Fica cada vez mais evidente que estamos sendo testemunhas e protagonistas de um período histórico de grandes transformações em todos os aspectos da vida humana. Há quem diga que estamos vivendo neste final de século e de milênio a transição da “modernidade” para a “pós-modernidade”. E há séries razões para se pensar o mesmo.
Jesus nos ensina que devemos ficar atentos aos “sinais dos tempos”; ou seja, estarmos com os olhos abertos para a realidade que nos cerca para poder apreender os fatos e poder compreende-los sob os olhos da fé, transformando o que aparentemente é um fato passageiro e banal em um “sinal” – comunicação do Deus da História com os colaboradores desta História, os homens. Aqui queremos ligeiramente ver algumas facetas do panorama mundial atual e arriscar algumas dicas que possam enriquecer nossas reflexões.
Uma olhada nos acontecimentos que estamos vivendo nos mostra que estão morrendo os “mitos-fundadores” da modernidade. Aquilo que a cultura moderna anunciava orgulhosamente como verdades científicas, definitivas (dogmas) aparece hoje como mitologia falhada e ineficaz. Com efeito, podemos elencar
vários exemplos neste sentido:
– Desaba o mito da automaticidade do processo histórico ou do sentido da história. Descobre-se que a históri anão constitui um processo “racional” segundo leis cientificamente conhecidas.
— Naufraga o mito do trabalho e da ética do trabalho. Cai por terra a crença de que o trabalho representa a fonte de riqueza material, da transformação do mundo e da auto-consciência humana. Hoje, a informatização e automatização da economia pós-moderna expulsam o homem do processo de produção de bens e serviços, chegando-se a prever uma “humanidade de desempregados”.
– Está arquivado o mito do messianismo revolucionário que fazia da nação ou classe os sujeitos da história, atribuindo a revolução um papel transformador e libertador. Este mito messiânico deixou uma experiência de novas escravaturas e injustiças.
– Desmascara-se o mito do Estado libertador e protetor, como meio e fim da emancipação humana. Assiste-se ao colapso do Estado do bem-estar social, à dissolução do Estado-nação, à perda do poder intervencionista e regulador do Estado.
– Perde vigência o mito das ciências e da técnica. Ao invés de instrumentos, do processo da liberdade e da racionalidade, a ciência e a técnica se configuram como agentes de destruição social e ambiental.
— Até o mito da democracia ameaça sucumbir. Perdem sua eficácia os velhos sistemas de representação, suscitando a descrença nos partidos, na classe política e nas instituições parlamentares.
As consequências da derrocada destes mitos, os alicerces da cultura moderna, ou sistema de referências (idéias, valores, normas, ideais, utopias) é o homem se ver frente a um mundo desconhecido, impreciso e angustiante. E se a humanidade não conseguir criar ou resgatar novos mitos e preservar alguns já existentes é possível que caiamos num “vazio”, num caos… Aqui e que entra o papel do cristão: o cristianismo não só tem a capacidade mas o dever de oferecer propostas efetivas às situações concretas. Ninguém pode se furtar de ajudar a forjar um novo mundo, um homem novo. Pois, embora “não destinados para este mundo” estamos comprometidos em concretizar neste mundo o Reino definitivo que já começou. Estamos em tempo de Kairós.
Ora, frente a esta situação de transição e de certa frustração para muita gente que perseguiu miragens, podemos dizer uma só palavra: a saída para os problemas do homem passa necessariamente por Cristo, o filho de Deus que se fez como nós. Mais uma vez se confirma o axioma: tudo o que não estiver de alguma forma ordenado a Cristo está fadado ao fracasso. Para perceber isto basta ver como os mitos da modernidade que estão cadavéricos ou definhando trazem uma compreensão que, em parte ou por inteiro, não se enquadra nas propostas cristãs. Por exemplo, muitos desses mitos falhos estão alicerçados sobre um conceito de homem errôneo e incompleto :pecam por não entenderem o homem como uma globalidade formada por diversas dimensões: corpo, alma e espírito. Qualquer uma dessas dimensões que não seja levada em conta acarreta um desastre, pois tende a desominizar o homem.
Como deverá será novo “humanismo-cristão” da pós-modernidade? Não é fácil saber, mas uma coisa e certa: deverá unir os fundamentos do cristianismo com os progressos e valores da humanidade, o que resultaria numa espécie de “cultura cristã”.
É neste contexto que se insere este número de nossa revista.
Trecho retirado do editorial.
Nesta edição você encontrará:
- Cristologia e Santo Domingo, texto Pe. Alexandre Mello Jaeger
- “Festa da Terra” do povo Kaingáng de Iraí – RS, texto de Breno A. Sponchiado
- Comunidade Eclesial de Base: novo jeito de ser Igreja na casa, texto de Pe. Valter Girelli
- Catecismo da Igreja Católica, texto de Dom Urbano Allgayer
- Os manuscritos de Qumrã e o Novo Testamento, texto de Pe. Odalberto D. Casonatto e M. Pazzini
- Entrevista com Eduardo Galeano sobre a América Latina
- “É preciso fazer uma faxina no céu… E desamarrar as mãos” – uma reflexão sobre Gn 1,1-2, 4a, texto de Antônio de Lisboa e Volmir Raldi
- A Liturgia das Horas, texto de Ir. Arací Ludwig
Veja aqui a versão completa em PDF
Para assinaturas e informações sobre edições anteriores envie e-mail: revista@itepa.com.br, ou preencha formulário aqui.
Informações técnicas
Título: Revista Caminhando com o Itepa
Autor: Faculdade de Teologia e Ciências Humanas – ITEPA FACULDADES
Número: 29
Mês/Ano: Junho/1993
Páginas: 64