orante.

A Encíclica Fratelli Tutti do Papa Francisco, sem dúvida nenhuma, faz arder os nossos corações. O Papa nos surpreende com seu jeito de viver com autencidade, modéstia e verdade o Evangelho do Cristo, vivo e verdadeira.

Que o Deus da vida o abençoe, que a Boa Mãe o guarde em seu coração e que o Espírito Santo fortaleça e ilumine sua intercessão por todos nós.

Um grande abraço, nesse coração, que se abriu e abrigou os senhores e protetores e a oração.

Maria Goretti Machado- Educadora

 

Carta do Tarso Zeni

Caro São Vicente de Paulo!

Espero encontrá-lo na Paz do Senhor.

Recebi com alegria a sua carta, é uma carta instrutiva, provocativa e desafiadora. Descrevo abaixo os sentimentos que a mesma despertou em mim.

Instrutiva, na nossa vida nos deparamos com desafios, que nos obrigam a fazer escolhas, muitas vezes acertadas e outras não. A sua escolha de rezar e ser pobre, foi nobre em sua época e em nossos dias mais ainda, pois vivemos um tempo do “ter é mais importante do ser”. Os princípios que deixastes são bem válidos na caminhada que estou empreendendo, pois se não enxergarmos os pobres como os destinatários diretos da missão e a missão não for organizada, não teremos êxito, permanecendo tudo da mesma forma.

Provocativa, quando começamos visitar as comunidades menos favorecidas, percebemos diferenças gritantes em todos os aspectos, e nos perguntamos: Por quê? O que fazer? Aí assistimos o filme que conta um pouco da história da sua vida, e vemos de lá para cá não mudou muito. (…) A sua coragem de seguir em frente sem medo e com determinação nos provoca a termos atitudes semelhantes e irmos ao encontro dos abandonados.

Desafiadora, preferir o serviço dos pobres acima de tudo, esse é o desafio, pois hoje as condições e confortos não se comparam à sua época, é um grande desafio sair do conforto e ir ao encontro de pessoas que vivem, muitas vezes, em condições sub-humanas. Seu testemunho é um grande incentivo à minha caminhada.

O Papa Francisco na Encíclica Fratelli Tutti, nos convida a viver a fraternidade sem fronteiras de nenhuma forma, pois a ganância humana impõe barreiras que privam grande parte dos irmãos das necessidades básicas.

Interceda por nós, junto ao Pai, para que acordemos para a fraternidade.

 Abraço Fraterno, Tarso